O que aconteceria se o diaconato
feminino, uma vez instituído, desencadeasse uma forte e radical demanda do
sacerdócio feminino, de se ter sacerdotisas? Essa, sim, seria uma verdadeira
revolução para o catolicismo, uma subversão da tradicional estrutura autoritária
patriarcal de governo da Igreja.
A opinião é do sociólogo italiano
Marco Marzano, professor da Universidade de Bérgamo, em artigo publicado no
jornal Il Fatto Quotidiano, 13-05-2016. A tradução é de Moisés Sbardelotto.
Eis o texto.
Moderar o entusiasmo, apreciar a
novidade: assim eu acolheria a notícia da disponibilidade do papa de instituir
uma comissão que avalie a possibilidade de conceder também às mulheres o
diaconato permanente. Mas evitemos a euforia. Por muitas razões: Francisco quer
instituir uma comissão de investigação. E, a partir do trabalho das comissões,
muitas vezes, não surge precisamente nada.
Quando o papa anunciou uma
comissão de cardeais para reformar a Cúria, quase todos os comentaristas
pensaram que era iminente um cataclismo na Igreja. Não se viu nem mesmo a
sombra de grandes reformas da governança vaticana.
O segundo motivo para conter o
nervosismo é que o diaconato permanente masculino, restaurado pelo Concílio
Vaticano II, até agora, foi um fracasso: os diáconos incidiram pouco ou nada na
vida da Igreja, e a sua presença não arranhou a absoluta centralidade dos
padres na ponte de comando da instituição. A experiência do diaconato foi
fracassada, na qual as lideranças da Igreja nunca acreditaram, mera operação de
cosmética institucional.
Uma vez temperada a empolgação,
não se pode deixar de detectar a novidade: pela primeira vez no seu
pontificado, Francisco faz um gesto concreto pelas mulheres, cujas
consequências parecem ser, no longo prazo, bastante imprevisíveis.
O que aconteceria se o diaconato
feminino, uma vez instituído, desencadeasse uma forte e radical demanda do
sacerdócio feminino, de se ter sacerdotisas? Essa, sim, seria uma verdadeira
revolução para o catolicismo, uma subversão da tradicional estrutura
autoritária patriarcal de governo da Igreja.
O diaconato poderia, sob certas
condições, acender o pavio que detona o problema em toda a sua potência. Já
hoje, a eventualidade do diaconato sinaliza o fato de que o papa, até agora
bastante decepcionante sobre todas as questões relativas às mulheres e ao
gênero, talvez finalmente tomou consciência da seriedade da questão feminina.
O problema diz respeito
principalmente ao Ocidente, é óbvio. Aqui entre nós, as mulheres estão em fuga
da Igreja. E o estão porque a Igreja é um dos poucos lugares onde não se
reconhece a elas nenhuma paridade, nenhum direito de palavra.
Isso não acontece mais em outros
lugares: em casa, no escritório, na política. Isso ainda acontece na Igreja,
bastião do machismo. Durante séculos, as mulheres, embora silenciadas e
forçadas a uma reverente obediência, encheram as igrejas e animaram os pátios
das paróquias e dos oratórios, cuidaram dos padres, encorajaram-nos,
gratificaram-nos, ouviram-nos, apoiaram-nos nos momentos difíceis.
Há pouco tempo, as coisas
mudaram: as belas pesquisas de Alessandro Castegnaro e do Observatório
Sociorreligioso do Triveneto nos revelaram que, entre as gerações mais jovens,
não há mais as diferenças de gênero de antigamente e que, na paróquia, as moças
vão cada vez menos, exatamente como fazem os seus coetâneos homens.
Talvez porque, assim como estes
últimos, elas estão muito distantes da religião de igreja, mas talvez ainda
mais porque não estão dispostas a aceitar aquilo que, desde as suas avós, era
dado como óbvio: isto é, ocupar uma posição subordinada e desempenhar um papel
secundário. Isso, as jovens não aceitam mais.
E isso é ainda mais grave para a
Igreja, se pensarmos que isso ocorre precisamente onde, no Ocidente, se começa
a perceber uma escassez crônica de clero, um déficit grave de lideranças para
uma estrutura ainda elefantíaca nas dimensões e nas funções.
Abrindo às mulheres diáconos,
Francisco confirma ser "o papa do sim", o pontífice da máxima
inclusão, o subversor razoável (sempre atento para não perturbar demais o
grande e indolente corpúsculo eclesial), mas decidido, de fronteiras traçadas
há séculos. Quem sabe se, no fim, realmente, não escapará alguma revolução.
Fonte: Ihu
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