segunda-feira, 26 de abril de 2010

Mundial 2010: chute o tráfico de Pessoas!

Este é o ano da Copa do Mundo de futebol. No dia 11 de junho, pela primeira vez, poderemos assistir à cerimônia de abertura no continente africano!

A África do Sul se prepara para acolher este grande evento esportivo com entusiasmo, mostrando o lado positivo das pessoas e a beleza da natureza que esta terra pode oferecer. Quem chega à África do Sul pode assistir aos grandes preparativos para o excepcional evento dos mundiais: Canteiros de obras para alargar as estradas, festas de inaugurações dos estádios de futebol, slogans publicitários, souvenires, bandeiras e as indispensáveis "vuvuzelas" (cornetas dos torcedores) decoradas com as diferentes cores dos times nacionais que participarão.

Entre as várias atividades realizadas em função da Copa do Mundo de 2010 chamam a atenção as várias campanhas informativas que estão sendo realizadas na África do Sul contra o tráfico de seres humanos.

Campanha de prevenção contra o tráfico de seres humanos na África do Sul durante a Copa do Mundo de 2010.

Do dia 15 a 19 de fevereiro de 2010, 19 religiosas, representantes da rede Talitha Kum - rede internacional da Vida Consagrada contra o tráfico de seres humanos -, reuniram-se em Benoni (Johanesburgo) para a realização de um workshop cuja finalidade foi organizar uma Campanha preventiva contra o tráfico de mulheres, adolescentes e crianças por ocasião do mundial de 2010.

Participaram do encontro religiosas representantes de diversas redes locais: da Europa à América Latina; do Sudeste Asiático à África. A rede internacional Sarwatip (Southern African Women Religious Against Trafficking in Persons) participou com o maior número de representantes.
Estiveram presentes ao encontro a irmã Bernadette Sangma coordenadora da Rede Talitha Kum, Stefano Volpicelli, Resh Mehta e Marija Nikolovska da organização Internacional das Migrações (OIM) de Roma e de Pretória.
Durante o evento, entre os mais esperados e seguidos em âmbito mundial, a Campanha proposta por Talitha Kum convidará a todos, especialmente aos líderes religiosos e aos adeptos da vida consagrada, a informar-se, a conscientizar-se e a empenhar-se, participando da Campanha, na prevenção e em defesa das vítimas desta moderna forma de escravidão.

As religiosas divulgarão a Campanha preventiva nas escolas, nas comunidades paroquiais e entre os grupos de maior risco como os jovens e as mulheres, informando sobre o tráfico e divulgando o número telefônico gratuito para denúncias e assistência às vítimas do tráfico de seres humanos na África do Sul.

A Campanha é dirigida também aos torcedores que estão se preparando para participarem da Copa do Mundo, para que saibam e sejam conscientes de que muitos dos serviços a eles oferecidos são organizados através do serviço de pessoas que são exploradas e constritas, às vezes até mantidas em situação de escravidão. Como é o caso de Lisa, uma jovem moçambicana, a quem foi prometido serviço em um restaurante e, ao invés disso, foi trabalhar como secretária do lar sem receber nada, em condições servis e sem a permissão de sair de casa; ou de Elena, uma moça zulu, que participou de uma festa no final de uma partida de futebol. Desmaiada, acordou em lugar desconhecido e foi obrigada a prostituir-se. Ou de Peter, do Lesoto, que lhe ofereceram um trabalho como operário num canteiro de obras para a construção de um estádio, mas na realidade foi trabalhar em condições miseráveis como agricultor.

O material da Campanha foi feito com uma linguagem simples e acessível a todos. Como primeira iniciativa foram escritas 4 cartas endereçadas, respectivamente, aos líderes religiosos, às potenciais vítimas, aos potenciais traficantes de pessoas e aos torcedores. As cartas valorizam as relações interpessoais e o diálogo, aspectos fundamentais do trabalho da vida religiosa na prevenção e na defesa das vítimas do tráfico.

Tráfico de seres humanos na África do Sul

A África do Sul é país de origem, de destino e de trânsito do tráfico de pessoas. A associação de mulheres do magistério sulafricano durante a própria conferência, em outubro de 2007, já tinham denunciado que mulheres tailandesas, russas, búlgaras e moçambicanas são traficadas na África do Sul; as nigerianas passam pela África do Sul para depois serem vendidas na Alemanha, na Itália e no Canadá; as sulafricanas são levadas via Hong Kong e Macau.

Segundo as estatísticas elaboradas sobre as vítimas assistidas de 2004 a janeiro de 2010 (fonte OIM - Pretória) 50% eram de origem tailandesa; cerca de 12%, da República Democrática do Congo; 9,5% do Zimbábue; 8% sul africanas; 6,5% moçambicanas e em porcentagem menor as indianas, as chinesas, as nigerianas, as ruandesas, as camaronesas, as filipinas e algumas angolanas, quenianas, romenas, búlgaras, somalis, do Suazilândia, Malaui e Lesoto.

A esta voz de denúncia se unem a das religiosas que participam da rede Sarwatip. Segundo as religiosas, o tráfico de pessoas na África do Sul é interno e externo e existe preocupação com o aumento de pessoas traficadas no período que antecede à Copa do Mundo de futebol sobretudo nos países fronteiriços com a África do Sul, como Moçambique, Lesoto, Zimbabwe e Zâmbia; mas, também com os distantes, como a Tailândia e a Nigéria. O evento dos mundiais reforça o poder atrativo da África do Sul no contexto africano; como país economicamente emergente, alimenta o sonho de melhorar a expectativa de trabalho e de vida.

Uma posterior preocupação de quem luta na África do Sul contra o tráfico de seres humanos é a grande dificuldade de controle, por parte das autoridades competentes, das vastas zona de fronteira; com 10 aeroportos e 8 portos marítimos que favorecem ótimas e rápidas conexões com todo o mundo, a África do Sul é uma rota importante para o tráfico de pessoas.

Mulheres e crianças são as principais vítimas da violência.

Segundo a relação de 2009 divulgada pela UNODC a África do Sul é um dos países com o maior índice de criminalidade do mundo, sobretudo contra a mulher: a cada 6 horas uma mulher é assassinada pelo próprio parceiro. Na África do Sul, 4 entre 10 mulheres foram vítimas de estupro.

A maioria das pessoas traficadas são mulheres, crianças e adolescentes destinados a alimentar o mercado do sexo: a África do Sul é uma das metas internacionais do turismo sexual. Para tentar reduzir o risco de contrair o vírus HIV, os clientes do mercado da prostituição pedem mulheres sempre mais jovens, quando não crianças e adolescentes.

Diversas pessoas caem na rede do tráfico de órgãos, para serem explorados no trabalho mal remunerado e serem reduzidos à condição de escravidão.

Situação legislativa

A África do Sul é um dos países que assinaram o "Protocolo das Nações Unidas sobre a prevenção, abolição e perseguição ao tráfico de seres humanos, em particular de mulheres e crianças" (conhecido como Protocolo de Palermo), que entrou em vigor em dezembro de 2003. Os países que assinaram o Protocolo de Palermo estão empenhados em desenvolver políticas públicas com a finalidade da prevenção do tráfico de pessoas, da defesa das vítimas e da introdução de normas no sistema jurídico e penal pela responsabilização dos traficantes.

No dia 16 de março de 2010, a África do Sul aprovou uma nova lei contra o tráfico; uma norma que entrará em vigor em abril, às vésperas da Copa do Mundo de Futebol. Segundo a Agência jornalística Reuters, com esta decisão, a África do Sul, segue o Moçambique, o Zâmbia, o Suazilândia e a Tanzânia, países do sul da África que já aprovaram uma lei específica contra o tráfico de seres humanos.

Esta lei era esperada e reforça a esperança na prevenção, defesa e responsabilização penal das pessoas envolvidas nesta grave violação dos direitos humanos que poucas vezes conseguimos perceber que existe, simplesmente porque é bem escondida.

O que é o tráfico de pessoas?
O Protocolo de Palermo no art. 3. letra a, define o tráfico de pessoas como: "o recrutamento, o transporte, a transferência, o alojamento, através da ameaça ou do uso da força ou de outras formas de coação, através do rapto, da fraude, do engano, do abuso de autoridade ou de uma situação de vulnerabilidade, ou através da oferta ou aceitação de pagamentos ou de vantagens para obter o consenso de uma pessoa que exercita uma autoridade sobre uma outra com a finalidade da exploração. A exploração compreende, pelo menos, a exploração da prostituição ou outras formas de exploração sexual, o trabalho ou os serviços forçados, a escravidão ou as práticas análogas à escravidão, à servidão ou à retirada dos órgãos".

Como dar continuidade à campanha

A Campanha lançada especificamente para o evento esportivo da Copa do Mundo de Futebol de 2010 na África do Sul não se considera um ponto de chegada no empenho da vida religiosa na prevenção do tráfico. É preciso continuar neste trabalho, multiplicando as forças e envolvendo o maior número de pessoas possíveis; tecendo redes velhas e novas para continuar com paixão a viver o mandamento do amor, contrastando as causas principais que favorecem o tráfico: a pobreza, a desocupação, a discriminação de gênero, a desigualdade social e um modelo econômico perverso e injusto que visa exclusivamente ao lucro de poucos sem importar-se minimamente com a vida de todos.

[O presente artigo será publicado em italiano na revista Combonifem no mês de maio de 2010].

Por Gabriella Bottani, Rede Um Grito Pela Vida
Fonte: ADITAL19/04/2010
Publicado também no site www.oblatas.org.br