quarta-feira, 15 de setembro de 2010

Quem é o meu próximo?



A Parábola do bom samaritano recontada por Rubem Alves

      E perguntaram a Jesus: “Quem é o meu próximo?“ E ele lhes contou a seguinte parábola:
      Voltava para sua casa, de madrugada, caminhando por uma rua escura, um garçom que trabalhara até tarde num restaurante. Ia cansado e triste. A vida de garçom é muito dura, trabalha-se muito e ganha-se pouco. Naquela mesma rua dois assaltantes estavam de tocaia, à espera de uma vítima. Vendo o homem assim tão indefeso saltaram sobre ele com armas na mão e disseram: “Vá passando a carteira“. O garçom não resistiu. Deu-lhes a carteira. Mas o dinheiro era pouco e por isso, por ter tão pouco dinheiro na carteira, os assaltantes o espancaram brutalmente, deixando-o desacordado no chão.

       Às primeiras horas da manhã passava por aquela mesma rua um padre no seu carro, a caminho da igreja onde celebraria a missa. Vendo aquele homem caído, ele se compadeceu, parou o caro, foi até ele e o consolou com palavras religiosas: “Meu irmão, é assim mesmo. Esse mundo é um vale de lágrimas. Mas console-se: Jesus Cristo sofreu mais que você.“ Ditas estas palavras ele o benzeu com o sinal da cruz e fez-lhe um gesto sacerdotal de absolvição de pecados: “Ego te absolvo...“ Levantou-se então, voltou para o carro e guiou para a missa, feliz por ter consolado aquele homem com as palavras da religião.

        Passados alguns minutos, passava por aquela mesma rua um pastor evangélico, a caminho da sua igreja, onde iria dirigir uma reunião de oração matutina. Vendo o homem caído, que nesse momento se mexia e gemia, parou o seu carro, desceu, foi até ele e lhe perguntou, baixinho: “Você já tem Cristo no seu coração? Isso que lhe aconteceu foi enviado por Deus! Tudo o que acontece é pela vontade de Deus! Você não vai à igreja. Pois, por meio dessa provação, Deus o está chamando ao arrependimento. Sem Cristo no coração sua alma irá para o inferno. Arrependa-se dos seus pecados. Aceite Cristo como seu salvador e seus problemas serão resolvidos!“ O homem gemeu mais uma vez e o pastor interpretou o seu gemido como a aceitação do Cristo no coração. Disse, então, “aleluia!“ e voltou para o carro feliz por Deus lhe ter permitido salvar mais uma alma.
           
         Uma hora depois passava por aquela rua um líder espírita que, vendo o homem caído, aproximou-se dele e lhe disse: “Isso que lhe aconteceu não aconteceu por acidente. Nada acontece por acidente. A vida humana é regida pela lei do karma: as dívidas que se contraem numa encarnação têm de ser pagas na outra. Você está pagando por algo que você fez numa encarnação passada. Pode ser, mesmo, que você tenha feito a alguém aquilo que os ladrões lhe fizeram. Mas agora sua dívida está paga. Seja, portanto, agradecido aos ladrões: eles lhe fizeram um bem. Seu espírito está agora livre dessa dívida e você poderá continuar a evoluir.“ Colocou suas mãos na cabeça do ferido, deu-lhe um passe, levantou-se, voltou para o carro, maravilhado da justiça da lei do karma.

          O sol já ia alto quanto por ali passou um travesti, cabelo louro, brincos nas orelhas, pulseiras nos braços, boca pintada de batom. Vendo o homem caído, parou sua motocicleta, foi até ele e sem dizer uma única palavra tomou-o nos seus braços, colocou-o na motocicleta e o levou para o pronto socorro de um hospital, entregando-o aos cuidados médicos. E enquanto os médicos e enfermeiras estavam distraídos, tirou do seu próprio bolso todo o dinheiro que tinha e o colocou no bolso do homem ferido.

        Terminada a estória, Jesus se voltou para seus ouvintes. Eles o olhavam com ódio. Jesus os olhou com amor e lhes perguntou: “Quem foi o próximo do homem ferido?“

Fonte: http://www.rubemalves.com.br/

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

A prostituição n(d)a imprensa


Por Emir Sader

Ocupa quase três páginas diárias no jornal, sob o título Relax, com mais de 200 anúncios de prostitutas se oferecendo, das formas mais diversas. Oferecem-se, desde uma “paraguaia com dificuldades econômicas” até brasileiras que anunciam seus dotes, passando por uma “agência de contactos (sic) necessita senhoritas”, explicitando: “Experimente conosco, notará a diferença. Inclui alojamento.”

A coluna é do jornal El País, o de maior circulação na Espanha, de orientação socialista neoliberal. O negócio do sexo e sua publicidade rendem 50 milhões de euros por dia, 18 bilhões de euros por ano. 90% das prostitutas envolvidas são estrangeiras, metade delas são sulamericanas, 13% menores de idade. 300 mil mulheres são exploradas sexualmente na Espanha. 40 milhões de euros são arrecadados por jornais como El Pais

O governo espanhol, através do seu Ministério da Igualdade, dirigido por uma mulher, Bibiana Aído, tenta, há três anos, encontrar as formas de proibir esse tipo de publicidade, sem sucesso. “...enquanto continuem existindo anúncios de contatos na imprensa séria se estaria contribuindo para a normalização da exploração sexual”, razão pela qual deveriam ser eliminadas, afirma ela, que considera que os anúncios de prostituição “são uma vergonha” e “atentam contra a dignidade da mulher”.

Mas o Ministério que ela dirige busca formas legais que permitam atuar contra essa cínica atividade comercial da imprensa considerada “séria”, que resiste, alegando a “liberdade de expressão” – neste caso, significativamente vinculada, de forma direta à prostituição. Apelou-se para a “auto regulação”, tão a gosto os dos donos das empresas de comunicação, tanto lá, como aqui. Dois jornais – Público, de esquerda, e La Razón, nacionalista – decidiram que não aceitariam esse tipo de publicidade, mas os outros jornais continuaram a publicar e auferir os correspondentes milhões de euros, que lhes ajudam a enfrentar a crise financeira que afeta a todas as empresas de comunicação. Eles demandam “ compensação financeira” – como ocorreu na França, para deixar de promover a prostituição, incluído a infantil, revelando o tipo de caráter, de moral que orienta aos donos da mídia privada. Justamente quando o governo promove um drástico corte de recursos sociais, vêm os empresários privados da mídia pedir essa “compensação”. Até nisso e nessa hora, querem faturar o deles.

Às vezes imprensa privada e prostituição tem muito mais em comum do que simplesmente a mercantilização da informação e a venda dos espaços para as oligarquias políticas tradicionais.


Fonte: http://www.cartamaior.com.br/

Europa Ocidental tem 140 mil ‘escravas sexuais’, diz relatório da ONU



ONU estima que mulheres traficadas movimentem R$ 5,5 bi por ano

Cerca de 70 mil mulheres são vítimas de tráfico sexual para a Europa Ocidental anualmente, segundo estima um relatório da UNODC (agência da ONU para Drogas e Crime).

Segundo o documento O Tráfico de Pessoas para a Europa para Exploração Sexual, haveria atualmente cerca de 140 mil mulheres obrigadas a trabalhar no mercado do sexo na região.

A ONU avalia que essas 140 mil mulheres traficadas façam ao todo cerca de 50 milhões de programas anuais, a um custo médio de 50 euros por cliente (cerca de R$ 109), movimentando um total de 2,5 bilhões de euros (R$ 5,47 bilhões).

O relatório da ONU foi divulgado na Espanha pelo diretor-executivo da UNODC, Antonio Maria Costa, para coincidir com o lançamento da campanha internacional Coração Azul de combate o problema.

“Os europeus acreditam que a escravidão foi abolida há centenas de anos. Mas olhem em volta – os escravos estão em nosso entorno. Precisamos fazer mais para reduzir a demanda por produtos feitos por escravos e por meio da exploração”, afirmou Costa.

Origens

O relatório da ONU cita a região dos Bálcãs como a principal origem das mulheres traficadas para a Europa Ocidental (32% do total), seguida dos países do ex-bloco soviético (19%), mas observa também um aumento no número de mulheres brasileiras traficadas (as sul-americanas são 13% do total).

Segundo a organização, a maioria das vítimas brasileiras de tráfico sexual para a Europa são originárias de regiões pobres no norte do país, principalmente nos Estados do Amazonas, do Pará, de Roraima e do Amapá.

O relatório observa ainda que as vítimas sul-americanas (principalmente do Brasil e do Paraguai) são traficadas principalmente para Espanha, Itália, Portugal, França, Holanda, Alemanha, Áustria e Suíça.

Em Portugal, dados do governo local divulgados na semana passada indicam que as brasileiras são 40% das mulheres traficadas no país.

Na Espanha, segundo os dados da ONU, o número de vítimas brasileiras e paraguaias ultrapassou desde 2003 o de vítimas colombianas, antes majoritárias no país.

Números

O total de 140 mil mulheres traficadas na Europa foi estimado pela ONU com base no número de 7.300 vítimas detectadas na Europa Ocidental em 2006. A organização estima que 1 em cada 20 vítimas seriam detectadas, indicando um total de 140 mil.

A agência estima ainda que o mercado tem uma renovação em média a cada dois anos, levando ao número de 70 mil novas vítimas a cada ano para substituir as que conseguem deixar a condição.

O relatório da ONU, porém, questiona alguns números de pesquisas sobre o tema. O documento cita uma estimativa de 700 mil mulheres trabalhando como prostitutas na Europa Ocidental (incluindo as que trabalham sem coerção).

Mas ao confrontar esse número com as pesquisas que indicam uma média de 6% dos homens pagando por sexo a cada ano nesses países, a organização estima que isso levaria a uma média de dez clientes anuais por prostituta, um número extremamente baixo mesmo que se tratassem de clientes regulares.

Para a organização, ou menos mulheres trabalham como prostitutas ou mais homens estão pagando por sexo com elas – ou ambas as coisas.

Fonte: BBC Brasil