Marcha das mulheres negras em
Brasília, em 2015: a falta de diversidade atrapalha as empresas
Em um momento no qual empresas
fora do Brasil mensuram o impacto positivo da diversidade de raça e gênero em
seu quadro de liderança, ainda se constata passividade e silenciamento frente à
forte exclusão de mulheres, de negras e negros, em posições de comando nas
grandes corporações no Brasil.
Como veremos abaixo, pesquisas
recentes realizadas por renomadas instituições vêm revelando o fortalecimento
de empresas que apostam na presença de mulheres, de mulheres negras, de homens
negros e de diferentes grupos étnicos em seu quadro de pessoal. O Brasil,
entretanto, encontra-se na contramão da história com relação a esta questão.
Segundo publicação do Instituto
Ethos e do Banco Interamericano de Desenvolvimento (em PDF), a despeito de ser
maioria entre a população do País, a proporção de negros nas empresas é muito
inferior a de brancos.
Os negros são maioria em posições
tais como aprendizes e trainees, mas em todo o restante dos quadros das
empresas, os trabalhadores brancos superam em muito os trabalhadores negros.
No quadro funcional, categoria
pela qual se inserem os trabalhadores nas empresas, o número de brancos é quase
o dobro (62,8% de brancos e 35,7% de negros). Em cargos de supervisão, os
brancos são 72,2% frente a 25,9% de negros.
A tendência de sub-representação
aumenta quando são focalizados os cargos mais altos, nos quais a presença de
negras e negros diminui drasticamente.
A população negra sofre com
dificuldades para ascensão profissional, tendo presença simbólica nas posições
mais altas das empresas. Em cargos gerenciais são apenas 6,3% comparados com
90,1% de brancos; no quadro executivo são apenas 4,7%, comparados com 94,2% de
brancos; e nos conselhos de administração são 4,9%, comparados com 95,1% de
brancos.
Ou seja, em nossas empresas, embora
a população negra do País seja majoritária em relação à população total, 53%, o
lugar que lhe é reservado é sempre de subalternidade.
A sub-representação de mulheres
negras, de negros e de mulheres em geral nos cargos diretivos das grandes
corporações é uma questão crucial para o desenvolvimento de um País que não só
perde talentos, mas abre mão de perspectivas diferentes daquelas que são
hegemônicas hoje nas empresas.
O desafio das empresas, no
Brasil, é a criação de um ambiente plural que crie possibilidades de outras relações com a sociedade como um
todo, com cidadãos e cidadãs, clientes, consumidores de produtos e serviços,
assegurando a participação de todas e todos nos processos de tomada de decisões
que afetam o cotidiano da vida, em nossa sociedade.
Executivos seniores de grandes
empresas tais como Mattel, AT&T, L'Oréal USA, Deutsche Bank, Credit Suisse, Intel reconhecem que um
arcabouço diverso de experiências, perspectivas e acúmulos é crucial para
inovação e desenvolvimento de novas ideias, segundo a investigação da Fostering
Innovation Through a Diverse Workforce da revista Forbes.
Perspectivas historicamente
construídas, a partir de lugares culturais, econômicos e políticos diferentes,
podem trazer elementos renovadores para o enfrentamento de problemas cruciais
vividos pelo País, na atualidade.
Inovação e desempenho
Mais de 1,8 mil profissionais
ouvidos e 40 estudos de caso realizados pela Harvard Business Review em 2013
revelaram que quando uma equipe de funcionários da empresa tem pelo menos uma
pessoa da mesma raça/etnia do cliente, a equipe tem 152% mais chances de
compreender melhor o cliente.
Mostraram ainda que empresas cujo
conjunto de líderes tinham perfil diverso, tiveram ampliação da participação no
mercado em que já atuam e conquistaram novos mercados. Igualmente melhoraram os
índices de inovação e desempenho destas empresas.
No ano passado, a McKinsey &
Company analisou os índices de diversidade de gênero e raça das lideranças de
366 grandes empresas dos EUA, Canadá, Reino Unido e América Latina, de variados
ramos de atuação e os comparou aos resultados financeiros dessas empresas entre
2010 e 2013. Dentre as questões
colocadas, uma se destaca:
Esses dados indicam que empresas
com índices altos de diversidade de gênero têm 15% mais probabilidade de obter
resultados acima da média do seu ramo do que empresas com índices baixos de
diversidade; empresas com índices altos de diversidade de raça (ascendência
africana, do Oriente Médio, asiática, indígena, latina, europeia) têm 35% mais
probabilidade de obter resultados acima da média da do seu ramo.
De outro lado, 15 grandes empresas
multinacionais premiadas pela revista Diversity Inc, em 2014 na questão da
diversidade, revelaram possuir políticas para inserção e ascensão de negras e
negros em suas matrizes. Suas filiais brasileiras, no entanto, focalizam quase
que exclusivamente programas relacionados a gênero e pessoas com deficiência.
Esta é a constatação de pesquisa
realizada, em 2014, pelo Centro de Estudos das Relações do Trabalho e
Desigualdades (Ceert), comparando a forma com que as multinacionais abordam a
questão étnico-racial, no Brasil e no exterior.
Fora do Brasil, estas empresas
possuem Conselho de Diversidade, com presença de altas lideranças, que avalia e
define a direção estratégica de programas de diversidade e orientam as lideranças a focar em metas que envolvem
empregados, comunidades, clientes e candidatos.
Desenvolvem também programa de
diversidade para fornecedores, criando oportunidades e desenvolvendo
capacidades para empresas que historicamente encontraram barreiras à
participação.
Criam e apoiam grupos de
funcionários, que atuam com enfoque étnico-racial em vários países; ampliando a
capacidade em diversidade, localizando e acolhendo novos funcionários dos
grupos sub representados.
Desenvolvem treinamentos sobre
diversidade, utilizando websites dinâmicos para estimular o engajamento dos
funcionários e criar um ambiente de trabalho que valoriza e aproveita a
diversidade.
Apoiam organizações
multiculturais, e oferecem tutorias: oferecem programas de tutoriais buscando
transferência de conhecimento efetivo, para grupos sub-representados.
No Brasil, as políticas de
diversidade destas empresas sequer mencionam a questão étnico-racial.
Neste sentido, é preciso decidir
que tipo de país queremos para nós e para os que virão. Se queremos uma
sociedade mais estável, não podemos manter excluídos das instituições e dos
seus processos decisórios segmentos populacionais, em particular os
majoritários.
Há muitas diferentes maneiras de
investir no desenvolvimento do País, e uma delas é combatendo as desigualdades
e a exclusão.
Uma mudança neste cenário, e a
criação de ambientes organizacionais plurais, pode trazer novas perspectivas e
auxiliar a encontrar outras soluções para os velhos problemas que enfrentamos:
de ser um país campeão na questão das desigualdades; que enfrenta grandes
dificuldades de superar a violência, de assegurar os direitos humanos e de
avançar em relação à verdadeira sustentabilidade sócio-ambiental.
*Cida Bento é doutora em
Psicologia e coordenadora executiva do Centro de Estudos das Relações do
Trabalho e Desigualdades (CEERT).
Fonte: Carta Capital
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