Fotos estampam sorrisos, olhares
e caretas. Meninas posam para o próprio celular usando maquiagem, unhas feitas,
roupas de festa ou mesmo o uniforme da escola – sozinhas ou acompanhadas dos
amigos. Tudo é publicado nos perfis de redes sociais para ser “curtido” – a
forma mais rápida e fugaz de aprovação online.
Cada “like” em um “selfie”
(autorretratos feitos com o celular), gato, comida ou sapato novo é esperado
com ansiedade principalmente por crianças e adolescentes que passam cada vez
mais tempo postando e checando a própria popularidade nas redes sociais. Uma
pesquisa à qual a Pública teve acesso na íntegra em primeira mão, realizada
pela ONG Safernet em parceria com a operadora de telecomunicações GVT – que
entrevistou quase 3 mil jovens brasileiros de 9 a 23 anos – revela que 62% deles
está online todos os dias e 80% tem as redes sociais como seu principal
objetivo de navegação. Como acontece no mundo todo, o que prevalece é a
autoimagem – não é à toa que “selfie” foi escolhida como a palavra do ano de
2013 do idioma inglês pelo dicionário Oxford. De 2012 para 2013, seu uso
aumentou 17.000% e a hashtag #selfie acompanha mais de 58 milhões de fotos na
rede social Instagram.
A rotina online de duas garotas
que estamparam páginas de portais, jornais e revistas no último mês não era
diferente. Giana Fabi, de Veranópolis, interior do Rio Grande do Sul, e Julia
Rebeca, de Parnaíba, litoral do Piauí, viviam a maior parte do tempo
conectadas. Separadas por mais de 3,8 mil quilômetros, as meninas de 16 e 17
anos, respectivamente, acompanhavam ansiosamente a reação online às autoimagens
cuidadosamente construídas que postavam.
A descrição das meninas por
amigos e familiares combinam com as fotos: alegres, extrovertidas, falantes,
“adolescentes normais”. Mas em novembro deste ano, uma foto em que Giana
mostrava os seios e um vídeo em que Julia aparecia fazendo sexo com um rapaz e
uma garota foram divulgados através do aplicativo Whatsapp – usado em celulares
– e se espalharam pelas rede com a velocidade dos escândalos virtuais. Julia se
suicidou no dia 10 de novembro e, quatro dias depois, no dia 14, foi a vez de
Giana tirar a própria vida, poucas horas depois de saber que a foto havia sido
compartilhada. As duas deixaram mensagens de adeus nas redes sociais e se
enforcaram.
O caso das adolescentes e outros
envolvendo mulheres que também tiveram sua intimidade divulgada na rede
ganharam grande repercussão em todas as mídias e trouxeram à tona o conceito do
“pornô de revanche” – tradução do inglês “revenge porn” – para se referir à
prática, cada vez mais comum, de divulgar fotos e vídeos íntimos sem o
consentimento da outra pessoa, geralmente por parte de um homem para se vingar
após um rompimento ou traição. Um machismo que não se restringe àquele que
posta a imagem: afinal, por que um vídeo de sexo ou mesmo uma cena de nudez
parcial destrói a vida de meninas e mulheres e não dos homens, que não raro
aparecem nas imagens?
“Esse tipo de ameaça, ligada à
moral sexual e à ideia de que as meninas são mais expostas a uma avaliação
sexual, sempre existiu”, como lembra a socióloga Heloísa Buarque de Almeida. “O
que acontece agora é que como uma grande parte da sociabilidade é feita de
forma virtual, o nível de exposição é muito maior e isso amplia a sensação de
humilhação. Tem algo inovador na ferramenta mas também tem algo que é mais do
mesmo” define a socióloga.
por Andrea Dip, Giulia Afiune
Acesse a íntegra dessa reportagem
no site de origem: Como um sonho ruim (A Pública – 19/07/2016)
Nenhum comentário:
Postar um comentário