A oração é o caminho para o
verdadeiro "tesouro oculto no campo ou a pérola de grande valor” (Mt 13,
44-46). Caminho para a fonte de água viva, para a meta última e essencial da existência
mesma. Além de caminho, porém, a oração é já a posse antecipada do próprio
tesouro e da própria pérola. Posse fugaz e instantânea como o risco de um raio,
mas de intensa e radiosa luminosidade. Posse parcial e que se manifesta de
maneira vivaz, mas aparentemente contraditória, paradoxal.
Por um lado, leva à superação e
ao desapego dos apelos e atrações terrenos, bem como dos bens, riquezas e
desejos materiais. Forja, blinda e fortalece o desprendimento daquilo que, não
obstante a importância temporária, no fundo se revela relativo e supérfluo.
Relativo e supérfluo, aqui, não no sentido descartável, mas no de que ocupa um
lugar secundário, apesar da necessidade. De fato, o essencial permanece sendo o
tesouro encontrado ou redescoberto. Tudo o resto, diante dele, adquire um
caráter não exatamente descartável, mas sempre de segunda mão.
Por outro lado, a mesma oração
leva também a tudo querer, como alguém que tudo abraça, por tudo se apaixona e
de tudo se deixa embriagar – uma vez que tudo fala do tesouro e tudo a ele
conduz. Desse modo, ao mesmo tempo que nos afasta da vida terrena e ao mesmo
tempo que nos põe em alerta contra as tentações "deste mundo”, para usar a
linguagem do Quarto Evangelho, a magia da oração o orna de novas vestes e novas
luzes, enriquece-o de novo tempero. Desvela nele os segredos mais escondidos,
os significados mais profundos. Confere ao viver cotidiano uma beleza antes
desconhecida, revestindo-lhe de cores e sabores inauditos. Numa palavra, a
oração possui o poder de transformar os ruídos e rumores da cidade em uma
sinfonia jamais ouvida. Descortina-lhe todo mistério acessível somente ao
coração e à alma.
Ocorre o mesmo à mais bela e
formosa flor. É como se, nesta,a consciência da efêmera transitoriedade do
próprio esplendor despertasse todo o fulgor, a suprema magnificência. Ciente de
que a vida é breve e transitória, de que pela manhã abre as pétalas à luz do
sol e pela tarde murcha e fenece, enfeita-se com a mais colorida fantasia.
Sedenta e ressequida, procura sorver de um único trago a vida inteira! Talvez
por isso a flor esteja tão vinculada à morte: desfruta a existência de forma
tanto mais intensa quanto mais "sabe” que a morte lhe corre ao encalço.
Assim o fazem as borboletas: suas roupas seduzem porque breve e passageira lhe
é a vida.
Reside aí, simultaneamente, o
fascínio e o alquimia da oração. Transfigura de tal modo o momento presente
que, neste efêmero "aqui e agora”, revela toda a profundidade da
existência humana e todo mistério da eternidade. Transfigura, inclusive, o
conceito mesmo de eternidade. Este, de fato, não é concebido como a vida para
além a morte, e sim como os instantes vividos de forma tão intensa e
resplandecente que deixam suas digitais perenes no tecido tortuoso, retorcido e
fugitivo da história.
Trata-se, em realidade, de
momentos de um brilho tão vívido quanto imorredouro. Momentos de um amor
inesquecível e inapagável, com marcas que jamais poderão ser varridas pelos
ventos dos medos, das tempestades e das tribulações. Instantes mágicos onde a
face do Deus abscondituse desconhecido – como Abba= Pai – imprime uma
luminosidade ao mesmo tempo fugaz e eterna. Aqui, de forma simultânea, se
revela e esconde o essencial que é sempre "invisível aos olhos”
(Saint-Exupéry).
Fonte: Adital
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