domingo, 5 de junho de 2016

A magia da oração

A oração é o caminho para o verdadeiro "tesouro oculto no campo ou a pérola de grande valor” (Mt 13, 44-46). Caminho para a fonte de água viva, para a meta última e essencial da existência mesma. Além de caminho, porém, a oração é já a posse antecipada do próprio tesouro e da própria pérola. Posse fugaz e instantânea como o risco de um raio, mas de intensa e radiosa luminosidade. Posse parcial e que se manifesta de maneira vivaz, mas aparentemente contraditória, paradoxal.


Por um lado, leva à superação e ao desapego dos apelos e atrações terrenos, bem como dos bens, riquezas e desejos materiais. Forja, blinda e fortalece o desprendimento daquilo que, não obstante a importância temporária, no fundo se revela relativo e supérfluo. Relativo e supérfluo, aqui, não no sentido descartável, mas no de que ocupa um lugar secundário, apesar da necessidade. De fato, o essencial permanece sendo o tesouro encontrado ou redescoberto. Tudo o resto, diante dele, adquire um caráter não exatamente descartável, mas sempre de segunda mão.

Por outro lado, a mesma oração leva também a tudo querer, como alguém que tudo abraça, por tudo se apaixona e de tudo se deixa embriagar – uma vez que tudo fala do tesouro e tudo a ele conduz. Desse modo, ao mesmo tempo que nos afasta da vida terrena e ao mesmo tempo que nos põe em alerta contra as tentações "deste mundo”, para usar a linguagem do Quarto Evangelho, a magia da oração o orna de novas vestes e novas luzes, enriquece-o de novo tempero. Desvela nele os segredos mais escondidos, os significados mais profundos. Confere ao viver cotidiano uma beleza antes desconhecida, revestindo-lhe de cores e sabores inauditos. Numa palavra, a oração possui o poder de transformar os ruídos e rumores da cidade em uma sinfonia jamais ouvida. Descortina-lhe todo mistério acessível somente ao coração e à alma.

Ocorre o mesmo à mais bela e formosa flor. É como se, nesta,a consciência da efêmera transitoriedade do próprio esplendor despertasse todo o fulgor, a suprema magnificência. Ciente de que a vida é breve e transitória, de que pela manhã abre as pétalas à luz do sol e pela tarde murcha e fenece, enfeita-se com a mais colorida fantasia. Sedenta e ressequida, procura sorver de um único trago a vida inteira! Talvez por isso a flor esteja tão vinculada à morte: desfruta a existência de forma tanto mais intensa quanto mais "sabe” que a morte lhe corre ao encalço. Assim o fazem as borboletas: suas roupas seduzem porque breve e passageira lhe é a vida.

Reside aí, simultaneamente, o fascínio e o alquimia da oração. Transfigura de tal modo o momento presente que, neste efêmero "aqui e agora”, revela toda a profundidade da existência humana e todo mistério da eternidade. Transfigura, inclusive, o conceito mesmo de eternidade. Este, de fato, não é concebido como a vida para além a morte, e sim como os instantes vividos de forma tão intensa e resplandecente que deixam suas digitais perenes no tecido tortuoso, retorcido e fugitivo da história.

Trata-se, em realidade, de momentos de um brilho tão vívido quanto imorredouro. Momentos de um amor inesquecível e inapagável, com marcas que jamais poderão ser varridas pelos ventos dos medos, das tempestades e das tribulações. Instantes mágicos onde a face do Deus abscondituse desconhecido – como Abba= Pai – imprime uma luminosidade ao mesmo tempo fugaz e eterna. Aqui, de forma simultânea, se revela e esconde o essencial que é sempre "invisível aos olhos” (Saint-Exupéry).

Fonte: Adital

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