segunda-feira, 6 de junho de 2016

5 atitudes que explicam o que é a cultura do estupro

Cresci ouvindo que mulher tinha que se vestir de um jeito e não de outro. Que não podia rebolar muito. Que vestido curto era coisa de puta. Que dependendo da minha atitude, da minha roupa a noite, eu estaria pedindo pra ser estuprada. Que assobios e gritos de "gostosa" de homens na rua, era coisa boa, que deveria me deixar com a autoestima no topo...


*Texto escrito por Gabi Barbosa, no Superela.

Aos 10 anos, quase conheci o que era estupro. Um cara estranho e horroroso que era "amigo" do meu avô me deu um abraço diferente. E eu tentei sair e ele me segurou. Depois não sei o que deu nele, ele soltou os braços um pouco, pra dar uma respirada bem funda. Eu saí correndo dali. Acho que dei foi muita sorte.

Fiquei na calçada do lado de fora da casa, escondida. Quando o carro do meu avô vinha ao longe, eu me joguei na frente do portão e falei "Vô, seu amigo me abraçou!". E meu Avô, mais que revoltado, foi logo dizendo: "Me conte exatamente o que esse desgraçado te fez, minha filha!". E então eu relatei que ele me abraçou "diferente", com força e eu quis sair e ele segurou mais, mas que depois me soltou. Nunca tinha visto meu avô tão transtornado.

A mulher que nos ajudava na limpeza da casa, que estava lavando roupa, não viu nada. Minha avó não estava em casa. Meu avô disse para eu ficar no no portão, do lado de dentro. Trancou o carro e foi pra dentro de casa. Eu nunca vi meu avô bater em ninguém como bateu naquele homem. Ali, naquele dia, eu tive uma sorte grande na vida. Ele poderia ter feito o pior. Eu era muito nova e ingênua pra entender o que tinha quase acontecido.

Mais tarde, aos 22, eu tive um ex que tentou fazer sexo a força comigo dias antes de tomar um pé meu. Aqui em Porto Alegre, já fui encochada por um cara no ônibus. A sorte é que aqui, quando a gente reclama com eles, logo surgem 3 ou 4 pra colocar ele pra fora do ônibus. E podem contar nos dedos de uma mão só, meninas e mulheres, a partir dos 8, 10 anos, que não têm uma história dessas pra contar.

Cresci ouvindo que mulher tinha que se vestir de um jeito e não de outro. Que não podia rebolar muito. Que vestido curto era coisa de puta. Que dependendo da minha atitude, da minha roupa a noite, eu estaria pedindo pra ser estuprada. Que assobios e gritos de "gostosa" de homens na rua, era coisa boa, que deveria me deixar com a autoestima no topo. Que "mulher que dá na primeira noite" é puta. Que "puta não merece respeito". Que se eu for estuprada, "a culpa é minha por causa da roupa, do horário ou de onde eu estava".

Eu me visto como eu quiser, como me sentir bem. Não preciso fazer esforço pra rebolar enquanto ando, é algo natural do meu corpo de mulher. Vestido curto é lindo e feminino e eu amo. A minha roupa não justifica a falta de caráter de um homem se achar no "direito" de me estuprar. Cantadas pela rua são desnecessárias e constrangedoras e eu odeio isso. Mulher que dá na primeira noite é segura de si e bem resolvida. Puta merece tanto respeito quanto as demais mulheres. Se eu for estuprada é apenas resultado de uma sociedade machista que cria monstros.

A maioria fica impune. Feminismo não é o contrário de machismo, nunca foi. Feminismo é a luta pelo respeito à mulher. E sim, nós, mulheres, não somos pedaços de carne ambulantes. Vivemos a noite pelas ruas, com medo de sermos a próxima. Culpa da nossa cultura machista. Culpa de quem propaga coisas como "ela estava de saia curta, pediu". Nada que façamos justifica um estupro. Nada. Quando estupradores são presos, nos sentimos vingadas. Na prisão eles sentem o que sentimos todos os dias.

Vejam cinco atitudes que mostram o que é a cultura do estupro:

1. Achar que mulher de biquíni "está pedindo"

Ontem eu vi um instagran, @supergatasbrasil, são fotos de mulheres de biquíni, em poses sensuais, realmente elas são lindas. O que me assustou foram comentários como "Da vontade de meter tudo dentro desse cu gostoso". E tinha comentários muito piores, não consegui continuar lendo.

2. Dizer que a culpa é da mulher

Sobre a menina de 16 anos que foi estuprada por 33 homens no Rio de Janeiro, já tiveram comentários como "ela estava em um baile funk", "ela bebeu", "ela deveria estar estudando".
3. Achar legal e engraçado se for em tom de piada
Se a pessoa for famosa, como Alexandre Frota, ela conta em um programa como o 'Agora é tarde', que estuprou uma mãe de santo até ela desmaiar e é aplaudida. Somos vistas como objetos o tempo todo.
4. Objetificar a mulher

Já viu propaganda de cerveja com homem pelado? E com mulher pelada? Elas estão ou de biquíni ou de saia curta. Sempre. Você vê mulheres compartilhando conteúdo de homens transando em grupo ou nus no whats? E homens compartilhando esse tipo de conteúdo?

5. Perpetuar a ideia de que "só é estupro se for desconhecido"

Pode ser um desconhecido, pode ser o namorado, pode ser um peguete, pode ser o crush, pode ser o marido; independente de quem seja. Se a mulher não quis e o homem fez, é estupro.  O machismo estampado na cultura do estupro perpetua o conceito errado de que a culpa é da mulher.

***

Isso é apenas parte do que é a cultura do estupro. Ela é difundida com piadinhas na escola, no trabalho, nas reuniões com amigos.  Foram feministas norte-americanas que usaram esse termo lá por 1973. Já naquela época, elas tentavam acabar com esse tipo de comportamento. Homem estupra "pra mostrar que é homem, matador, comedor". Mulher é estuprada "por que pediu, estava no lugar e horário errados".

Quando saímos de casa de saia curta, no verão ou mesmo no inverno, com meia calça, ficamos felizes e nos sentimos bem femininas. Mas os olhares pelas ruas, sem respeito e com ousadia, como se fossem donos dos nossos corpos e estivéssemos fazendo algo errado, nos fazem sentirmos como criminosas. Com medo de ser a próxima por causa da roupa.

Aprendemos desde pequena que nosso comportamento faz o homem ter tal atitude. Está na hora disso acabar. Dia desses li "não ensinem suas filhas a usar roupas longas, ensinem seus filhos a respeitar as mulheres".

É por aí.


Fonte: Superela

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