Um simples caminhar do metrô até
em casa: calça jeans, blusa regata com renda cinza, tênis. "Que
delícia", ouço de um desconhecido. Sinto olhares invasivos de alguns
homens em minha direção e apenas caminho, desejando ficar invisível para talvez
conquistar algum tipo de respeito em pleno espaço público. Escuto "fiu
fiu" de outro desconhecido. Mais que isso, ainda assim há quem justifique
tamanho assédio na vestimenta que uso. "Quem usa roupa curta é porque tá
pedindo". Mas minha roupa nem era curta e, mesmo se fosse, qual seria o
problema?
Essa lógica faz parte de algo
perverso nomeado cultura do estupro. Conceito que naturaliza a violência contra
a mulher na sociedade, tornando o estupro algo tolerável e, de certo modo,
incentivado.
A relação de poder que permeia
essa cultura mantém a mulher em estado de medo permanente. Andar desacompanhada
em locais vazios durante a noite torna-se incabível. Constrói-se a imagem do
estuprador como um homem em um beco escuro quando, na verdade, a maior parte
dos agressores é conhecida da vítima.
Culpam as mulheres pelo assédio
sofrido devido à sua roupa e seu comportamento, quando o responsável pelo abuso
é unicamente o seu agressor. Cria-se, então, um panorama no qual mulheres são
ensinadas a se portar, no entanto, homens é que deveriam ser ensinados a não
estuprar.
Intrínseca à sociedade, a cultura
do estupro passa despercebida pela maioria das pessoas. A negação da cultura
apenas a reforça, visto que, aqueles que agem com indiferença em relação a essa
não tem intenção em amenizá-la ou, principalmente, extingui-la. Casos como o
recente relato de estupro narrado por Alexandre Frota em rede nacional ilustram
a banalização do tema. Após a confissão do abuso, Frota o justificou dizendo
"É piada", como se um relato de um estupro fosse algo digno de riso.
Riso que não é apenas dado pelo
relator, mas também por uma plateia que o aplaude. Aplausos resultantes do caso
no qual uma mulher que, mesmo ao pedir "para" e até desmaiar,
continua sofrendo com o ato sexual daquele homem. Essa naturalização do estupro
permite que a sociedade sinta prazer com a dor da vítima, mesmo que muitos nem
se deem conta de que a situação descrita é de violência contra a mulher.
A cultura do estupro também está
presente quando dizem que uma mulher faz charme ao dizer não. A objetificação é
tão intensa que o homem vê o "não" como irrelevante e a
consensualidade pouco importa, uma vez que a mulher é vista como sua
propriedade e, além disso, está lá a sua disposição. Muitas campanhas
publicitárias perpetuam essa cultura, expondo situações onde as mulheres são
altamente objetificadas e sexualizadas. A cultura do estupro torna o corpo da
mulher algo público, no qual qualquer um pode tocar ou apalpar. A
individualidade da mulher se perde e ela passa a ser vista como um mero produto
sexual.
Fruto de um sistema machista e
patriarcal é a cultura do estupro que naturaliza a violência sofrida pelas
mulheres, que as culpabiliza e objetifica. É a cultura do estupro que não
permite que mulheres caminhem com segurança no trajeto do metrô para a casa. É
a cultura do estupro que permite com que uma plateia ria de um relato de agressão
em plena rede televisiva. É a cultura do estupro que tolera deputados que
dividem mulheres em quais devem ser estupradas ou não. É essa mesma cultura que
violenta mais de 50 mil mulheres por ano em nosso país.
Por Claudia Ratti e Nathalia
Parra
Fonte: http://www.brasilpost.com.br/frente-feminista-casperiana-lisandra
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