“Um novo mundo a partir de uma perspectiva igualitária entre o gênero
feminino e o masculino deve ter como respaldo um grupo constituído por nós
mesmas/os, capaz de avaliar nossa compreensão do mundo e ajudar-nos a dar novos
passos no claro-escuro de nossa história.”
Ivone Gebara
por Alessandra Miranda, assessora nacional de Direitos Humanos da
Cáritas Brasileira
Estamos nos aproximando da
celebração do Dia Internacional da Mulher. Muitos dos grupos, coletivos de
mulheres e movimentos sociais retoma essa data na perspectiva do ato político,
que foi de fato o que levou mais de 130 mulheres a darem a vida para que
direitos humanos fundamentais fossem garantidos. Aprofundar sobre as mulheres e
sua historicidade, nos dá boas condições para refletir e aprofundar com os
elementos do passado e do presente, com as condições sociais que permeiam as
histórias e contradições vigentes nos processos de compreensão de identidades
de gênero.
A presença da mulher nessa história
Com a presença da mulher nos
espaços de debate e pautas em torno da questão de suas próprias vidas, recupera-se
a presença da mulher na história. Assumimos o termo “recuperar” em função do
reconhecimento de tantas outras mulheres que historicamente contribuíram para a
efetivação dessa presença, colaborando para novos olhares, novas metáforas,
fazendo perguntas e principalmente desconfiando das categorias já dadas como
únicas e carregadas unicamente de poder. Podemos constatar então que as
abordagens das categorias de gênero têm um eixo altamente político e, que sendo
assim, não tem como falar de gênero sem falar de política.
Algo importante nessa percepção é
perceber que as “Histórias das mulheres” não são apenas delas, são da família,
da mídia, da criança e estão diretamente ligadas a história dos homens e das
relações de poder estabelecidas ao longo dos tempos.
Olhando o comportamento do senso
comum, teríamos o discurso de que as mulheres em espaços públicos devem ser
temidas, pois são mais instintivas e menos racionais. Dessa maneira colocava-se
em ameaça o mundo racional masculino necessário na geração de renda, permeado
pelo modelo selvagem capitalista de ser. Deste modo, estava excluída a
possibilidade de homens e mulheres ocuparem os mesmos espaços. Quem nunca
escutou: “lugar de homem é na rua garantindo o dinheiro e de mulher é em casa
cuidado da casa e dos filhos”?
Resistência de mulheres
Vozes e lutas, muitas vezes
isoladas deram início as resistências de mulheres, conclamando assim as
matriarcas das lutas, deste o antigo testamento, Ruth, Sara, Débora, Ester,
Miriam e outras que na memória da história do Povo de Deus, apresentam modos de
organização e participação social daquele tempo.
No momento contemporâneo, outras
mulheres feministas sucedem essas lutadoras da resistência e engrossam as lutas
daquelas que já agiam por igualdade entre os gêneros. Embora todos os discursos
não se traduzam da mesma forma, todas apontam para o horizonte da garantia dos
direitos sociais, civis e políticos das mulheres.
Realidade das mulheres brasileiras
Na conjuntura política do país, o
governo brasileiro em 2003, criou a Secretaria de Política para as Mulheres,
que tem como principal objetivo combater as desigualdades de gênero. Para isso
foi elaborado o Plano Nacional de Políticas para as Mulheres. Segundo dados da
Secretaria Nacional para Mulheres do governo Federal, em 2011, as mulheres, em
sua totalidade, apresentam uma média de escolaridade maior do que a dos homens,
o que não lhes assegura salário equivalente. Os homens recebem, em média, R$
1.417,00 e as mulheres, R$ 997,00; que equivale a 70,4% do rendimento
masculino. A parcela de famílias chefiadas por mulheres vem crescendo: passou
de 35,2% em 2009 para 37,4% em 2011. Porém as mulheres ainda continuam, em sua
grande maioria, com a responsabilização total pelas tarefas domésticas, o que
resulta na jornada dupla (às vezes até tripla) de trabalho. Estes dados nos
colocam no lugar de perceber a concepção de que o espaço doméstico é por
excelência feminino (lugar privado), reafirmando o que anteriormente já era
destacado na construção dessas identidades.
Quando o assunto é violência
contra as mulheres, os dados da Organização Mundial de Saúde (OMS) mostram que
o Brasil está entre os 10 países com maior número de homicídios de mulheres
(dados de 2007 a 2011).
Nesse contexto a Lei nº
11.340/2006 (conhecida por Lei Maria da Penha) representa um grande avanço no
sentido de coibir a violência doméstica e familiar contra a mulher. Porém com
passos a serem dados na efetivação concreta da justiça pelo fim da violência
contra as mulheres. Sabemos que são questões fortemente enraizadas na sociedade
de tradição patriarcal que concebe qualquer forma de violência contra as
mulheres, inclusive as simbólicas. Sendo assim, um dos desafios é trabalhar na
perspectiva de geração de consciência para observarmos e agirmos sobre as estruturas
que historicamente colocam a mulher em lugar de propriedade e submissão a
figura masculina.
O Fórum Econômico Mundial de
2012, que monitora as disparidades de gênero. Apresenta o dado de que a 82ª
posição que o Brasil ocupava caiu para a 62ª, posição na melhoria de acesso de
mulheres às políticas públicas desenvolvidas no âmbito da participação econômica,
acesso à educação e empoderamento político.
Mudanças nas relações são mudanças políticas
Nos mais diversos âmbitos de
debates ou de assuntos que sem dúvida merecem atenção sobre as realidades
vivenciadas pelas mulheres, é fundamental a mudança de compreensão das
relações, que são no seu mais completo significado mudanças políticas.
O significado da palavra política
já nos reporta a isso, os interesses não são apenas meus interesses, mas do
conjunto da sociedade. Não podemos crer em opção política sem a preocupação com
as formas de relações de poder que estabelecemos. A maneira com que mulheres e
homens relacionam entre si, apresenta um modo de fazer, o que acaba sendo
concreto e não abstrato nos espaços onde as relações se dão na sua totalidade:
família, amigos, trabalho, escola, universidade, vizinhos…
Somos convocados/as a pensar a
nossa ação cristã para a transformação com alcance da sociedade do Bem Viver. O
que nos permite dar importância a memória? Memória de matriarcas que nos
antecederam, com suas sabedorias, simplicidades, ousadias e belezas. Essas
memórias devem nos ajudar para que nos grupos e espaços onde consolidamos
nossas relações, possamos exercitar o que a memória nos provoca o tempo
inteiro: olhar, resignificar e agir para a continuidade de luta pela
conscientização, que, segundo Paulo Freire, deve passar pela ação.
Que possamos ser comunidades de
mulheres e homens, construindo sentidos que tenham valor para criar coisas
novas e que seja desejo de gosto bom para todas e todos, com empoderamento e
participação no poder-serviço.
Oxalá possamos todos/as nós
olharmos para esse dia da memória que celebramos em 8 de março e encontrar
outros significados nas rosas que são tão comuns para nós mulheres recebermos
nesse dia. Mas que ao olhar para nós, os
homens possam dizer: você é sinal de resistência, e de muita coragem, estou com
você nas suas lutas diárias da vida, percebo suas potencialidades que fizeram
de você mulher e que luto com você pelas pela sociedade do Bem Viver. E que nós
mulheres possamos dizer para nós mesmas e para as outras mulheres que são
conosco: Com nossas cabeças levantadas, vamos participar. De nós pode renascer
o novo, é nisso que devemos acreditar, vamos encontrar a beleza a reciprocidade
e gratuidade em tudo e com tudo. Que assim seja!
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Fonte: http://caritas.org.br/
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