segunda-feira, 9 de fevereiro de 2015

Sexualidade: o Papa mais audaz do que seu entorno

"As pessoas mais próximas do Papa parecem mais para trás com respeito ao seu chefe sobre este tema. Ou pelo menos temerosas. Os cardeais Reinhard Marx e Oscar Maradiaga, duas colunas do órgão consultivo de Francisco, ainda tem muito caminho a fazer no que se refere ao seu modo de considerar a homossexualidade"

Isto escreve  Phillippe Clanché, autor do livro Mariage pour tous, divorce chez les cathos [Casamento para todos, divórcio entre os católicos (Plon), que será apresentado quinta-feira, 12 de fevereiro em Bordeaux, em artigo publicado pelo sítio Cathoreve, 02-02-2015. A tradução é de Benno Dischinger.

Eis o artigo.

No sábado, 24 de janeiro, Diego Neria Lajárraga, espanhol de 28 anos, encontrou privadamente o Papa Francisco. Diego nasceu menina e decidiu mudar sexo há alguns anos. Em dezembro passado, recebeu um telefonema do Papa que lhe disse ter ficado comovido com a sua carta. E foi com a sua companheira, com a qual pretende formar uma família, que o transexual espanhol foi ao colóquio com o Pontífice.

A gente quase não se surpreende mais com os encontros pessoais queridos pelo Papa argentino com pessoas de percursos pessoais e familiares atípicos. Embora estes encontros não sejam jamais confirmados pelo serviço de comunicação da Santa Sé, o Papa deixa que os seus interlocutores falem deles publicamente. A existência desses encontros já é longa sob o olhar de Francisco ante aqueles que estão “não em regra”. Dado que “estar em regra” significa: matrimônio religioso (até a morte de um dos cônjuges) e procriação (nesta ordem). Que o matrimônio seja entre um homem e uma mulher, é supérfluo dizê-lo. Estar “não em regra” não significa, para o Papa, estar fora da Igreja, nem fora da solicitude pastoral desta última, nem fora da reflexão sobre possíveis modificações da disciplina. O segundo sínodo sobre a família será, sem dúvida, caracterizado por esta nova realidade. Consequentemente se está muito atento às declarações de todos os personagens influentes que agem para orientar o encontro dos bispos em outubro.

As pessoas mais próximas do Papa nos parecem, talvez, mais para trás com respeito ao seu chefe sobre este tema. Ou pelo menos temerosas. La Croix nos faz saber que os cardeais Reinhard Marx (arcebispo de Munique) e Oscar Maradiaga (arcebispo de Tegucigalpa), duas colunas do órgão consultivo de Francisco – são membros do G8 -, ainda tem muito caminho a fazer no que se refere ao seu modo de considerar a homossexualidade. Interrogado pela revista jesuíta America sobre a eventualidade de abençoar casais do mesmo sexo, o prelado alemão responde: “a relação sexual é uma relação fiel fundada sobre o elo entre procriação, dom de amor, sexualidade e abertura à vida”. E mais adiante esclarece: “Não podemos excluir este grande modelo de sexualidade e dizer ‘temos diversidade’, ou ‘cada um tem o direito de...”.

Numa conferência citada pela revista estadunidense, o seu coirmão hondurenho Maradiaga exprime substancialmente o mesmo conceito: “Não somos uma Igreja ‘à la carte’ como fazem outras confissões. Perguntais isto? Vo-lo damos. E também isto? Ei-lo”. O desejo de reconhecimento dos casais homossexuais, muito tímido entre os católicos que sabem quanto o caminho será longo, é aqui considerado como uma requisição indevida, absolutamente não recebível e que confina com o capricho. A maior parte das pessoas sérias reconhece que a realidade homossexual não depende de uma escolha. Por isso, fazer uma analogia entre a solicitação de bênção destes casais com o cardápio do restaurante no qual se escolhe a própria satisfação é pelo menos ofensivo.

Quanto à “diversidade” que parece perturbar o cardeal Marx, trata-se, no entanto, de uma realidade reconhecida na Igreja. Mons. Jean-Luc Brunin, que se ocupa deste tema no episcopado francês, repete que é oportuno falar não de pastoral da família, mas de pastoral das famílias, insistindo fortemente no plural. Os casais do mesmo sexo são chamados entrar entre as preocupações das pessoas encarregadas ad hoc na Igreja católica.

E o que dizer do cardeal Maradiaga que justifica a sua posição fazendo referência ao episódio da mulher adúltera? Os homossexuais apreciarão o fato de serem comparados àquela pecadora que Jesus liberta de sua culpa solicitando-lhe que não peque mais? Deste modo torna a vigorar o princípio teológico que permite, em teoria, um lugar para todos os efeitos na Igreja católica a um criminoso que promete não recair no pecado, mas não a um homossexual (ou a um divorciado redesposado) cujo problema permanece.


“Quem sou eu para julgar?“, dizia o Papa Francisco em referência ao caso de um homossexual católico. O que sabem os nossos dois cardeais sobre a vida dos homossexuais, para darem semelhantes respostas a problemas tão delicados, tão humanos?

Fonte: Ihu

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