quinta-feira, 12 de fevereiro de 2015

Escolas não ensinam o bastante sobre sexismo, diz pesquisa

As instituições devem priorizar o ensino sobre a igualdade de gêneros para contestar a aceitação de comportamento violento.


A opinião dos adolescentes sobre quando a violência sexual da parte do parceiro é aceitável ou não é influenciada pela maneira como eles observam os homens e as mulheres e os relacionamentos entre eles. Dizer simplesmente aos jovens que a violência é algo errado não vai impedir que ela persista. As crianças precisam ter aulas nas escolas sobre gênero e sexualidade de modo a impedir que a violência acabe se tornando algo aceitável em determinadas situações.

Durante toda a adolescência os jovens são expostos a altos níveis de violência sexual. O abuso físico foi citado por um quarto das meninas e 18% dos meninos numa pesquisa realizada em 2009, com indivíduos de 13 a 21 anos de idade. Na mesma pesquisa, o abuso sexual foi reportado por mais de um terço das meninas e 16% dos meninos. Tanto os adolescentes mais jovens como os mais velhos falaram de violência cometida pelo parceiro.

Acusando mulheres. Muitos jovens toleram a violência no relacionamento. Um estudo emblemático realizado em 1998 pelo Zero Tolerance Charitable Trust concluiu que quase metade dos jovens que participaram da pesquisa disseram ser aceitável um namorado agir agressivamente com relação à parceira em certas circunstâncias. Além disto, para três quartos dos rapazes e mais da metade das meninas participantes da pesquisa, a mulher era “com frequência”, ou “às vezes”, culpada pela violência da qual foi objeto. Pesquisa mais recente sugere também que os jovens podem aceitar cada vez mais a violência em determinadas circunstâncias.

Outra pesquisa concluiu que pode existir um vínculo entre atitudes de gênero conservadoras e a aceitação da violência. Embora a consciência de que os jovens aceitam a violência seja cada vez mais forte, nossa compreensão das razões disto está menos desenvolvida.

Minha própria pesquisa com jovens de 14 e 15 anos de idade no norte da Inglaterra revelou que os jovens têm uma compreensão não muito consistente sobre que tipo de comportamento é violento e quando é inaceitável. Os jovens prontamente e claramente caracterizaram a violência abarcando uma série de comportamentos, incluindo o abuso físico, verbal, sexual e emocional. Empurrões, gritos, ciúme, insultos, estupro e abuso infantil, tudo isso foi citado como exemplos de comportamento violento.

Muitos jovens, no meu estudo, também me pareceram conscientes de que a violência, na maior parte das vezes, é exercida por eles. Alguns participantes forneceram descrições detalhadas de pessoas que praticaram violência que tinham características racistas ou baseadas em classe social. Uma pequena minoria de adolescentes disse que mulheres cometiam violência.

Nem sempre um problema. Os jovens que entrevistei foram menos consistentes em suas opiniões quanto a se a violência é um problema. Nem todo ato violento é visto como “ruim” e alguma violência é até considerada aceitável ou merecida. As opiniões dos jovens variaram de acordo com a descrição da violência, mas, mais importante, de acordo com sua compreensão de como homens e mulheres se comportam em circunstâncias diferentes.

A violência entre homens foi predominantemente vista como natural, inata e motivada por uma biologia especificamente “masculina”. Este tipo de violência nunca foi encarado positivamente, mas muitas vezes como necessário ou compreensível quando o ato violento tem por fim resolver uma disputa, como proteger a mulher amada, ou mostrar virilidade.

Os jovens recorreram a ideias muito tradicionais sobre o comportamento masculino para justificar a violência entre os homens. Em outras palavras, a violência é aceita porque está sendo usada para mostrar ou reforçar um comportamento de gênero esperado.

Errado ou banal? A violência masculina com relação às mulheres foi considerada “errada” por uma ampla maioria de jovens. Mas quando cenários específicos foram discutidos, os jovens começaram a dar justificativas. Eles consideraram a violência aceitável e até merecida em alguns casos, particularmente nos casos em que as mulheres não estariam tendo o comportamento esperado num relacionamento, como mentir para o parceiro ou serem infiéis.

Num cenário hipotético em que a violência foi considerada aceitável por alguns, Steve estava brincando com o telefone da namorada e viu que ela recebeu muitas mensagens de texto de um outro garoto da sua classe. Quando ele perguntou à namorada a respeito, ela respondeu que deveria ter permissão para ter amigos homens e disse que ele não deveria se chatear com bobagem. Steve empurra a namorada e a chama de “p…”.

A violência das mulheres para com homens também foi considerada não problemática. No geral foi vista como uma resposta compreensível por parte de uma jovem, mesmo que seja um comportamento indesejável. Para os jovens que entrevistei, as mulheres são mais emotivas e mais frágeis do que os homens. Elas também seriam fisicamente mais frágeis e seu potencial para ferir ou causar danos em alguém não era considerada importante.

Ideias sobre gênero. Tudo isto sugere que apenas dizer aos jovens que o uso da violência é errado não os impedirá de aceitá-la. Os jovens têm uma compreensão que não é muito clara da violência e que é muito influenciada por suas ideias sobre gênero – o que é normal, esperado e apropriado no caso de homens e mulheres, tanto num relacionamento como fora dele.

Esta distinção entre diferentes formas de violência torna a prevenção em grande escala difícil. Como o gênero parece ter forte influência na visão da violência pelo jovens, as escolas devem priorizar o ensino sobre a igualdade de gêneros para efetivamente contestar a aceitação e justificativa de algumas formas de comportamento violento.

Isto pode incluir ensinamentos multidisciplinares sobre estereótipos em matéria de gênero, sexismo, pressões sexuais e de gênero, assédio baseado no gênero e violência. Pesquisa recente sugere que a violência física e sexual também predomina no ensino superior, indicando a necessidade de um trabalho preventivo logo no início do ciclo educacional.

Fonte: O Estado de S. Paulo,

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