Entrevista com Lucetta Scaraffia
Francisco, ele mesmo, disse isso
muito claramente. Esta frase, especialmente: 'Sofro quando vejo na Igreja que o
papel de serviço da mulher – aquele papel que todos nós devemos ter – desliza
para a servidão'. Pois bem, ainda há muitas mulheres que, na Igreja, vivem em
condições de servidão, são empregadas domésticas ou cuidadoras dos padres e são
tratadas como servas."
A reportagem é de Gian Guido
Vecchi, publicada no jornal Corriere della Sera, 04-02-2015. A tradução é de
Moisés Sbardelotto.
A historiadora Lucetta Scaraffia,
coordenadora do caderno Donne, Chiesa, Mondo [Mulheres, Igreja, Mundo] do
jornal L'Osservatore Romano, foi chamada para concluir, no próximo sábado,
aassembleia sobre as "culturas femininas" no Vaticano. Ela vai falar
sobre o futuro.
Eis a entrevista.
Parece que há o pedido de que, na Igreja, haja uma maior atenção, não?
Sim, por um motivo inevitável. A
Igreja, especialmente no Ocidente, está desorientada. É um mundo absolutamente
no masculino, em nível decisional, mas composta na maior parte de mulheres.
Dois terços dos religiosos são mulheres, das missionárias às freiras de
clausura. E são as mulheres que já levam as paróquias para a frente, ensinam o
catecismo, cuidam das crianças, ajudam idosos e doentes.
Mas?
Mas a sua voz não é ouvida. Não é
uma questão de poder, mas de voz. De escuta da sua voz e de participação nos
processos decisionais. Não se trata de sacerdócio ou de mulheres cardeais. Não
haveria a necessidade de mudar nada...
Por exemplo?
Acho vergonhoso, por assim dizer,
que as mulheres não façam parte das congregações que precedem o conclave. Há
cardeais, bispos e as ordens religiosas masculinas, justamente. Mas as madres
gerais, as representantes de organizações internacionais, estas não. Mulheres
muito importantes, que teriam muito a dizer, e ninguém as escuta. Além disso, é
ridículo que não haja mulheres na cúpula dos dicastérios dos leigos ou da
família. Mesmo entre os religiosos, a única mulher é subsecretária.
Como as mulheres reagem?
Eu as vejo exasperadas, sem
confiança. Estão por conta própria. Essa é uma perda grave para a Igreja.
Porém, algo se move. O caderno
feminino do L'Osservatore Romano, as cinco mulheres nomeadas para a comissão
teológica internacional...
O caderno nasceu há três anos,
sob o pontificado de Bento XVI, justamente para mostrar que as mulheres
existiam, para que não fossem ignoradas.
Você falava do Ocidente. E em outros lugares?
Em muitas partes do mundo, a
Igreja é a instituição mais feminista que existe, graças às mulheres. Pense nas
missionárias que, na África ou na Ásia, fazem estudar as meninas que, de outra
forma, seriam excluídas das escolas. Ou a assistência das irmãs às mulheres que
sofrem violência. Há países onde só os cristãos defendem as mulheres. Porém:
você já ouviu reivindicarem isso? É como se nem se dessem conta disso...
Francisco disse: "É preciso fazer mais".
Francisco se dá conta disso e
repetiu isso, do seu modo franco. Mas será muito difícil. E eu desconfio das
consultas femininas. Acho que elas devem entrar nas estruturas que já existem.
Você não cria muitas ilusões...
Eu não sei quanto os homens estão
dispostos a renunciar a uma fatia de poder. Poucos sentem o problema. Além
disso, muitos são idosos, passaram a vida vendo mulheres sendo servas. Por
isso, é fundamental que haja mulheres lecionando nos seminários: assim, os
futuros padres não as verão apenas lavando pratos ou meias. Terão uma ideia
diferente.
Fonte: Ihu
Nenhum comentário:
Postar um comentário