Não é suficiente um Deus com
dimensões femininas. Deus é Ele e Ela. Não é um Ele com traços femininos. Não
se trata de uma troca superficial na linguagem. Caso contrário, apenas
trocaríamos o “imperialismo”, mas o fundamental é que a partir do “dizer” Deus
como Ele e Ela, inicia um processo de salvaguardar os direitos de todos(as), no
respeito e no reconhecimento da dignidade que própria, inclusive para
(Re)pensar Deus.
O ser humano sempre se aventurou
a dizer uma palavra sobre Deus. Na busca por uma palavra adequada recorre a sua
linguagem humana, expressando seu anseio profundo com símbolos e imagens,
normalmente limitados e precários. É um “dizer” Deus que não está desconectado
da experiência cultural, pois ao emanar e transpassar o horizonte da cultura,
confere-lhe sentido e significado para a existência humana desde sua cultura.
Deus em si, apesar da linguagem
humana, permanece sendo o que é. Ela não afeta o Seu ser, mas expressa na
medida do possível “algo” que pode ser Deus. Deus é Mistério inesgotável e
maior que nossos conceitos. Existem pessoas que escolhem a alternativa do
silêncio, uma vez que nada podemos “dizer” sobre Ele, então é melhor calar-se.
Embora, o ser humano dê conta de
que nunca será capaz de “dizer” Deus na sua plenitude, é importante que o mesmo
busque sempre a melhor forma de dizê-lo. O ser humano precisa de sinais e de
lugares de experiências. Eles são enriquecidos através de uma aventura
pedagógica. Porque buscando a palavra adequada, o ser humano com sua cultura,
descobre-se nas veredas de Deus, deixando-se iluminar por elas.
No percurso, sempre é oportuno
(re)pensar aquilo que Dele se diz. Existe sempre o risco do excesso, cuja
condição “transparece” na idolatria. É um “dizer” Deus equivocadamente, que não
possibilita saudavelmente uma experiência da fé e da vida.
O exercício de (re)pensar Deus
não está imune à dor: “pensar doí” (Luiz Carlos Susin). Doí na exigência de
renúncia, de descontruir as imagens e os altares que foram construídas para os
falsos deuses serem adorados. Eles não são dignos de adoração humana.
Na cultura ocidental, existe um
esforço de (Re)pensar Deus, ou ainda, “dizer” Deus de uma forma mais
qualificada, possibilitando uma existência humana saudável na fé. É um esforço
enriquecido por diversas categorias e experiências complementares: mulheres,
pobres, índios, queer, religiões, etc. É “dizer” Deus desde os esmagados pela
cultura hegemônica. É ouvir Deus desde a voz dos diminuídos.
Elizabeth A. Johnson, no Cadernos
Teologia Pública, edição 34, partindo da construção cultural ocidental,
aprofunda a necessidade de (Re)pensar Deus com uma nova linguagem, ou ainda,
que possibilite um “dizer” Deus desde a vivência e experiência das Mulheres,
buscando exemplos concretos e implicações para Verdade de Deus. A ênfase na
linguagem masculina propiciou uma subcultura no descaso para com cada Mulher.
Existem diversos avanços na
consciência do direito das Mulheres e de seu protagonismo. Busca-se constante
romper com uma presença silenciada, para fazê-la potência. Quando olhamos para
as comunidades de fé, logo percebemos a presença fecunda das Mulheres, que
animam vigorosamente a experiência eclesial. A questão fundamental é que essa
presença não seja serviçal utilitarista, mas de fecunda parceria no serviço com
todos(as).
A ousadia de “dizer” Deus desde a
experiência das Mulheres permite recorrer às múltiplas leituras da Escritura,
mas, de modo especial, aquelas páginas do Evangelho que Jesus compara Deus com
aquele(a) que busca algo que perdeu. A narrativa completa-se com um pai e dois
filhos, ambos perdidos, um nos afazeres da casa do pai e o outro no seu anseio
de ser alguém.
Não obstante essa narrativa do
pai foi preponderante para “dizer” Deus, podemos analisar no conjunto das três
narrativas e perceber que em Jesus, apesar do desprezo das Mulheres no seu
tempo, o protagonismo das Mulheres encontra eloquência profética. O Deus
anunciado por Jesus é Pai-Mãe.
Não é suficiente um Deus com
dimensões femininas. Deus é Ele e Ela. Não é um Ele com traços femininos. Não
se trata de uma troca superficial na linguagem. Caso contrário, apenas
trocaríamos o “imperialismo”, mas o fundamental é que a partir do “dizer” Deus
como Ele e Ela, inicia um processo de salvaguardar os direitos de todos(as), no
respeito e no reconhecimento da dignidade que própria, inclusive para
(Re)pensar Deus.
“Dizer” Deus desde a experiência
das Mulheres é perceber que em Deus, existe um espaço que rompe lógicas de
dominações, tornando-se vida e fecundidade. Uma comunidade que entrega sua fé e
vida a um Deus Pai-Mãe, Ele-Ela, vive na abertura recíproca e circularidade de
dons, nutre relações de cuidado, ternura e resistências fecundas.
A linguagem é um espaço de
explicitação daquilo que e como radicalmente confiamos. Nela somos capazes de
“dizer” como compreendemos Deus e como estamos dispostos a viver Nele, com Ele
através Dele. Não é suficiente uma linguagem descartável, que a utilizamos
quando convém. Mas, uma linguagem inclusiva que articulada com uma prática,
torna-se potência suficiente para uma real transformação humana.
“conscientes do dano
causado pelo sexismo,
e atentas às nossas
próprias experiências
de sofrimento, poder
e ação,
as mulheres estão
embarcando
numa aventura
profunda, história e espiritual”.
Elizabeth Johnson
Oxalá essa linguagem inclusiva,
que promove relação-vida-habitus, expresse, um Deus que encontra no seu
conceito um espaço positivo para as Mulheres, exigindo abertura recíproca na
com-divisão de responsabilidades de construção de um mundo saudável para
todos(as).
Para acessar o texto: clique aqui.
Elizabeth A. Johnson, teóloga
norte-americana, professora na Fordham University e autora de vários livros -
Aquela que É: O Mistério de Deus no trabalho teológico feminino (Petrópolis:
Vozes, 1995), Nossa verdadeira irmã: teologia de Maria na comunhão dos santos (São
Paulo: Loyola, 2006), Questões para o Deus vivo: mapeando fronteiras no
discurso teológico (New York: Continnum, 2007).
Fonte: Ihu
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