E tudo começou com um presente de
um jornalista amigo de meu pai. Fui visitar Jáder de Oliveira, que vivia na Inglaterra,
mas estava em visita a BH. Conversa vai, conversa vem, entre um caso e outro,
ele fala sobre Paulinho Valentim. Comenta sobre o livro de Roberto Drummond,
Hilda Furacão. Comento que gostaria de fazer uma reportagem inusitada sobre o
casal. Ele pega uma mala e de lá tira um retrato. É o casal, quando vivia em
Buenos Aires e ele jogava no Boca Juniors. Isso foi em 2003.
Vasculho o passado e conto uma
história do amor de Paulinho e Hilda. O tempo passa. É véspera da Copa do Mundo
de 2014. Estou em Sete Lagoas, para cobrir o Uruguai, ali concentrado. Uma
noite, um telefonema. É um amigo de meu pai, Washington Melo, também
jornalista, que me pergunta se pode passar meu telefone a uma amiga, do Rio.
Explica que não é ela que quer falar comigo, mas uma amiga.
Sim, respondo. Na manhã seguinte,
o telefone toca. Do outro lado, uma mulher, Marisa Barcello. É capixaba e diz
que mora em Buenos Aires. Pergunta-me se fui eu mesmo que escrevi a matéria de
2003. Digo que sim e ela dispara: “Pois eu estou com a Hilda aqui, no asilo
onde trabalho, em Buenos Aires”.
Fico doido. Quero ir a Buenos
Aires, mas isso só seria possível depois da Copa. O Brasil perde para a
Alemanha, é goleado. A viagem é liberada. Vou no dia seguinte. Chego ao Hogar
de Ancianos Guillermo Rawson. Lá está Hilda, numa cadeira de rodas, assistindo
à TV. Sorri. Só tem um dente, na parte de cima da boca. Falo que sou de BH e
por alguns instantes ela se recorda da cidade. Começa a falar de seu amor,
Paulinho Valentim, da vida que levavam, de joias, que não tem mais. Que
descoberta!
O tempo passa. É dezembro de
2014. O telefone toca novamente. É Marisa, de novo. “A Hilda morreu. Será
enterrada amanhã, no Cemitério Municipal aqui de Buenos Aires.” É o fim da vida
carnal. No sepultamento, apenas ela, uma funcionária da embaixada brasileira e
um médico do asilo. Chego à conclusão: “Fui o último a falar com ela. A mulher
que se tornou um mito não existe mais. Sofria de Alzheimer. Mas tinha momentos
de lucidez. Contou parte de sua história, suas poucas lembranças. Acho que o
adeus foi quando o jornal noticiou a sua descoberta.”
Fonte: Estado de Minas
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