No domingo, um evento no Vaticano
viu uma discussão notavelmente aberta e franca entre mulheres sobe os limites
de sua participação nas estruturas da Igreja, naquilo que poderia ter sido o
primeiro de semelhantes confrontos públicos que jamais tenham tido lugar no
centro da hierarquia católica.
“Gostaria que as mulheres
pudessem ser vistas também como fortes, corajosas, inteligentes”, disse Ulla
Gudmundson, ex-embaixadora sueca junto à Santa Sé, durante a discussão.
“Gostaria também que os homens pudessem ser vistos como ternos, pacientes,
sensíveis”. Invertendo uma expressão frequentemente usada pelos bispos para
descrever as mulheres, Gudmundson continuou: “O Papa Francisco é um claro
exemplo de gênio feminil: paciente, terno, ele mostra misericórdia e amor”.
Expressando o seu desejo sobre
como gostaria que a Igreja tratasse as mulheres no futuro, outra participante
na discussão apresentou uma visão de uma Igreja católica em mais níveis, onde
homens e mulheres fossem tratados como iguais em todos os níveis. “Sonho com
uma Igreja na qual, independentemente do fato de ser homem ou mulher,
simplesmente como pessoa se responda à chamada de Deus”, disse Astrid Gajiwala,
uma bióloga indiana que trabalhou como consulente para a sua Conferência
episcopal.
“Sonho também com uma Igreja onde
homens e mulheres participassem com igualdade em todos os níveis de decisão, de
modo que sejam uns e outras a contribuir às políticas, às estruturas, ao
ensinamento e à prática da Igreja”, disse. “E ambos estariam empenhados no ministério”.
Gajiwala também expressou o desejo de uma linguagem inclusiva “nas nossas
traduções, nas nossas liturgias, nos nossos documentos”. Quando falo de
linguagem, eu também gostaria de ver uma Igreja aonde Deus fosse liberado de
construtos masculinos”, disse ela. “As mulheres fazem uma experiência de Deus
tão diversa e eu gostaria que houvesse um lugar para isto, para exprimir o
nosso modo de entender o mistério de Deus”.
Gudmundson e Gajiwala falaram, no
domingo, neste evento de título “Voices of faith” [Vozes de fé], que fora
organizado para permitir às mulheres compartilharem as suas histórias de fé a
partir do Vaticano na Jornada internacional da Mulher. Organizado pela fundação
benéfica Fidel Götz, com sede em Liechtenstein, o evento foi transmitido em
streaming em todo o mundo pela Casina Pio IV no Vaticano, uma construção
emblemática em mármore, sede da Pontifícia Academia das Ciências.
O debate foi uma parte do evento
que durou cinco horas e foi moderado por Deborah Rose-Milavec, que é a presidenta
do grupo de reforma Future Church, com sede nos USA. As outras mulheres que
intervieram no debate foram a teóloga britânico-zambiase Tina Beattie e uma
jornalista da secção alemã da Rádio Vaticana, Gudrun Sailer. A discussão, que
durou menos de uma hora, foi notável pela vastidão dos temas tratados pelas
mulheres e pela evidente franqueza com que elas enfrentaram argumentos que
normalmente são considerados fora dos limites nas discussões no Vaticano.
Por exemplo, enquanto o argumento
sobre a ordenação das mulheres foi discutido só marginalmente, todas as quatro
mulheres revelaram uma irritante falta de mulheres nos ministérios da Igreja e
em posições diretivas na hierarquia católica.
“Tem nos sido dito que a questão
da ordenação é excluída”, disse Beattie, a qual é teóloga da Universidade de
Roehampton em Londres. “Se nos pedem aceitar e respeitar isto, devemos, no
entanto ver que em toda outra situação particular haja uma plena e igual
participação de direção feminina na Igreja – que toda posição individual que
não requer a ordenação seja igualmente coberta por homens e mulheres”, disse
ela.
“O que sonho é uma Igreja que
proclame a plena igualdade e dignidade de homem e mulher enquanto feitos à
imagem de Deus, o que seria um absoluto sinal luminoso para todo o mundo”,
disse Beattie. Fazendo referência a uma situação pessoal, continuou: “As nossas
filhas nos encaram e nos pedem: ‘Mamãe, por que continuas a depender de uma
Igreja como esta, enquanto em qualquer outro lugar, exceto na Igreja, és
reconhecida e valorizada por aquilo que és?”.
“O sonho seria que aquela
dignidade e igualdade segundo a qual temos sido feitas à imagem de Deus fosse a
fisionomia que a Igreja apresenta ao mundo”, disse Beattie. “E esta deveria ser
uma fisionomia plenamente igual em qualquer aspecto da Igreja, para que seja
crível”. Gajiwala disse ter tido também experiências “maravilhosas” trabalhando
com bispos na Igreja indiana, particularmente no ajudar a estender a política
de gênero de 2010 em sua Conferência episcopal, mas também disse que a
experiência de serviço na Igreja é “acima de tudo contrastante”.
“Considero frustrante que as
mulheres sejam excluídas da assunção de decisões, porque todo tipo de governança
é ligado à ordenação”, disse. “A verdade é que tudo aquilo que podemos realizar
é fazer recomendações”, disse Gajwala que, além de trabalhar como consulente
para os seus bispos, também tem sido vice-presidente de seu conselho paroquial.
“Não temos direito de voto. Não nos é dada responsabilidade. Limitamo-nos a
recomendar coisas”.
Falando também do percurso
realizado pelas mulheres quando um marido escolhe torna-se diácono permanente
na Igreja, Gajiwala disse que, embora seja o marido, que a mulher faça junto
com ele toda a formação para o diaconato, “no final o marido é ordenado
diácono, mas a mulher não”.
Fonte: Ihu
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