sábado, 14 de março de 2015

Um evento no Vaticano enfrenta a igualdade, a inclusão e a ordenação das mulheres

No domingo, um evento no Vaticano viu uma discussão notavelmente aberta e franca entre mulheres sobe os limites de sua participação nas estruturas da Igreja, naquilo que poderia ter sido o primeiro de semelhantes confrontos públicos que jamais tenham tido lugar no centro da hierarquia católica.

 A reportagem é de Joshua J. Mc. Elwee, publicada pela National Catholic Reporter, 09-03-2015. A traduçao é de Benno Dischinger.

 Entre os temas discutidos pelas mulheres naquele evento, realizado para caracterizar o dia internacional da mulher esteve a necessidade que a Igreja realize aquilo que prega com respeito à plena igualdade entre homens e mulheres, que inclua as mulheres em qualquer nível de decisão, e que use uma linguagem inclusiva nas suas preces. As mulheres também expressaram um desejo em favor de um repensamento de fundo referente a como os prelados e os documentos eclesiásticos as descrevem, dizendo que frequentemente são catalogadas somente como o reflexo da metade sensível e terna da humanidade.

“Gostaria que as mulheres pudessem ser vistas também como fortes, corajosas, inteligentes”, disse Ulla Gudmundson, ex-embaixadora sueca junto à Santa Sé, durante a discussão. “Gostaria também que os homens pudessem ser vistos como ternos, pacientes, sensíveis”. Invertendo uma expressão frequentemente usada pelos bispos para descrever as mulheres, Gudmundson continuou: “O Papa Francisco é um claro exemplo de gênio feminil: paciente, terno, ele mostra misericórdia e amor”.

Expressando o seu desejo sobre como gostaria que a Igreja tratasse as mulheres no futuro, outra participante na discussão apresentou uma visão de uma Igreja católica em mais níveis, onde homens e mulheres fossem tratados como iguais em todos os níveis. “Sonho com uma Igreja na qual, independentemente do fato de ser homem ou mulher, simplesmente como pessoa se responda à chamada de Deus”, disse Astrid Gajiwala, uma bióloga indiana que trabalhou como consulente para a sua Conferência episcopal.

“Sonho também com uma Igreja onde homens e mulheres participassem com igualdade em todos os níveis de decisão, de modo que sejam uns e outras a contribuir às políticas, às estruturas, ao ensinamento e à prática da Igreja”, disse. “E ambos estariam empenhados no ministério”. Gajiwala também expressou o desejo de uma linguagem inclusiva “nas nossas traduções, nas nossas liturgias, nos nossos documentos”. Quando falo de linguagem, eu também gostaria de ver uma Igreja aonde Deus fosse liberado de construtos masculinos”, disse ela. “As mulheres fazem uma experiência de Deus tão diversa e eu gostaria que houvesse um lugar para isto, para exprimir o nosso modo de entender o mistério de Deus”.

Gudmundson e Gajiwala falaram, no domingo, neste evento de título “Voices of faith” [Vozes de fé], que fora organizado para permitir às mulheres compartilharem as suas histórias de fé a partir do Vaticano na Jornada internacional da Mulher. Organizado pela fundação benéfica Fidel Götz, com sede em Liechtenstein, o evento foi transmitido em streaming em todo o mundo pela Casina Pio IV no Vaticano, uma construção emblemática em mármore, sede da Pontifícia Academia das Ciências.

O debate foi uma parte do evento que durou cinco horas e foi moderado por Deborah Rose-Milavec, que é a presidenta do grupo de reforma Future Church, com sede nos USA. As outras mulheres que intervieram no debate foram a teóloga britânico-zambiase Tina Beattie e uma jornalista da secção alemã da Rádio Vaticana, Gudrun Sailer. A discussão, que durou menos de uma hora, foi notável pela vastidão dos temas tratados pelas mulheres e pela evidente franqueza com que elas enfrentaram argumentos que normalmente são considerados fora dos limites nas discussões no Vaticano.

Por exemplo, enquanto o argumento sobre a ordenação das mulheres foi discutido só marginalmente, todas as quatro mulheres revelaram uma irritante falta de mulheres nos ministérios da Igreja e em posições diretivas na hierarquia católica.

“Tem nos sido dito que a questão da ordenação é excluída”, disse Beattie, a qual é teóloga da Universidade de Roehampton em Londres. “Se nos pedem aceitar e respeitar isto, devemos, no entanto ver que em toda outra situação particular haja uma plena e igual participação de direção feminina na Igreja – que toda posição individual que não requer a ordenação seja igualmente coberta por homens e mulheres”, disse ela.

“O que sonho é uma Igreja que proclame a plena igualdade e dignidade de homem e mulher enquanto feitos à imagem de Deus, o que seria um absoluto sinal luminoso para todo o mundo”, disse Beattie. Fazendo referência a uma situação pessoal, continuou: “As nossas filhas nos encaram e nos pedem: ‘Mamãe, por que continuas a depender de uma Igreja como esta, enquanto em qualquer outro lugar, exceto na Igreja, és reconhecida e valorizada por aquilo que és?”.

“O sonho seria que aquela dignidade e igualdade segundo a qual temos sido feitas à imagem de Deus fosse a fisionomia que a Igreja apresenta ao mundo”, disse Beattie. “E esta deveria ser uma fisionomia plenamente igual em qualquer aspecto da Igreja, para que seja crível”. Gajiwala disse ter tido também experiências “maravilhosas” trabalhando com bispos na Igreja indiana, particularmente no ajudar a estender a política de gênero de 2010 em sua Conferência episcopal, mas também disse que a experiência de serviço na Igreja é “acima de tudo contrastante”.

“Considero frustrante que as mulheres sejam excluídas da assunção de decisões, porque todo tipo de governança é ligado à ordenação”, disse. “A verdade é que tudo aquilo que podemos realizar é fazer recomendações”, disse Gajwala que, além de trabalhar como consulente para os seus bispos, também tem sido vice-presidente de seu conselho paroquial. “Não temos direito de voto. Não nos é dada responsabilidade. Limitamo-nos a recomendar coisas”.

Falando também do percurso realizado pelas mulheres quando um marido escolhe torna-se diácono permanente na Igreja, Gajiwala disse que, embora seja o marido, que a mulher faça junto com ele toda a formação para o diaconato, “no final o marido é ordenado diácono, mas a mulher não”.

Fonte: Ihu

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