Durante o pronunciamento de Dilma Rousseff, em cadeia
nacional de rádio e TV, na noite deste domingo (8), um panelaço foi ouvido em
várias cidades brasileiras. Chamar de “vaca'' não é fazer uma análise da
honestidade e competência de alguém que ocupa um cargo público e sim uma forma
machista de depreciar uma mulher simplesmente por ser mulher. É meio ridículo
explicar a adultos que mulheres, em nenhuma hipótese, devem ser criticadas por
esse ponto de vista. Ou chamadas de “prostitutas'' como xingamento genérico a
qualquer comportamento em desacordo com o que se “espera'' de uma “mulher de
bem''. E que prostitutas continuem a serem reduzidas a xingamento e não
tratadas com o mesmo respeito despendido a qualquer outra trabalhadora.
Durante o pronunciamento de Dilma Rousseff, em cadeia
nacional de rádio e TV, na noite deste domingo (8), um panelaço foi ouvido em
várias cidades brasileiras. Em São Paulo, o barulho foi grande em bairros ricos
como Higienópolis, Jardins, Itaim Bibi, Perdizes, Vila Madalena, Morumbi. Por
outro lado, quase nada se ouviu em bairros mais pobres, como Capão Redondo,
Itaim Paulista, Cidade Tiradentes e Grajaú.
Particularmente, não gostei do pronunciamento. Achei que não
respondeu às principais indagações sobre a condução do governo. E não estou
falando apenas da parte do combate à corrupção, mas sim de questões de
manutenção de direitos trabalhistas e do desenvolvimento econômico.
E, particularmente, não tenho nada contra vaias (a menos que
sejam durante a execução de hinos nacionais de outros países em jogos de Copa
do Mundo – aquele episódio foi ridículo…). Também não tenho nada contra panelas
que estrilam (só espero que se forem de teflon, que tenham usado colher-de-pau,
porque risca).
Essas coisas fazem parte da democracia. E políticos, se
gostam de elogios, devem aprender a conviver com críticas.
Mas é preciso muita coragem para gritar a plenos pulmões que
alguém é “vaca'' da janela do apartamento, com todos os vizinhos e os
transeuntes na rua olhando.
Coragem ou a certeza de que nada vai acontecer. Porque
talvez a pessoa saiba que vivemos em uma sociedade misógina, que premia esse
tipo de comportamento. Uma sociedade que é incapaz de fazer críticas ou
demonstrar insatisfação e indignação sem apelar para questões de gênero.
Chamar de “vaca'' não é fazer uma análise da honestidade e
competência de alguém que ocupa um cargo público e sim uma forma machista de
depreciar uma mulher simplesmente por ser mulher. De colocá-la no seu “devido
lugar'', que é fora da política institucional.
E isso vale para qualquer mulher. De Luciana Genro à Roseana
Sarney, de Marina Silva à Kátia Abreu. Pois a origem da truculência masculina
percorre todo o espectro político. Da esquerda à direita.
O significado de “vaca'' que os ignóbeis usam não remete aos
simpáticos ruminantes. Se assim fosse, seria apenas especismo da minha parte
reclamar da comparação. Mas o termo, neste caso, quer rotular através de uma
crítica moral sobre um comportamento sexual atrelado a um gênero. Tanto que a
versão masculina (“touro'') não é depreciativo, pelo contrario.
É meio ridículo explicar a adultos que mulheres, em nenhuma
hipótese, devem ser criticadas por esse ponto de vista. Ou chamadas de
“prostitutas'' como xingamento genérico a qualquer comportamento em desacordo
com o que se “espera'' de uma “mulher de bem''. E que prostitutas continuem a
serem reduzidas a xingamento e não tratadas com o mesmo respeito despendido a
qualquer outra trabalhadora. E que alguém ainda tenha a cara-de-pau de usar a
expressão “mulher de bem''. E que eu esteja escrevendo um texto sobre isso a
esta hora, em um domingo à noite, quando poderia estar assistindo aos gols da
rodada.
Fico imaginando se alguns dos marmanjos e mesmo das mulheres
que gritaram “vaca'' da janela de casa, celebraram com suas mães, esposa e
amigas, algumas horas antes, o Dia Internacional das Mulheres, comemorado neste
8 de março.
A quantidade de mulheres na política, independentemente de
sua orientação ideológica, infelizmente é pequena. Mas elas também estão
sub-representadas como CEOs, executivas, gerentes, síndicas de condomínios.
Isso sem falar das chefias de redação. E o Judiciário ainda transpira machismo,
haja visto as interpretações distorcidas proferidas por arautos da
masculinidade de toga sobre a Lei Maria da Penha.
Como já contei aqui neste espaço, nas manifestações de junho
de 2013, abordei educadamente um rapaz que carregava um cartaz chamando Dilma
de “vaca”. Pedi desculpas pela intromissão, mas expliquei que o protesto dele
seria muito mais legítimo se ele usasse um termo para criticá-la que não fosse
tão machista. Poderia questionar a idoneidade, a moral, a competência, a
capacidade para o cargo e um sem número de coisas. Ele entendeu, ficou sem
graça e disse que tinha escolhido só porque rimava com o restante da ideia.
Contudo, um senhor mais velho que o acompanhava afirmou que
ela era mesmo uma “vaca”. Ele disse que sabia disso porque que era professor
universitário de história e havia estudado a vida de Dilma e podia atestar que
ela é uma “vaca” (WTF?). As novas gerações até tentam, mas o ranço de naftalina
insiste em manter os direitos como artigo de luxo.
É o que eu já disse aqui antes: todos nós, homens, de
esquerda, de direita, de centro, somos sim inimigos até que sejamos educados
para o contrário. E tendo em vista a formação que tivemos, é um longo caminho
até alcançarmos um mínimo de decência para com o sexo oposto. E não confundir o
justo protesto com o bizarro machismo.
Fonte: Blog de Sakamoto
Nenhum comentário:
Postar um comentário