Além da violência crescente e da
corrupção, o Brasil vive de algumas tragédias silenciosas. Uma delas está
relacionada diretamente com algo que deveria salvar vidas, a doação de órgãos.
Pela simples natureza de falta de controles, corrupção, sistema ineficaz, além
da natureza maldosa do ser humano, muitas famílias têm suas vidas destruídas
pela simples ganância do ser humano.
O Tráfico de Órgãos está
relacionado como o novo crime internacional do século XXI. O crime atinge
praticamente todos os países, mas alguns têm maiores incidências, por exemplo
China, Índia, Paquistão, Rússia e Brasil. Mas é óbvio que em todos os países o
crime acontece, mas em alguns, em função de “facilidades” políticas e de baixa
fiscalização e investigação, acontece com mais relevância.
No caso brasileiro, parece que o
olhar fechado das autoridades gera uma letargia no desenvolvimento de
investigações. Segundo a OMS, de todos os transplantes realizados no mundo, 5%
estão relacionados diretamente com o tráfico de órgãos.
O tema ainda parece um grande
mistério, tanto para autoridades, como também para a mídia internacional. Como
a busca do “Santo Graal”, o mundo parece não saber o que acontece. Mas pelos
diversos relatórios internacionais de organismos que investigam o crime, como
da própria Interpol, a estrutura por trás do tráfico de órgãos é extremamente
inteligente e organizado, como uma verdadeira máfia envolta em sigilo, e com
“peixes” muito grandes da política, da medicina e de outros grupos criminosos.
Em especial no caso da China, é evidente que políticos estejam envolvidos, pois
muitas das vítimas são condenados na justiça, e os condenados à morte, “são” literalmente,
“aproveitados” para alimentar este nefasto comércio.
Engraçado que em uma pesquisa
simples no site da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República
do Brasil, o tema “tráfico de órgãos” não aparece em nenhum tópico e pesquisa.
Por quê? Mesmo considerando que apareça o tema “tráfico de pessoas”, é de se
imaginar que o mesmo tráfico possa alimentar o tráfico de órgãos.
E para piorar o problema, muitas
autoridades, inclusive políticos, tratam o tema como uma grande “lenda urbana”,
mas a Secretaria Nacional de Justiça, publicou em 2013 um documento referente
ao tráfico de seres humanos (Cartilha Tráfico de Pessoas), e no documento
consta efetivamente os problemas de tráfico de órgãos e seus impactos no Brasil
e no mundo.
O Blog EXAME Brasil no Mundo
conversou com o brasileiro, residente em Londres, Paulo Pavesi que sofre na
“pele” a tragédia do crime de tráfico de órgãos. Seu filho, Paulo Veronesi
Pavesi, o Paulinho, na época com 10 anos, sofreu um acidente no playground do
prédio que morava. Depois de diversos exames, foi constatado morte encefálica,
e a família resolveu doar os órgãos. Mas o Paulo Pavesi desconfiou da conta
hospitalar e dos procedimentos realizados, e a partir daí começou, com faro
investigativo, uma das maiores batalhas de sua vida. O caso de Paulo Pavesi e
de seu filho Paulinho, é mais um entre muitos da tragédia silenciosa que
acontece diariamente no mundo e no Brasil. Os médicos envolvidos no caso de
Paulinho estão presos. Os mesmos foram condenados pela justiça, mas absolvidos
pelo Conselho Regional de Medicina de Minas Gerais, onde o caso ficou conhecido
como o caso de “Poços de Caldas”.
Paulo Pavesi escreveu o livro
“Tráfico de Órgãos no Brasil – O que a máfia não quer que você saiba”, e também
mantém o blog “Tráfico de Órgãos no Brasil” http://ppavesi.blogspot.com.br para
contar a história de Paulinho, e de todas as tragédias silenciosas que acontecem
sobre o tema, diferente do que as autoridades acham. Na verdade é uma tragédia
urbana, e não uma lenda urbana.
Hoje, Paulinho teria 24 anos.
Paulo Veronesi Pavesi - Paulinho
Brasil no Mundo: O tráfico
internacional de órgãos é uma realidade mais do que presente no Brasil. Por que o Brasil pouco fala sobre
isso?
Paulo Pavesi: A imprensa é
pressionada a não divulgar casos como o do meu filho, com o argumento de que
pode atrapalhar a doação de órgãos. No
entanto, as pessoas que pressionam a
imprensa hoje, são justamente as que estão envolvidas com o comércio ilegal de órgãos há décadas, e nunca
são investigadas.
Esta pressão foi confirmada durante a CPI do tráfico de órgãos em 2004,
por delegados de policia federal. Órgãos estão sendo removidos de pacientes em coma, para servir à hospitais
públicos. Existe todo um processo que
estou detalhando no meu segundo livro.
Brasil no Mundo: Você é uma
vítima direta do tráfico internacional de órgãos. Seu filho Paulinho, foi vítima desta atrocidade.
Conte-nos um pouco de sua história.
Paulo Pavesi: É muito difícil
para mim, como pai, resumir estes 13
anos. Até mesmo para escrever o livro foi difícil, pois tive que cortar
muitas coisas. Tudo o que apurei é importante. Mas o que posso dizer é que esbarrei em uma máfia que jamais imaginei
existir. Não conheço nada tão sofisticado como o funcionamento desta
organização. Tudo funciona perfeitamente como um relógio. Há muito dinheiro
envolvido.
Brasil no Mundo: De tempos em tempos vemos notícias sobre o tráfico de
órgãos no Brasil. Na sua visão, por quê a mídia não noticia de forma mais
contundente?
Paulo Pavesi: Quando é trafico
internacional, como o caso de Pernambuco, a imprensa fala amplamente. O que a
imprensa não fala é sobre o que esta acontecendo dentro do Brasil.
Para você ter uma idéia de como
eles estão infiltrados e estabelecidos, a justiça brasileira tem um programa
chamado “doar é legal”. Você entra em qualquer site da justiça, de qualquer
Estado, e vai encontrar um link para se tornar um doador de órgãos, emitindo
um certificado imediatamente. Nestes
sites, a justiça explica que o tráfico
de órgãos não existe, e que tudo não passa de lenda urbana.
Quando eu ainda morava em São
Paulo, as viaturas da polícia militar possuíam um adesivo no vidro traseiro
dizendo “doe órgãos”. Em redes sociais,
você pode informar ao mundo todo que você é
doador de órgãos. As universidades estão recebendo com freqüência,
médicos renomados que fazem palestras visando plantar a semente da doação nos
jovens. Quando alguém se diz contrário é agressivamente repreendido, chamado de
egoísta e ridicularizado. A doação deixou de ser uma ação de bondade, e está se
tornando uma obrigação. A mídia tem colaborado muito para isso. O outro
lado da história – a verdade sobre os
transplantes – está sendo censurada.
Brasil no Mundo: Como está sendo a sua luta contra o tráfico internacional de órgãos?
Paulo Pavesi: Trata-se de uma
batalha impossível. Você avança um passo
e eles te empurram outros três para trás. A luta não se limita a combater e
denunciar os médicos envolvidos. Você precisa combater diversas frentes, como
por exemplo o Ministério Público. Durante a CPI ficou evidente que TODOS os
casos levados ao Ministério Público, e
analisados pela comissão, foram arquivados sem nenhuma investigação ou
informação aos denunciados. Casos e mais casos comprovados de tráfico de
órgãos, simplesmente, são ignorados inexplicavelmente. A máfia foi descoberta
na década de 1980 em Taubaté, onde vários doadores tiveram os órgãos retirados quando ainda estavam vivos. O
processo de homicídio dos médicos de Taubaté levou 23 anos para ser julgado, e
quase foi arquivado antes disso. Em
2011, estes médicos foram condenados a 17 anos de prisão, saíram pela
porta da frente do fórum, continuam trabalhando normalmente e foram inocentados pelo conselho regional de
medicina. Estão aguardando o julgamento em segunda instância há três anos, e
não há prazo para serem julgados. Os médicos
envolvidos no caso de Poços de Caldas, já foram condenados duas vezes
por tráfico de órgãos, e da mesma forma
foram absolvidos pelo conselho regional de
medicina. Em ambos os casos, é possível identificar um mesmo núcleo que funciona em São Paulo. Não por coincidência,
nos últimos anos duas auditorias do TCU
(Tribunal de Contas da União) comprovaram que a fila de espera em São Paulo é
sujeita a fraudes. Outro fator que chama
a atenção, é que mesmo condenados, os médicos passam a ser protegidos por diversos setores da
sociedade, e ignoram as sentenças
judiciais, alegando inocência. No caso do meu filho, os médicos insistem
em dizer que tudo é uma grande mentira,
apesar das inúmeras provas existentes.
Brasil no Mundo: Quais os últimos resultados em relação ao caso do seu filho?
Paulo Pavesi: O processo tem duas
vertentes. Na primeira, quatro médicos respondem pelo artigo 121 do código
penal, homicídio doloso qualificado por motivo torpe. Este deve ir a júri
popular em breve, sem data marcada. Na segunda, três médicos responderam pela
retirada ilegal dos órgãos em paciente vivo que resultou em morte (homicídio
também), e estão condenados em primeira instância. Como estes mesmos médicos já
foram condenados em outro caso, tiveram
a prisão decretada e continuam presos até o momento.
Brasil no Mundo: Em um texto seu publicado no seu blog “A verdade. Nada
mais que a verdade”, você comenta sobre o modelo nazista. Você acredita que
esta filosofia ainda se instala no Brasil?
Paulo Pavesi: Nunca foi tão real.
Nos estamos vivendo um círculo vicioso e perigoso na saúde pública. Não temos
leitos de UTI suficientes para todos que
precisam. Brasileiros estão tendo de recorrer à defensoria publica para
conseguir uma vaga. Para que esta vaga apareça, não existe milagre. Alguém
precisa desocupar. Com a ordem judicial, sem perceber, a justiça está
condenando pacientes em coma à morte. Ao mesmo tempo, existe dezenas de casos
que estou acompanhando onde um leito de UTI é negado, a pessoa tem a morte
encefálica diagnosticada por não receber o tratamento adequado, e em seguida é
levada para a UTI para que os órgãos sejam mantidos para transplantes. Esta
matemática é bastante estranha. O mesmo
Estado que está dizendo que precisamos salvar vidas doando órgãos, está
negligenciando o atendimento de pacientes que poderiam ser salvos,
transformando-os em doadores. Uma solução de mau gosto. Em uma única ação eles
liberam leitos de UTI e obtêm órgãos para transplantes. Infelizmente, parece que o brasileiro não consegue entender esta
situação, e acredita que o que acontece nos hospitais “é assim mesmo”.
Brasil no Mundo: Considerando todo o seu esforço investigativo, como o Brasil é visto
no mundo em relação ao tema de tráfico
internacional de órgãos?
Paulo Pavesi: O Brasil é citado
em várias publicações internacionais como fonte fácil para obtenção de órgãos.
Há um hospital em São Paulo, em que você pode encontrar pessoas com problemas
renais, e com um certo poder econômico, vindas de países vizinhos como
Paraguai, Argentina, Peru e Colômbia, e
aguardando um órgão para transplante. O único lugar onde não se pode falar que
o Brasil tem tráfico de órgãos é dentro
do próprio Brasil. Cito um exemplo muito interessante. Há alguns anos, um filme
de ficção chamado “Turistas, Go home!” em que retratava o tráfico de órgãos no Brasil foi amplamente criticado, e
quase teve sua exibição suspensa pela Embratur. O Brasil vive de aparências. A
realidade é muito diferente.
Brasil no Mundo: Que orientações você daria para as famílias brasileiras?
Paulo Pavesi: Simples. Não doe
órgãos. É muito difícil dizer isso, e
quero lembrar que eu doei os órgãos espontaneamente, acreditando no sistema.
Mas diante do que está acontecendo, não podemos tomar uma decisão séria como
esta, sem segurança. Nem mesmo médicos confiam no sistema.
Quando foi implantada a lei de
doação presumida, apenas 2% dos médicos brasileiros colocaram a frase
“doador de órgãos e tecidos” em seus
documentos. Chegamos num ponto em que os
conselhos de medicina estão contrariando suas próprias regulamentações
para defender condenados por tráfico de
órgãos.
O presidente da Associação
Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO), é testemunha de defesa de vários
acusados. Aliás, um irmão do principal acusado no caso Paulinho já foi
presidente da ABTO. Enquanto o Brasil
não enfrentar este problema seriamente,
ser doador no Brasil é colocar a vida em risco. Protocolos criados pelo próprio
Conselho de Medicina estão sendo ignorados para produzir doadores, com o apoio
do próprio conselho.
Fonte: Exame
TRÁFICO DE ÓRGÃOS HUMANOS: UM
MERCADO NEGRO EM EXPANSÃO
Por: Luis Pellegrini
Quanto vale um homem? Ou melhor,
economicamente falando, quanto se pode ganhar vendendo um homem ou... pedaços
dele? Parece coisa de filósofo doido fazendo metáforas, mas trata-se da mais
concreta e objetiva realidade: basta ler o recente relatório da Organização
Mundial da Saúde para se dar conta de que o tráfico ilegal (e às vezes legal)
de órgãos humanas é, hoje, um business que caminha sobre rodas. Prepara-se para
sentir alguns arrepios ao ler as informações abaixo.
Mercado milionário
Segundo dados da OMS, a cada ano,
no mundo, são executados cerca de 22 mil transplantes de fígado, 66 mil
transplantes de rim e 6 mil transplantes de coração. Cerca de 5% dos órgãos
utilizados nessas intervenções provêm do mercado negro, com um volume de
negócios estimado entre 600 milhões e 1,2 bilhão de dólares.
O aspecto mais dramático é que,
segundo a Global Finance Integrity, uma ONG especializada no rastreamento de
fluxos financeiros ilegais, os números desse macabro comércio encontram-se em
constante aumento.
Quem paga a conta são os cidadãos
mais pobres do mundo, aqueles que, por um punhado de dólares, estão dispostos a
ceder um rim, um pedaço do fígado, um pedaço do intestino, uma córnea. Todos
esses são órgãos, ou partes de órgão, de que podemos dispor sem morrer. Mas as
consequências dessas mutilações podem ser graves e muitas vezes dramáticas.
Supermercado do rim
Como salienta Sean Fitzpatrick –
diretor de relações externas do Banco de Órgãos de New England (EUA) – numa
entrevista concedida à revista Popular Science, a retirada de partes do fígado
ou do intestino requer intervenções muito complexas que dificilmente podem ser
efetuadas em clínicas improvisadas do Terceiro Mundo. A maior parte dos órgãos
vendidos espontaneamente por doadores no mercado negro é constituída de rins: A
extração e implantação desse órgão não exige operações particularmente
complexas e não necessita de equipamentos sofisticados nem de competência de
altíssimo nível.
Fonte: Brasil247
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