Em vídeo, padre diz que "o
agressor só se torna agressor porque a vítima o autoriza"
Um vídeo antigo de um sermão
proferido pelo padre Fábio de Melo viralizou neste domingo e acabou deixando o popular
pároco numa saia justa. “As mulheres que são agredidas fisicamente pelos seus
maridos, no dia em que ela recebe a primeira agressão, ela é que vai determinar
para ele se ele vai ter o direito de agredi-la a vida inteira ou não",
afirmava o padre durante a homilia de uma missa realizada anos atrás, e
completava: “O agressor só se torna agressor porque a vítima o autoriza.”
Mas,
no Brasil de hoje, em que a primavera feminina fez as mulheres se tornarem mais
vigilantes com o que se fala publicamente sobre violência contra elas, o sermão
do padre, que tem milhões de seguidores nas redes, pegou muito mal e o pároco
foi alvo de críticas ácidas de internautas. O ruído virtual acabou levando o
padre a se desculpar em sua conta do Twitter, curiosamente, por palavras ditas
no passado.
O episódio revela como alguns
valores começam a mudar no Brasil e de que forma a pressão feminina por mais
respeito é capaz de incendiar discussões. Fábio de Melo, na verdade, falava em
seu sermão sobre amor próprio. Partia da premissa de que a falta dessa virtude
leva homens e mulheres a permitirem-se viver situações nas quais são
desvalorizados, principalmente nas relações afetivas. O que não é uma ideia
ruim. Quando o vídeo foi publicado no Youtube, há dois anos (Fábio de Melo
afirma que o vídeo é de 2006), o discurso, hoje repudiado, parecia inofensivo e
passou despercebido.
Mas agora o momento é outro. Ao
menos desde o ano passado, diferentes gerações de mulheres estão indo às ruas e
às redes sociais denunciar abusos e pedir mais respeito. Campanhas como
#MeuPrimeiroAssédio e #MeuAmigoSecreto trouxeram à tona milhares de depoimentos de abusos contra meninas e
mulheres. As agressões - não somente as físicas - enfim, viraram pauta e a
sensibilidade ao tema só fez crescer na sociedade.
E essa nova ordem das discussões
permeou as críticas sofridas pelo padre. “E hoje aprendemos com o padre Fábio
de Melo que a culpa da vítima mulher é dela, sim, por ‘não se dar o respeito”,
publicou no Twitter a usuária dessa rede social @ivonepita. “Padre Fábio de
Melo, me devolve as risadas que eu dei com seus tweets”, disse @badwolfs.
Muitos de seus fiéis seguidores
se disseram desapontados. E não são poucos. Fábio de Melo é seguido por mais de
dois milhões de pessoas no Twitter. Tem mais de seis milhões de curtidas em sua
página no Facebook. Muitos dos vídeos que publica no Snapchat são hilários: ele
não trata, usualmente, de religião. Comenta o Oscar, fala exaustivamente sobre
a exaustão da própria rotina e já entrevistou, mais de uma vez, o Pequeno
Príncipe, que ele mesmo interpretou, revezando com a interpretação do
entrevistador. Difícil não rir.
@pefabiodemelo @thiago_p mas enfim, tu mudou de opinião ou continua tendo este mesmo pensamento?
Sim, @holldrigo ,continuo acreditando que o silêncio da vítima contribui com a manutenção da violência.
Até este domingo, o padre mineiro, conhecido por sua
hiperatividade em redes sociais e por fazer piadas sobre si mesmo, não era
apenas um padre nas redes sociais, mas também um personagem agregador de
milhões de fãs.
Mas nesta segunda-feira pela manhã, ao invés de piadas, usou
a rede social para se desculpar. "Quem me acompanha sabe. Sempre fui
ferrenho defensor da denúncia. Sim, continuo acreditando que o silêncio
fortalece o agressor", respondeu a um seguidor. "O vídeo creio ser de
2006. Na época eu falava das mulheres que não denunciam os agressores. Eu
motivava a denúncia", escreveu para outro. E por fim, pediu desculpas:
"Peço perdão. Eu nunca pretendi dizer que a vítima é culpada. Apenas
salientei que a não denúncia reforça o agressor".
O Brasil é o quinto país do mundo onde mais se matam
mulheres, de acordo com o Mapa da Violência 2015 – Homicídios de Mulheres no
Brasil. São quase cinco mortes para cada 100.000 mulheres. Nos 10 primeiros
meses do ano passado, registramos uma denúncia de violência contra a mulher a
cada sete minutos, segundo a Secretaria de Política para Mulheres da
Presidência da República.
Fonte: El Pais
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