As mulheres negras* não estão nas telas de cinema, nem atrás
das câmeras. Pesquisa da Universidade Estadual do Rio de Janeiro (Uerj) mostra
que pretas e pardas não figuraram nos filmes nacionais de maior bilheteria.
Apesar de ser a maior parte da população feminina do país (51,7%), as negras
apareceram em menos de dois a cada 10 longas metragens entre os anos de 2002 e
2012.
Além disso, atrizes pretas e pardas representaram apenas 4,4% do elenco
principal de filmes nacionais. Nesse período, nenhum dos mais de 218 filmes
nacionais de maior bilheteria teve uma mulher negra na direção ou como
roteirista.
Coordenada pelo Instituto de Estudos Sociais e Políticos
(Iesp) da Uerj, um dos mais renomados centros de estudos de ciência política na
América Latina, a pesquisa "A Cara do Cinema Nacional” sugere que as
produções para as telonas não refletem a realidade do país, uma vez que 53% dos
brasileiros se autodeclaram pretos ou pardos, segundo o Instituto Brasileiro de
Geografia e Estatística (IBGE). O prejuízo, na avaliação das autoras do estudo,
é a influência de determinados valores sobre a audiência.
"Pelos dados, a população brasileira é diversa, mas
essa diversidade não se transpõe para ambientes de poder e com maior
visibilidade”, disse uma das autoras, a mestranda Marcia Rangel Candido. Ela
acrescenta que, além da "total exclusão” nos cargos técnicos, a
representação no elenco está limitada a estereótipos associadas à pobreza e à
criminalidade. "As mulheres brancas exercem vários tipo de emprego, são de
várias classes sociais, a diversidade é maior”, destaca.
A doutoranda Verônica Toste, coautora da pesquisa, diz que a
baixa representatividade de mulheres em postos mais altos do cinema – elas
ocupam 14% dos cargos de direção e 26% dos postos de roteiristas entre os
filmes mais vistos -, além da invisibilidade das negras no elenco, são
distorções da sociedade. "A ausência de mulheres, principalmente as
negras, nesses papéis gera baixa representação e reproduz uma visão irreal do
Brasil.” De acordo com a pesquisa, nenhuma das diretoras ou das roteiristas entre
os filmes pesquisados era negra.
Para chegar ao perfil racial, a pesquisa comparou imagens de
939 atores, 412 roteiristas e 226 diretores de filmes, excluindo documentários
e filmes infantis. "Usamos um modelo de identificação em que o pesquisador
é que define o grupo racial ao qual pertence o sujeito”, esclareceu Marcia. Na
classificação, para a comparação, foi utilizada uma escala de fotos de oito
indivíduos, do mais branco para o mais preto, estabelecida em trabalhos
científicos anteriores.
A lista dos filmes mais vistos no período é da Agência
Nacional do Cinema (Ancine), organização que, na avaliação do premiado cineasta
negro Joel Zito Araújo, deveria ter um papel ativo na promoção da diversidade
no audiovisual. Ao avaliar a pesquisa do Iesp, ele disse que a agência precisa
atuar. "Somente quem governa, que tem poder de criar políticas públicas, é
que pode criar paradigmas para a nação e resolver essa profunda distorção”,
disse.
Apesar de ter a função de fomentar e regular o setor,
procurada, a Ancine informou que "não opina sobre conteúdo dos filmes,
elenco ou qualquer coisa do tipo”.
* Convencionou-se chamar negros a soma dos grupos
populacionais preto e pardo, seguindo classificação do Instituto Brasileiro de
Geografia Estatística (IBGE).
Fonte: Agência Brasil
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