A organização não governamental (ONG) Anistia Internacional
lançou esta semana campanha para denunciar estupro e extorsão de profissionais
do sexo em Niterói, no Rio de Janeiro.
As violações foram cometidas durante
despejo considerado ilegal, de prostitutas, pela Polícia Civil, no Edifício
Nossa Senhora da Conceição. No dia 23 de maio, cerca de 300 mulheres foram
obrigadas a deixar o prédio, em meio a uma operação de combate à exploração
sexual que tinha 176 mandados de busca e apreensão. Um mês depois, por
denunciar publicamente agressões sofridas no dia do despejo, uma das
prostitutas foi sequestrada, ferida e ameaçada. Ela vive escondida.
Ao lançar a campanha, a organização cobra uma investigação
independente sobre as denúncias de violência policial, extorsão, detenção
arbitrária e despejo ilegal contra as profissionais que moravam e recebiam os
clientes no edifício. Segundo relato das vítimas, a Polícia Civil também
plantou evidências para incriminar e deter as profissionais sem mandados,
afirma a anistia. A ONG cobra ainda proteção urgente à Isabel *, a prostituta
que denunciou o ocorrido. No dia 21 de junho ela foi sequestrada, obrigada a
entrar em um carro onde foi ferida nos braços com uma lâmina de barbear e ouviu
ameças de morte contra si e o filho pequeno. Segundo a anistia, os algozes
queriam que Isabel parasse de dar declarações públicas e à imprensa.
“Não dá para esperar. Já ouve uma série de atos de violência
no despejo: agressões sexuais, violência física, roubo de dinheiro, de móveis
(da casa das prostitutas)”, exemplificou o assessor de Direitos Humanos da
organização, Maurício Santoro. Ele revelou ainda que no despejo, mulheres foram
forçadas a fazer sexo oral nos policiais, prática classificada entre as novas
formas de estupro e obrigadas a ficar “amontoadas” em um ônibus para serem
levadas à delegacia. “Ou seja, não é só uma ação ilegal de despejo, há uma
questão de poder sobre essas mulheres”, completou. Santoro esclarece que, mesmo
sem regulamentação, a prostituição não é crime no país.
Apesar das denúncias,
que motivaram protestos das prostitutas e de organizações da sociedade civil no
fim do mês de maio e início de junho, a Secretaria de Estado de Segurança e a
Corregedoria de Polícia Civil informaram que não receberam nenhum registro das
violações. No entanto, a Secretaria de Política para as Mulheres (SPM), que
acompanha o caso, informou que encaminhou ofícios pedindo abertura das
investigações. O Ministério Público Estadual do Rio de Janeiro (MP-RJ), que poderia determinar investigação
da conduta policial também foi acionado pela SPM, mas não respondeu à Agência
Brasil.
A Defensoria Pública do Rio de Janeiro, que acompanha as
prostitutas, tenta reverter a decisão de lacrar quatro dos 11 andares do
Edifício Nossa Senhora. “Se é por defeito estrutural tem que interditar os 11
andares”, disse a Coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher Vítima de
Violência, Clara Prazeres, em relação à justificativa da polícia para esvaziar
apenas os quatro andares onde as profissionais moravam. “E mais, quando a
Defesa Civil interdita um imóvel, as pessoas não são retiradas com força
policial, não é assim”, criticou. Segundo a Secretaria de Segurança, somente
quem estava com a documentação do imóvel no dia pode ficar.
Para a Anistia Internacional, a situação é grave porque
envolve mulheres pobres, em situação de fragilidade e estigmatização por terem
perdido suas economias, móveis e estarem sendo compelidas a trabalhar em locais
“menos seguros”. “Elas têm muito medo”, acrescentou a defensora pública Clara
Prazeres, que solicitou a inclusão de Isabel em Programa de Proteção a Vítimas
e Testemunhas Ameaçadas. A Secretaria de
Direitos Humanos da Presidência da República não confirmou a adesão.
* Nome fictício adotado pela Anistia Internacional para
proteger a vítima.
Fonte: Agência Brasil
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