sexta-feira, 17 de junho de 2016

Lógica antiquada sobre homem é justificativa para cultura do estupro




“Há mulheres ‘estupráveis’ e não ‘estupráveis’. Depende do comprimento da saia.” Este pensamento cruel nem sempre é dito em voz alta, mas a falta de esclarecimento ainda faz com que muita gente siga sustentando tal argumentação em rodas de amigos e parentes. Identificou-se? Pois saiba que é este um dos pontos da cultura do estupro.


O termo, que ganhou as redes sociais após uma adolescente de 16 anos ter sido violentada por um grupo de homens no Rio de Janeiro (RJ), é um conjunto de conceitos que normaliza o abuso e é o responsável por ideias como a de que uma mulher que opta por uma minissaia está mais vulnerável a uma violência sexual ou está, até mesmo, “pedindo” para que seja assediada.

Em 2014, a internet ferveu com fotos de mulheres com cartazes com a frase “Não Mereço Ser Estuprada” após o Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada) divulgar um levantamento no qual 26% dos brasileiros concordam inteira ou parcialmente com a frase “Mulheres que usam roupas que mostram o corpo merecem ser atacadas”. Na mesma pesquisa, 30% dos entrevistados concordam com a ideia de que “se as mulheres soubessem se comportar, haveria menos estupros”.

Por sua vez, o levantamento “Violência contra a mulher no ambiente universitário”, feito em 2015 pelo Instituto Avon com o Data Popular, mostrou que 27% dos 1.823 universitários entrevistados não consideram violência abusar de uma garota se ela estiver alcoolizada.

“Isso vem da concepção machista da sociedade de que a mulher existe como um objeto”, diz a representante no Brasil da ONU Mulheres, Nadine Gasman, ao UOL. “Uma mulher deveria poder sair nua na rua sem ser tocada, xingada ou estuprada.”.

De acordo com a diretora de conteúdo do Instituto Patricia Galvão, Marisa Sanematsu, uma lógica antiquada de que o homem “não consegue se controlar” é usada para justificar este tipo de pensamento. “É uma noção que diz que os homens são animais com apetite sexual exacerbado e, por isso, a mulher tem que saber se portar e se vestir de maneiras que não estimulem o homem”, fala Sanematsu.

Segundo Marisa, o estuprador é condenado pela maior parte da sociedade quando ele ataca uma pessoa que “sabe se portar”. O mesmo não acontece quando a vítima não atende aos padrões ditos de uma mulher “recatada”, como é o caso da menina de 16 anos, que convivia com pessoas ligadas ao tráfico de drogas. “As pessoas acham que eles [os estupradores] agiram naturalmente. É uma barbárie. É a mesma coisa do que dizer que pessoas que usam roupas azuis devem ser espancadas”, completa Gasman.

O figurino, o comportamento ou o local em que uma pessoa está não interfere nos riscos de ela sofrer abuso, já que o criminoso pode ser um familiar, amigo ou colega de trabalho. “É mais uma questão de relações desiguais e desequilibradas de poder entre os gêneros”, esclarece a Nadine Gasman. “Delegado nenhum deve perguntar como uma vítima de violência sexual estava vestida porque não há justificativa para isso.”


Fonte: (Natália Eiras)  Agência Patrícia Galvão

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