Companhia constante de políticos
entre terças e quintas-feiras (a tradicional semana parlamentar em Brasília), a
loura de 36 anos, estilo mignon e cabelos longos contabiliza entre os seus
clientes um placar unanimamente favorável ao impeachment da presidente Dilma
Rousseff.
"Tenho quatro deputados da
atual legislatura entre os meus clientes, de diferentes partidos. Minha bancada
é poderosa", gaba-se a garota de programa, que oscila temporadas como
acompanhante fixa de homens ricos e poderosos na Capital da República.
"Todos votaram a favor do
impeachment", conta ela, que foi surpreendida, assim como governo, pela
mudança de posição de última hora de um deles.
O resultado caseiro reflete a
votação (367 sim e 167 não) do domingo (17), no plenário da Câmara dos
Deputados, e está registrado em mensagens de WhatsApp.
A reportagem é de Eliane
Trindade, publicada por Folha de S. Paulo, 21-04-2016.
Sob condição de sigilo, a
acompanhante de luxo abre o aplicativo do celular e passa a exibir orgulhosa as
inúmeras mensagens trocadas com um parlamentar do PMDB, dois do PP e um quarto
do PR, durante a votação do impeachment e também no dia seguinte.
O conteúdo da intensa comunicação
arquivada em seu iPhone 6, protegido por uma capinha dourada, demonstra a
intimidade cultivada ao longo dos últimos quatro anos.
De um parlamentar do Rio de
Janeiro, a loura recebeu um link no qual o nobre deputado aparece dedicando o
voto pelo "sim" ao impeachment à família e fazendo uma ode à cidade
onde tem sua base eleitoral. "Parabéns, vi você agora", digitou ela
em resposta. "Os bons vão permanecer."
O texto enviado no início da
noite de domingo, no calor da votação, foi enfeitado com uma sequência de
emojis, entre eles oito aplausos.
O deputado retribuiu dois minutos
depois com a imagem de um coração solitário, encerrando temporariamente a
comunicação.
Os dois se conheceram em uma
festa de aniversário de um outro parlamentar, na qual ela era uma das 20
mulheres convidadas para entreter dez deputados amigos do dono da festa.
"Era tudo muito cafona e caro", recorda-se.
No reagabofe em 2014, ela se perfilou
em um "corredor polonês" de meninas. Foi uma das escolhidas pelo
líder de uma bancada, com quem dividiu uma suíte no hotel cinco estrelas, cuja
ala presidencial foi alugada para a festança.
"Ninguém fala em dinheiro
nessas horas, mas os presentes e a grana vêm naturalmente depois, ao virar a
eleita de um cara desses", diz.
Ela não esconde a inveja de um
amiga que ganhou um par de sandálias Christian Louboutin logo depois do
primeiro encontro.
A brasiliense entrou no círculo
íntimo do poder graças às conexões de uma conhecida cafetina. Procurada pela
Folha, a "promoter" desligou o celular ao saber do teor da
reportagem.
Rescaldo
Um dia depois da votação do
impeachment, o WhatsApp da loura continua bombando com o rescaldo da votação.
Na segunda-feira, um parlamentar
de São Paulo, o mais conhecido da lista de clientes declarados dela –ou de
amigos íntimos como prefere defini-los– envia o link do YouTube que imortalizou
seu voto "por amor ao Brasil e à filha".
O deputado do PP está exultante com
a repercussão do seu "sim" entre o público que assistia à sessão em
um telão na avenida Paulista, em São Paulo.
A acompanhante de luxo
brasiliense só não foi brindada com uma justificativa de voto do seu amigo
parlamentar que era tido como fiel ao governo até o último momento.
"Fiquei chocada quando soube que ele mudou o voto. É o único da minha
turma que é citado na Lava Jato."
Ela encerra o papo mostrando uma
mensagem enviada também por um dos nobres deputados de "sua bancada".
O parlamentar entra no clima de chacota que tomou as redes sociais, diante da
enxurrada de dedicatórias às mulheres durante a votação histórica.
O meme ironizando o discurso
moralista e hipócrita de suas excelências, listando o placar de esposas
lisonjeadas (120), amantes zangadas (200), filhos falando "ai que
mico" (300).
Love Boat
Com a presença rara em Brasília
de mulheres e filhos no fim de semana para acompanhar a sessão histórica, o
circuito de festas privativas promovidas por parlamentares ficou, digamos, mais
familiar.
No fim de semana de impeachment,
nada das tradicionais baladas regadas a mulheres bonitas e muita bebida, que
são definidas como "plataformas de relações públicas e de exercício de
poder" por um lobista das antigas acostumado a frequentá-las.
São opções de lazer para
políticos, empresários e a fauna que gira em torno do poder em Brasília.
Na atual legislatura, as festas
mais famosas acontecem em um barco de um senador goiano, apelidado de
"love boat". O senador também costuma emprestar o "barco do
amor", que conta com uma única e luxuosa suíte, para amigos.
Outro cenário de noitadas é a
casa de um senador mineiro no Lago Sul, que tem uma boate com um sugestivo
palco de "pole dance". Periguetes com crachá do Congresso Nacional e
outras que cobram por hora costumam disputar os convites para as baladas.
Capital Sexy
Em outro circuito, Karina Sales,
uma loura de 25 anos, 1m65 e 53 kg, conforme anúncio do site de acompanhantes
Capital Sexy, diz que o impeachment foi frustrante em termos de movimento no já
pouco aquecido mercado de sexo brasiliense.
"Por conta da política, o
povo sumiu. Tá todo mundo preso nas sessões no Congresso. Esse impeachment é
muito brochante", diz.
Ela é pessimista com os rumos do
país e do próprio negócio, em tempos de crise política e econômica. "Gata,
desce Dilma, sobe Temer, não vai mudar nada."
Karina cobra R$ 500 por programa,
aceita todos os cartões de crédito e relata cenas de pechincha generalizada em
tempos de Lava Jato: "Não interessa se é senador, deputado ou político
menor, como prefeitos e vereadores que vêm atrás dos grandes, todos choram
miséria na hora de fechar programa."
O mercado não está bom nem para
peixe famoso. "Uma estrela pornô da produtora Brasileirinhas veio para
Brasília para a temporada do impeachment e foi embora dois dias antes da
votação", relata Artur Henrique, dono do site Capital Sexy, que promove os
anúncios das acompanhantes de luxo. "O dinheiro sumiu", resume ele.
Já o garoto de programa Franco,
do site Bofes.com, diz que não tem do que reclamar de Brasília. "Pra mim,
crise não existe", garante ele, nascido em Fortaleza.
Como discrição é a alma do
negócio, Franco não entrega a clientela VIP, disposta a pagar R$ 400 por um
programa. "Se atendo político ou famoso, eu nem sei. Não tenho televisão
em casa, só vejo Netflix."
No fim de semana da votação do
impeachment, o fã de "House of Cards" diz ter sido sondado para uma
"suruba" no Lago Sul. "Mas o cliente acabou não contratando
ninguém. Acontece muito."
Segundo ele, o que tem bombado
mesmo é a sauna de um dos hotéis mais tradicionais da Capital, ponto de
encontro gay. "Os caras cobram muito barato, R$ 50. Ganham por
quilometragem e na pegação fazem dez programas numa tarde", explica
Franco.
Ele não se animou a tomar partido
e se juntar à multidão dividida pelo "muro da vergonha" para
acompanhar a votação neste domingo, 17. "Tendo ou não impeachment, nada
muda. A máquina toda é corrompida."
Sua colega Karina também optou
por outro programa para o domingão decisivo para o governo Dilma Rousseff.
"Preferi bronzear meu corpitcho."
Com o bronzeado sempre em dia, a
loura do WhatsApp passou o fim de semana da votação do impeachment fora de
Brasília. Afinal, "era o dia da patroa ser homenageada".
Fonte: Ihu
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