A fuga das mulheres é o fantasma
que ameaça o catolicismo. As jovens parecem estar cada vez menos dispostas, ao
contrário do que ainda acontecia com as gerações anteriores, a se envolver em
uma organização tão profundamente impregnada de machismo como a Igreja
Católica.
A opinião é do sociólogo italiano
Marco Marzano, professor da Universidade de Bérgamo, em artigo publicado no
jornal Il Manifesto, 05-05-2015. A tradução é de Moisés Sbardelotto. Eis o texto.
Como sempre tem acontecido nesses
anos, na quarta-feira passada, o papa pronunciou um belo discurso. O pontífice
disse que as mulheres deveriam ser retribuídas, pelo seu trabalho, assim como
os homens, que a emancipação feminina não é um mal e que ela não deve ser
relacionada com o fato de que os jovens casais atrasam cada vez mais a idade do
casamento e da reprodução. Muito bem dito. Estamos completamente de acordo com
ele, como acontece muitas vezes quando ele aborda questões sociais.
No entanto, também somos
obrigados a lembrar que o papa não representa apenas uma autoridade moral, à
qual compete proferir discursos edificantes ou indicar metas morais e objetivos
políticos a serem alcançados. O pontífice também é um homem de governo, o chefe
de uma imensa organização mundial, à qual aderem, por várias razões, mais de um
bilhão de homens e de mulheres.
Estas últimas experimentam,
dentro da Igreja, uma condição de perene subordinação, uma exclusão estrutural
de todos os lugares de destino e de comando, em todos os níveis. São o
proletariado eclesial, a classe operária da Igreja, indispensáveis para fazer
funcionar toda a complexa máquina católica, mas, invariavelmente, confinadas a
papéis executivos e acessórios.
De fato, são as mulheres, em
grande maioria, que ocupam os bancos das Igrejas e ouvem os sermões dos
sacerdotes, que ajudam, muitas vezes de forma totalmente gratuita, os padres a
gerir as Igrejas e as casas paroquiais, a mantê-las limpas e arrumadas. Sempre,
em uma enorme proporção, são as mulheres que animam as organizações de
voluntariado católicas, que transmitem a fé aos jovens, nas aulas de catequese
ou entre as paredes domésticas, que trabalham duro e com empenho, sempre em
posições subordinadas, entenda-se, nos escritórios diocesanos ou na Cúria
romana.
São ainda as mulheres que estão
ao lado dos sacerdotes como companheiras clandestinas, que os ajudam a suportar
cotidianamente a fadiga da vida eclesial, que oferecem conselhos e sugestões
para a ação pastoral.
Em suma, são as mulheres – provavelmente,
sempre o foram – que formam a espinha dorsal do povo de Deus, que trabalham,
com empenho e entusiasmo, na vinha do Senhor. Sem elas, a Igreja não tem
sentido, perderia a sua gente, desapareceria do mundo. E de nada serviriam nem
mesmo milhares de novas vocações clericais, nem mesmo a fabricação de tantos
padres novinhos em folha, ou, no máximo, importados de países em
desenvolvimento. Sem as mulheres, o catolicismo se extingue.
E é justamente a fuga das
mulheres o fantasma que ameaça o catolicismo, ao menos nas nossas latitudes. As
jovens italianas, dizem-nos as melhores pesquisas sociais e confirma o
conhecimento empírico da vida eclesial, parecem estar cada vez menos dispostas,
ao contrário do que ainda acontecia com as gerações anteriores, a se envolver
em uma organização tão profundamente impregnada de machismo como a Igreja
Católica.
Muitas jovens não entendem por
que não podem desfrutar, também dentro da Igreja, das mesmas oportunidades que
desfrutam no mundo exterior, por que não podem aspirar aos papéis de primeiro
plano ocupados pelos seus pares homens. E também as suas mães, especialmente se
divorciadas e em segunda união, começam a pensar assim. As
"quarentonas" também se puseram em fuga da Igreja, como diz o título
de um livro de sucesso.
Em relação a isso, o papado de
Francisco foi, até agora, uma grande decepção. Aos muitos discursos, às mil
proclamações, à multidão de anúncios, nunca se seguiu nada de concreto: não só
não se materializou a esperança de uma reabertura do tema do sacerdócio
feminino ou, ao menos, a possibilidade de ver designada a primeira mulher
cardeal, mas não foi nem mesmo confiado a nenhuma mulher um dicastério
vaticano, uma posição de responsabilidade qualquer e de primeiro plano.
Enquanto a Igreja anglicana proclamava
a primeira mulher bispo, a católica enchia as salas do Sínodo sobre a família
de homens idosos, reservando às pouquíssimas mulheres não mais do que algum
gesto de cena, alguma partezinha muito miserável na comédia. Não é o que
merecem as mulheres do nosso tempo.
Se a Igreja não souber
compreender isso, acabará por se sufocar, matando o futuro que essa metade do
mundo, felizmente, traz consigo.
Fonte: Ihu
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