Medicada. Mayara mostra exames e conta que, apesar de não
ter sequelas visíveis, terá que tomar anticoagulante pelo resto da vida
Elas acordaram em Unidades de
Tratamento Intensivo (UTI) sem saber o que tinha acontecido, muitas tiveram
danos irreversíveis à saúde e agora tudo o que mais querem é alertar outras
mulheres para que elas não engrossem as estatísticas das vítimas de pílulas
anticoncepcionais.
Os médicos ponderam que os casos são raros, mas, para que
eles não passem desapercebidos, a página no Facebook Vítimas de
Anticoncepcionais Unidas a Favor da Vida reúne depoimentos de mulheres que
sofreram danos em consequência do uso da pílula.
A ideia surgiu depois que um
vídeo postado no YouTube por uma das administradoras, a professora
universitária Carla Simone de Castro, 41, ganhou repercussão nas redes sociais.
Enquadrada como caso raro, ela, que teve trombose cerebral, começou a receber
depoimentos de outras mulheres que também tinham tido reações às pílulas. Carla
se uniu a outra vítima, a administradora de empresas Simone Vasconcelos Fator,
34, e as duas criaram a página.
Segundo elas, falta cuidado por
parte dos ginecologistas na hora de receitar o remédio. As reações adversas
acontecem, principalmente, em mulheres que são portadoras de uma condição
genética conhecida como trombofilia – ou tendência para trombose venosa –, mas
nem sempre os médicos pedem os exames que a detecta.
“Infelizmente, somente perguntar
para a paciente se há casos de trombose na família não elimina o risco de ela
ter trombofilia”, diz Simone. O uso do remédio pode causar desde dores de
cabeça leves até reações mais graves, como Acidente Vascular Cerebral (AVC),
trombose, embolia pulmonar e infarto. Quando uma mulher portadora de
trombofilia começa a fazer uso de anticoncepcionais, o risco de ela sofrer uma
trombose aumenta 30 vezes. O problema é que, muitas vezes, as mulheres
descobrem que não poderiam fazer uso do medicamento da pior maneira.
Sem critério. “Acreditamos que os
anticoncepcionais são prescritos, muitas vezes de forma indiscriminada”, diz
Simone, para quem somente as informações contidas na bula não faz com que a
paciente saiba exatamente os riscos a que estará exposta ao iniciar o uso.
Em julho de 2014, ela teve
embolia pulmonar após três meses de uso do anticoncepcional Iumi. Simone usou o
medicamento com prescrição médica e não tinha nenhum fator de risco. “Não
existem casos de trombose na família, não fumo, não bebo. Li a bula, não estava
dentro de nenhuma contra indicação do medicamento. Confiei no meu médico, achei
que era seguro, usei e levei um susto quando, após alguns dias com falta de ar,
cansaço e um aperto no peito, fui parar na UTI. Exames de genética foram
feitos, e eu não tenho trombofilia. Mas, mesmo saudável, fui vítima do
anticoncepcional”, relata.
Embolia. Sentindo muita falta de
ar, fraqueza e dores no pulmão, a estudante de direito Mayara Borges Gonçalves,
24, procurou um hospital em Belo Horizonte, onde mora. Ela foi diagnosticada
apenas com dores musculares e voltou para casa com a receita de um analgésico.
Era março de 2012 quando os sintomas começaram. Um mês depois de tomar os
analgésicos e não sentir que estavam fazendo efeito, ela voltou ao hospital e
só então descobriu que o que ela estava sentindo eram sintomas de uma embolia
pulmonar.
Mayara é portadora de uma doença
autoimune chamada SAF (Síndrome do Anticorpo Antifosfolipídeo), na qual o
organismo produz anticorpos que afetam a coagulação do sangue. Os portadores
dessa síndrome não podem tomar hormônios sob qualquer hipótese.
“Fiquei internada durante uma
semana tomando analgésicos, inclusive morfina, e injeções de anticoagulante na
barriga, duas vezes por dia”, lembra. Ela conta que, apesar de não ter ficado
com sequelas visíveis, terá que tomar anticoagulante pelo resto da vida.
Além disso, depois do susto, toda
vez que sente dores de cabeça ou tontura, ela já se apavora achando que pode
sofrer tudo outra vez. Segundo Mayara, nenhum ginecologista a alertou sobre os
riscos da pílula, e ela também não fez exames para saber se podia tomar o
medicamento.
Pílulas e fatores genéticos
causaram AVC em professora
Segundo Juliana, em 11 anos de pílulas, médico nunca pediu
exames
A professora Juliana Dias, 39,
também sofreu as reações dos anticoncepcionais sem ter sido alertada pelos
médicos. Em 2010, ela dirigia do trabalho de volta para casa quando sentiu uma
dor de cabeça tão forte que chegou a vomitar. Depois, com torcicolo e dores na
coluna, sem conseguir se mexer, foi a um hospital, onde foi medicada e
liberada. Depois de três meses fazendo fisioterapia e, novamente, se sentir mal
e ter parte do seu corpo paralisado, ela voltou ao hospital. Logo após a consulta,
o susto. Juliana foi levada diretamente para a UTI, onde ficou internada por
dez dias. Ali, ela descobriu que teve um AVC e que jamais poderia ter tomado
anticoncepcionais, já que tem uma mutação genética.
Ela não ficou com sequelas do AVC
e sente apenas um leve formigamento no braço esquerdo. Além disso, dois anos
após o problemas, ela engravidou e com um tratamento adequado conseguiu ter sua
filha de forma saudável.
‘Danos graves são raros': Suspensão do uso de pílulas contraceptivas
também deve ser acompanhada por médicos
Doenças cardíacas e diabetes,
entre outras, devem ser avaliadas antes da pílula
Diante dos relatos que assustam e
preocupam, o professor da Faculdade de Medicina da Universidade Federal de
Minas Gerais (UFMG) e coordenador do setor de Reprodução Humana do Hospital das
Clínicas, Fernando Reis, traz um alento para as mulheres ao ponderar que os
danos graves causados pela pílula são raros. De acordo com o médico, a chance
de mulheres com menos de 30 anos que tomam pílula combinada, ou seja, que
contém estrogênio e progestogênio, terem tromboembolismo venoso é de dois a
oito casos a cada 10 mil mulheres, e que outros danos como infarto do miocárdio
e AVC são ainda mais raros.
Segundo ele, os ginecologistas
devem se valer, principalmente, de três critérios para avaliar o melhor método
contraceptivo para a mulher. “A eficácia anticonceptiva, que depende do método
escolhido e de sua utilização correta; a segurança para a saúde, que depende do
histórico de cada pessoa e da observância das contraindicações, e a boa
adaptação, que depende das preferências e da tolerância de cada usuária. Se
dois ou mais métodos preencherem todos esses critérios, pode-se escolher o mais
acessível e de menor custo”, explica.
Reis esclarece ainda que, se
houver casos de trombofilia (tendência para trombose venosa) de causa genética
em parentes de primeiro grau, é importante que o ginecologista peça um exame de
sangue. “Não se recomenda testar as pessoas indiscriminadamente, só porque irão
iniciar o uso de anticoncepcional. Isso não traz benefício porque os resultados
negativos não garantem a ausência de risco e os resultados positivos não
significam que haverá algum problema”, avalia.
Ainda de acordo com Reis, é
importante fazer avaliação do histórico pessoal ou familiar para outras doenças
como obesidade, tabagismo e síndrome metabólica, que estão entre os fatores de
risco para tromboembolismo venoso. Além disso, hipertensão arterial, diabetes
de longa duração e algumas doenças cardíacas também devem ser avaliadas.
“Genericamente, não havendo
contraindicação, os anticoncepcionais não oferecem risco à saúde. Ao contrário,
eles salvam muitas vidas evitando gestações indesejadas e abortos inseguros,
complicações gestacionais e até câncer de ovário. A segurança e o risco
dependem muito do perfil de saúde do usuário”, conclui.
Na página criada para ajudar as
vítimas de anticoncepcionais, as administradoras orientam as mulheres a não
suspenderem o uso das pílulas sem consultar o médico.
PÍLULA DO DIA SEGUINTE: Bomba
hormonal traz mais riscos
O contraceptivo de emergência – a
chamada “pílula do dia seguinte” – é alvo constante da indicação não
especializada. “Para fazer efeito, ele deve ser consumido em até 72 horas após
a relação sexual. Por ter que tomar essa decisão em um curto espaço de tempo, a
maioria das mulheres não consulta o médico. Elas vão direto à farmácia e
compram a marca indicada pelo balconista ou a mais barata”, lembra o
ginecologista Rogério Bonassi. A alta carga de hormônios no organismo (entre
seis e 20 vezes a mais que a de um contraceptivo comum) age de duas maneiras:
se a mulher ainda não ovulou, a pílula retarda a liberação de um novo óvulo. Se
a ovulação por acaso já aconteceu, ele acelera a descamação do endométrio (a
camada que recobre o útero para receber o óvulo fecundado e cuja descamação dá
origem à menstruação). A pílula também torna o muco vaginal mais denso,
dificultando a passagem de espermatozoides. “A pílula do dia seguinte é um
componente hormonal de alta dose, por isso pode causar efeitos colaterais como
náuseas, interrupção prolongada da menstruação e até trombose”, alerta o
médico.
Fonte: O Tempo
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