No último domingo (25), aconteceu
a escolha da mais nova Miss Universo: uma mulher, representante de um país, que
foi coroada e declarada como a mais bonita que existe no planeta. Para receber
o título, a moça desfilou com trajes variados, inclusive um biquini, e competiu
contra dezenas de outras mulheres.
Por Jarid Arraes
No meio de tantas moças,
pouquíssimas eram negras ou não brancas. Todas eram magras. Os sorrisos, os
cabelos, a forma de andar e o jeito de falar;
tudo milimetricamente planejado e ensaiado, coordenado para atender a um
rígido padrão do que o mundo enxerga como a feminilidade adequada. Um
verdadeiro festival para celebrar a plastificação da mulher e a sua redução aos
seus atributos físicos.
Mesmo que isso seja evidente para
muita gente, de vez em quando os muitos problemas dos concursos de beleza são
considerados até positivos. Como quando uma garota gorda concorre ao título de
musa, ou quando são criados concursos voltados para grupos de mulheres
excluídos dos grandes eventos como o Miss Universo. Inventam um concurso
diferente para cada categoria de mulher fora do padrão e aparentemente todo
mundo se contenta com isso.
É preciso olhar os concursos de
beleza com olhos criteriosos, pois o próprio princípio da disputa já é um
absurdo; afinal, como assim mulheres competem umas com as outras para que sejam
avaliadas e uma delas escolhida como a mais bela entre todas? Não tem algo de
muito errado aí? Aliás, quais são os critérios para que uma mulher possa
participar daquele concurso? Porque se alguém será escolhida como mais bela,
isso significa que os jurados escolherão características mais bonitas e outras
mais feias. Algo arbitrário, efêmero, cultural e frágil. Assim como o próprio
conceito de beleza.
Como então esperar que mulheres
se empoderem genuinamente a partir de valores como esse? E que tipo de
empoderamento é esse que condiciona a valoração social de uma mulher a sua
aparência física? Mesmo em concursos criados para mulheres que não se encaixam
nos padrões, como o do corpo magro, ainda existem padrões sendo reproduzidos e
ainda prevalece a estética como condição para que aquelas mulheres sejam
aplaudidas e ganhem importância. Essa é uma armadilha ardilosa, pois explora a
autoestima fragilizada, mas não oferece uma solução real para o problema – que
é a noção de que mulheres precisam ser bonitas.
Nenhuma mulher precisa ser
bonita. A beleza não é uma qualidade fundamental para que mulheres sejam seres
humanos plenos, capazes e importantes. Em uma sociedade que gira em torno da
aparência e move bilhões em dinheiro para que essa aparência seja apresentada
de forma impecável, a afirmação de que mulheres não precisam ser bonitas é uma
enorme transgressão. Essa afirmação é o tipo de atitude que coloca um ponto
final em uma relação misógina e tira dos outros o poder sobre a vida feminina.
A beleza é algo que a mulher pode
ou não desejar; e pode ser algo que as pessoas com quem essa mulher se
relaciona pensam ou não pensam a seu respeito. Mas o empoderamento verdadeiro
coloca nas mãos da mulher o poder de definir como se enxerga e estabelecer o
seu valor pelo ser humano completo que é, não pelo formato do seu corpo, seus
traços faciais, a cor de sua pele ou a presença de algum tipo de deficiência.
Deveria ser possível viver plenamente sem que a ideia da beleza se torne um
fantasma que assombra ou uma miragem que é constantemente perseguida.
Talvez, no fim das contas, pelo
menos uma reflexão deva conquistar espaço em nossas mentes: por que ser
considerada feia, “baranga”, “dragão” e coisa similar ainda é um dos maiores
insultos que uma mulher pode receber? E por que, seja considerada bonita ou
feia, a capacidade intelectual da mulher está sempre condicionada a sua
aparência física? Precisamos questionar os valores que reduzem a mulher à
obrigação de buscar a beleza, incluindo a forma como são reforçados e reproduzidos
por meio de concursos.
Que as interrogações sejam,
então, o começo da libertação.
Fonte: Geledes
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