A inauguração da Arena Castelão, o primeiro estádio a ficar
pronto para a Copa do Mundo de 2014, na cidade de Fortaleza ( que custou mais
de R$ 500 milhões ao Estado do Ceará) contrasta com uma realidade tão antiga
quanto trágica no país: a prática da prostituição aliada à miséria. Meninas e
meninos de 10, 11 e 12 anos estão sendo agenciados por um prato de comida, e
não existe política pública para impedir esse crime contra a infância e adolescência.
A presidente da Comissão de Direitos Humanos da Câmara
Municipal de Fortaleza afirma que "meninas e meninos de 10, 11 e 12 anos
estão sendo agenciados por um prato de comida, e não existe política pública
para impedir esse crime contra a infância e adolescência", afirma a
vereadora Eliana Gomes (PCdoB/CE).
O avanço da prostituição de crianças e adolescentes chama
ainda mais atenção porque os investimentos feitos em Fortaleza em função da
Copa atingem a cifra de R$1,08 bi. "E, quando você entra em um dos seis
conselhos tutelares da cidade (responsáveis pelo atendimento de menores, de
acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente), ou quando entra na única
delegacia do Estado especializada para combater esses abusos, nada funciona. E
não funciona porque não há investimento público", afirma a vereadora.
"Falta dinheiro, falta papel, falta tudo", diz Gomes.
A Câmara de Fortaleza instaurou uma CPI (Comissão
Parlamentar de Inquérito) para mapear o problema da prostituição na sede
cearense da Copa. "Durante nossa investigação de seis meses, concluída em
dezembro de 2011, uma delegada teve de usar o próprio carro para fazer uma
autuação; falta tudo. Mas o dinheiro para obras de engenharia está vindo. Por
que não temos um programa que ajude essas crianças a continuar crianças,
melhorando a vida de suas famílias que passam fome no entorno do estádio de
meio bilhão de reais?", pergunta-se a parlamentar.
Os dados apresentados pela vereadora Eliana Gomes constam no
relatório final da CPI (que teve Gomes como relatora), divulgado no começo
deste ano. "Grandes eventos esportivos precisam de viadutos e estádios,
mas principalmente de políticas públicas que cuidem dos mais frágeis. Até mesmo
os operários do Castelão que ficaram alojados dois anos na área estimularam esse
tipo de comércio sexual com meninas e adolescentes", denunciou a
vereadora, que encerrará seu mandato no dia 31 de dezembro.
O trabalho de mapeamento feito pela CPI registrou 73 pontos
críticos de prostituição de crianças em áreas nobres da cidade e na periferia.
O texto de 274 páginas foi encaminhado a todos a órgãos de gestão estadual,
municipal e federal (Polícia Federal), no primeiro trimestre de 2012.
Algum tipo de providência oficial foi tomada, questiona a
reportagem. "Nenhuma, absolutamente nenhuma", responde a vereadora,
que tem uma filha de 17 anos. "Fizemos um trabalho científico, com apoio
da Universidade Estadual do Ceará, e, de prático, houve apenas duas operações
policiais, que prenderam o gerente de um café famoso na orla marítima. Durante
as investigações, alguns locais foram fechados, mas estão abertos novamente, e
a Copa pode significar o descontrole na exploração infantil. Ninguém faz nada.
A rede é muito poderosa, tem gente influente, com certeza", afirma Gomes.
Fortaleza tem seis conselhos tutelares instalados, que não
funcionavam à noite. A delegacia especializada e a Justiça não mantêm plantões
noturnos ou durante os fins de semana. "Os conselhos são tímidos diante do
que temos na cidade. Há seis meses, foram iniciados os plantões noturnos",
lamentou a vereadora.
Fonte: UOL
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