Quer emagrecer? Pare de fazer
dietas. É o que aconselha a nutricionista Sophie Deram, 50, francesa e
naturalizada brasileira, em seu livro "O peso das dietas" (editora
Sensus), lançado nesta semana em São Paulo.
Doutora em endocrinologia e pesquisadora da
USP, ela é contra regimes restritivos. Baseia-se em estudos que demonstram que
eles podem até funcionar no começo, mas cerca de 95% das pessoas voltam ao peso
inicial.
Isso acontece, segundo ela, porque o cérebro
entende essa mudança repentina na alimentação como um perigo e se adapta para
reter mais gordura. "A dieta estraga o cérebro", diz ela. A seguir,
trechos da sua entrevista.
Por que a sra. defende gordura e
é contra as dietas?
Sophie Deram - Sempre achei sem
noção essa guerra contra a gordura. Ela sempre fez parte da minha vida. Claro
que sem exagero, mas, na França, comia manteiga de manhã, queijo, foie gras.
Quando me mudei para o Brasil,
fui trabalhar com genética e obesidade infantil. Fiz doutorado e percebi que as
crianças obesas, mesmo com a maior vontade do mundo, não conseguiam emagrecer
quando tinham um problema de comportamento alimentar. O que me assustou foi ver
que 95% das pacientes com transtorno alimentar tinham começado fazendo dieta. A
dieta estraga o cérebro.
Como nutricionista, a sra. nunca
prescreveu dietas?
Nunca consegui fazer isso. Como
poderia para falar para alguém: "Amanhã, ao meio-dia, coma duas colheres
de arroz". Quem sou eu para saber a fome que ela terá amanhã no almoço?
Fiz pesquisas de genética do
transtorno alimentar, coordenando no Hospital das Clínicas o banco de DNA dos
pacientes que têm transtornos alimentares. O que controla o nosso peso é o
nosso cérebro. Ele controla nossas emoções, a fome, a saciedade. Às vezes, a
gente come sem controlar, sem planejar.
O que acontece com o cérebro
quando fazemos dieta?
Nós assustamos o cérebro. Ele
reconhece a dieta como um perigo e desenvolve mecanismos de proteção. Cerca de
95% das pessoas que fazem dieta voltam a engordar, às vezes até mais.
Estudos com gêmeos idênticos
mostram que o gêmeo que faz dieta é mais gordo do que o gêmeo que não fez. A
ciência já demonstrou que fazer dieta engorda. E o que normalmente mandam o
obeso fazer? Fechar a boca e malhar. São duas ações que aumentam o apetite.
As dietas têm risco em potencial
de fazer a pessoa desenvolver transtornos alimentares. É claro que não
acontecerá com todos. Aí entra a genética. Estudos mostraram que, se você tem
determinado gene, há mais risco de desenvolver bulimia se fizer uma dieta. Esse
gene está em 30% da população.
Mas dietas são passadas por
médicos e nutricionistas...
Sim. Mas eles não conseguem mudar
a cabeça. Isso é que foi ensinado pra gente. Eu aprendi que o peso é resultado
daquilo que você come menos aquilo que você gasta. Não concordo com essa
simplificação do peso. Claro que é importante não comer demais, não liberar
tudo.
Quem fez muita dieta vai comer
muito. É uma adaptação do cérebro. Quanto mais você faz dieta, mais apetite
você vai ter. E esse aumento do apetite permanece por pelo menos um ano depois
da dieta. Você vai engordar porque o corpo quer proteger você de uma próxima
escassez.
Essas dietas que cortam
carboidratos e contam calorias, são inúteis a longo prazo?
Inúteis eu nunca vou falar porque
sou cientista. O que eu estou dizendo é que, fazer esse tipo de dieta te coloca
em risco de engordar, de desenvolver transtorno alimentar. Isso é uma bomba,
especialmente para os nossos jovens em crescimento. Mães que têm medo que a
criança engorde tentam restringir [a comida]. Isso a leva comer escondido,
mesmo sem fome ou a comer sem limite.
Como os pais devem agir?
O trabalho dos pais é oferecer
comida de qualidade. Em casa, tenha uma rotina, cozinhe. Não precisa proibir
doces, por exemplo, mas que o consumo seja ocasional. Não entupa seu filho de
refrigerante no almoço, a melhor bebida que existe é água.
É a primeira coisa que eu negocio
com as crianças: diminuir sucos e refrigerantes e beber mais água. Eles me
olham e dizem: "Ahhh, vai ser horrível!" Depois voltam muito felizes
pra me contar: "Eu consegui beber água".
É impressionante, mas tem
crianças bebendo mais de um litro de suco por dia.
A questão é que, para muitos pais que
trabalham fora, fica difícil essa rotina de cozinhar, fazer sucos naturais...
Não precisa cozinhar coisas
complicadas. É possível fazer um jantar em 15, 20 minutos. O negócio é se organizar
para não acontecer de chegar em casa cansado, com fome, e não ter nada na
geladeira.
O que vai fazer? Vai pedir comida
ou sair para comer um lanche rápido. Quanto mais você conseguir incluir
alimentos da natureza, para quais o nosso corpo foi programado, melhor.
É comum alguns alimentos, serem
demonizados e outros endeusados. Há interesses comerciais nesse jogo?
Não existe um alimento que vai
salvar a sua vida. Nosso corpo precisa de variedade, de qualidade. Nosso
cérebro está aqui procurando o melhor bem-estar possível. Mas se a gente o
agride o tempo todo, ele precisa se defender ganhando gordura. A gordura nos
salvava nas cavernas. Nosso cérebro pensa que gordura é proteção.
Gordura então faz bem?
Não estou dizendo para as pessoas
se entupirem de gordura. Mas não deveríamos demonizá-la. Isso foi um dos
maiores erros da nutrição. A gordura foi demonizada por estudos que associavam
seu consumo a uma maior incidência de doenças cardiovasculares. Hoje a gente vê
que foram estudos malfeitos.
A partir disso, o mundo começou
uma guerra contra a gordura. E a indústria se adaptou a isso. Não acredito em
conspirações da indústria. Ela precisa vender. E o que você coloca para
substituir a gordura? Açúcar, carboidrato. O excesso de carboidrato aumenta o risco
de doenças cardiovasculares.
Você acredita que as pessoas
estejam com medo de comer?
Sim, as pessoas estão assustadas.
Eu sempre digo: pare de pensar, não precisa ser uma nutricionista para comer
bem. Volte a lembrar do seu avô. Ele não se pesava, comia café da manhã,
almoço, lanche da tarde, jantar, e ele estava bem.
Mas no passado as pessoas eram
mais ativas, não?
Acho que elas tinham menos
estresse. Muitas pessoas fazem academia hoje e nem por isso estão mais magras.
Você precisa ser ativo, andar a pé, de bicicleta. Para muitas pessoas, academia
é uma tortura. Atividade física tem que ser prazerosa, não é para ser difícil e
só ser feita se tiver muita força de vontade.
Qual o seu principal conselho
para quem busca perder peso?
A pessoa precisa se perguntar por
que quer perder peso. Se é porque acha que ser magro é mais bonito, deve pensar
que isso pode ser contra a sua genética. Tenho pacientes que começaram dietas
querendo perder três quilos e, 20 anos depois, estavam com 20 kg a mais.
Se for pra resolver um problema
de saúde, resolva, mas vá atrás de saber o que fez você engordar. Faça as pazes
com você. Esse é um exemplo fantástico aos nossos filhos para que eles não
tenham que viver a guerra com a comida que a gente vive agora.
Fonte: http://www.caaraponews.com.br/noticia/57329/fazer-dieta-so-serve-para-engordar-mais-ainda-diz-nutricionista-da-usp
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