A Secretaria de Justiça de São Paulo registrou 72 casos de
tráfico de pessoas de janeiro a julho
João nasceu no Pará. É travesti desde os 12 anos. Agora, com
17, está em São Paulo e escreve uma mensagem desesperada pedindo socorro ao
avô. Ele foi aliciado por um casal paulistano e se prostitui nas ruas da cidade
para não ser espancado.
Policiais da Divisão de Proteção à Pessoa do DHPP
(Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa) descobriram que, além do
adolescente, o mesmo casal já trouxe, desde o ano passado, 50 travestis do
Pará, Maranhão e Ceará para trabalhar na prostituição de São Paulo. Eles são
investigados por tráfico de pessoas. A polícia libertou João e descobriu as
outras vítimas em três imóveis na Zona Norte da capital.
O crime preocupa, mas ainda não pode ser mensurado no país
com segurança. O tema é tratado na nova novela das 20h da Rede Globo, “Salve
Jorge”, em que a atriz Cláudia Raia alicia meninas brasileiras para trabalhar
no exterior como garçonetes, mas, na verdade, acabam caindo na rede de
prostituição.
Segundo o secretário Nacional de Justiça, Paulo Abrão, o
tráfico de pessoas no Brasil, nas formas internacional e interna e nas diversas
modalidades, é um fenômeno ainda registrado de forma deficitária pelos órgãos
de enfrentamento.
“Isso ocorre porque uma de suas características é a
invisibilidade das vítimas e a negação de se autorreconhecerem como tais. Por
isso, trabalhamos com foco em campanhas de conscientização e com a rede
nacional de apoio”, explica.
Mesmo assim, a Secretaria Nacional de Justiça, do Ministério
da Justiça, em parceria com o Escritório das Nações Unidas sobre Drogas e
Crime, elaborou um diagnóstico preliminar sobre o tráfico de pessoas no Brasil.
O levantamento revela a existência de 475 vítimas entre os anos de 2005 e 2011.
Desse total, 337 sofreram exploração sexual e 135 foram submetidas a trabalho
escravo.
O levantamento mostra ainda que a maioria das vítimas
brasileiras desse fenômeno procura como destinos a Holanda, Suíça e Espanha. No
Brasil, Pernambuco, Bahia e Mato Grosso do Sul registram mais casos desse tipo
de crime. As autoridades investigam também o tráfico para adoção ilegal e para
venda de órgãos.
CPI do Tráfico de Pessoas identificou mais de 500 rotas no
país e exterior
O Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas, da
Secretaria Estadual de Justiça de São Paulo, registrou, de janeiro a julho de
2012, 14 casos de tráfico de pessoas no estado, com 72 vítimas. O crime para
fins de exploração sexual teve quatro atendimentos, com 13 vítimas. Já nos dez casos envolvendo
trabalho escravo foram encontradas 59 vítimas.
“Os traficantes de pessoas aproveitam-se da vulnerabilidade
física, psíquica ou social da vítima para persuadi-la”, disse Juliana Armede,
coordenadora do Núcleo de Enfrentamento ao Tráfico de Pessoas da Secretaria
Estadual de Justiça.
Em 2011, a CPI do Tráfico de Pessoas identificou mais de 500
rotas nacionais e internacionais de tráfico de pessoas. A delegada Nilze Scaputiello, titular da
delegacia de Repressão ao Tráfico de Pessoas do DHPP, investiga o caso do
travesti João e dos outros 50 jovens do Norte e Nordeste que estão se
prostituindo em São Paulo. “Temos informações de que o casal suspeito indica
até um médico para os travestis para cirurgias de implante de silicone e ele
recebe o dinheiro adiantado.”
Entrevista Erick
Alberto _costureiro
Boliviano trabalhou em esquema de semiescravidão
ERICK ALBERTO_ Na Bolívia a gente só ganha dinheiro para
comer e sobreviver. Soube por uma amiga que em São Paulo precisavam de gente
para trabalhar com costura, mesmo sem experiência, que era possível guardar
dinheiro para melhorar a vida. Então, eu vim.
Você tinha dinheiro
para a passagem?
A oficina me pagou. Depois me descontou do salário. Comecei
na dívida (ele trabalhou quatro meses para pagar os R$ 1,2 mil das passagens
aéreas).
Onde você e sua família ficavam nesse período?
Era um quarto. A gente tinha apenas uma cama. Dormíamos eu,
minha mulher e as duas filhas, de 4 e de 2 anos. A gente usava um banheiro que
só tinha água fria. Nas paredes tinha muita umidade e a gente não conseguia
fazer nada além de ir para o trabalho e voltar para o quarto. Todos os dias.
Você trabalhava em que período?
Começava a produzir as peças de roupas às 7h e seguia até as
22h. A gente recebia R$ 1 por peça. Tinha o aluguel do quarto e tudo. Não
sobrava nada.
Qual a sua sensação sobre essa vida aqui em São Paulo?
Eu quero voltar para a Bolívia, mas com uma condição de
comprar uma casa e viver com minha família. Quero minhas filhas tendo uma vida
melhor do que a que eu tenho.
Quando vocês saíam para trabalhar, onde as crianças ficavam?
A mais velha ia para uma creche. A mais nova ficava no
quarto o dia inteiro.
O que você pretende fazer agora que foi “libertado”?
Regularizar toda a minha situação. A Secretaria de Justiça
está me auxiliando com isso. Depois, conseguir um emprego de forma legalizada.
Quero minhas filhas cuidadas. Quero trabalhar em paz.
Fonte: http://diariosp.com.br
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