sexta-feira, 2 de março de 2012

Trabalhadoras do sexo da Mouraria desconfiadas com cooperativa sexual


A proposta de construção de uma "safe house", onde as prostitutas de rua pudessem receber os clientes, foi entregue pela Obra Social das Irmãs Oblatas e pelo Grupo Português de Ativistas sobre tratamento do VIH/sida (GAT) à Câmara Municipal de Lisboa mas a ideia está gerar dúvidas junto das visadas: Inês, de 40 anos, que trabalha na rua do Intendente há 13 anos, contou à agência Lusa que a ideia de reunir todas as prostitutas numa só casa "vai ser uma grande confusão".


 "Nós queremos é receber a nossa reforma e ter os descontos. Como é que vão ali meter tanta mulher? Vai ser uma grande confusão", disse, visivelmente indignada.
 A ganhar 20 euros por ato sexual, Inês rejeita a possibilidade de sair da rua, já que o dinheiro é "suficiente" para as suas despesas e para os filhos.
 Acompanhada de outras prostitutas, o sentimento é partilhado: "Não quero sair desta vida. Estamos habituadas a trabalhar na rua há muitos anos".
 Isabel, outra das mulheres, disse ainda que o conceito de concentrar num só espaço todas as prostituas que ainda queiram exercer a atividade vai "afastar clientes" que procuram ser discretos.
 "Há homens que não gostam de ser vistos. Muitos são casados e não querem ser vistos nem se querem misturar. Ia espantar o negócio", sustentou.
 Também Odete, de 45 anos, considera que o projeto, a concretizar-se, vai levar ao aumento da prostituição: "Como vão haver mais condições eu acho que assim vai haver mais gente a querer vir para esta vida".
 Não só as mulheres da rua, mas também os moradores não concordam com a proposta que já se tornou assunto de café.
 "Eu não acredito. Seria um escândalo fazer aqui uma casa de prostitutas. Ninguém concorda com isto. Estão todos de boca aberta, pensam que é um boato", disse António Pereira, residente na Mouraria há 78 anos.
No entanto, as promotoras não desistem do projeto, preferindo insistir na denominação "safe house" em vez da ideia de um bordel. "Até é ofensivo dizer que uma congregação religiosa estaria a fomentar um bordel. Era dizer que nós seríamos as proxenetas destas mulheres, o que não faz nenhum sentido", afirmou à Lusa a diretora técnica da Obra Social Irmãs Obletas.
 O projeto, esclareceu, visa criar uma cooperativa de mulheres para que decidam o que querem fazer segundo as necessidades que vão sentindo, sobretudo no apoio à saúde.
A instituição estima que existam cerca de 200 mulheres a trabalhar na rua e que poderiam assim agora ter oportunidade de escolher outro rumo ou continuarem a exercer a atividade, com maior dignidade.
Ainda sem local ou prazo definido, a Câmara de Lisboa está agora a estudar o projeto e assegura que vai contribuir para requalificar a Mouraria.
"O projeto vai ser ponderado sem decisões precipitadas. Não sabemos ainda onde se vai localizar. Há pessoas que não querem a casa no seu bairro, mas nalgum terá de ser", afirmou o coordenador do programa de requalificação da Mouraria, João Meneses.
A presidente da Junta de Freguesia do Socorro, Maria João Correia, concorda com o projeto, mas rejeita a construção da futura "safe house" no coração da Mouraria.
"A Mouraria pauta-se por gente simples e humilde mas com valores, e penso que uma coisa destas no coração da Mouraria ia ser muito complicada para gerir com a população e seria uma situação que nos traria alguns constrangimentos", afirmou Maria João Correia.
O projeto está ainda no início, mas já a gerar polémica e divergência de opiniões. Contudo, para a associação "Renovar a Mouraria" não há dúvidas: "Assim que o projeto for bem explicado, será bem aceite por todos", concluiu a presidente do grupo, Inês Andrade.

Fonte: RTP e Jornal de Noticias

Nenhum comentário: