O Papa enviou um novo inquérito
às dioceses a pedir respostas mais aprofundadas a questões como as do aborto,
do acolhimento dos homossexuais e do acesso dos divorciados e recasados aos
sacramentos.
A Igreja Católica quer saber como
combater "a chaga do aborto" promovendo uma eficaz cultura de vida e
como promover o diálogo com as ciências para aprofundar a questão da procriação
medicamente assistida, através de um novo inquérito sobre a família, mais
extenso do que o anterior, enviado pelo Vaticano às dioceses de todo o Mundo.
O questionário, que já está a ser
trabalhado em Portugal, procura ainda respostas mais concretas para o
acolhimento de homossexuais "com respeito e delicadeza" e sem
"discriminações", e lança mais uma vez o debate sobre o acesso aos
sacramentos da penitência e reconciliação dos divorciados ou recasados.
Fonte: Jornal de Noticias
Publicamos a continuação uma reflexão de Leonardo Boff sobre o tema
DISCUTIR O ABORTO POR AMOR À VIDA
Por Leonardo Boff
Custa-me crer que haja pessoas
que defendam o aborto pelo aborto. Ele implica eliminar uma vida ou interferir
num processo vital que culmina com a emergência da vida humana. Eu pessoalmente
sou contra o aborto pois amo a vida em cada uma de suas fases e em todas as suas formas.
Mas esta afirmação não me torna
cego para uma realidade macabra que não pode ser ignorada e que desafia o bom
senso e os poderes públicos. Por ano fazem-se no Brasil cerca de 800 mil
abortos clandestinos. A cada dois dias morre uma mulher vítima de um aborto
clandestino mal assistido.
Essa realidade deve ser
enfrentada não com a polícia mas com uma saúde pública responsável e com senso
de realismo. Considero farisaica a atitude daqueles que de forma intransigente
defendem a vida embrionária e não adotam
a mesma atitude face às milhares de crianças nascidas e
lançadas na miséria, sem comida e sem carinho, perambulando pelas ruas
de nossas cidades. A vida deve ser amada em todas as suas formas e idades e não
apenas em seu primeiro alvorecer no seio da mãe. Cabe ao Estado e à toda a
sociedade criar as condições para que as mães não precisem abortar.
Eu mesmo assisti, nos degraus da
catedral de Fortaleza, uma mãe famélica, pedindo esmola e amamentando o filho
com o sangue de seu próprio seio. Era a figura do pelicano. Perplexo e tomado
de compaixão a levei até a casa do Cardeal Dom Aloisio Lorscheider onde lhe
demos toda a assistência possível.
Mesmo assim ocorrem abortos.,
sempre dolorosos e que afetam profundamente a psiqué da mãe. Narro o que
escreveu um eminente psicanalista da escola junguiana de São Paulo, Léon
Bonaventure, na introdução que fez a um livro desafiador e instigante e não
livre de questionamento: Aborto: perda e renovação: um paradoxo na busca da
identidade feminina (Paulus 2006) de Eva Pattis, uma psicanalista infantil de
origem suíça, reconhecida em seu meio.
Conta Léon Bonaventure, com
sutileza de um fino psicanalista para quem a espiritualidade constitui uma
fonte de integração e de cura de feridas da alma.
Uma senhora procurou um sacerdote
e lhe confessou que havia outrora praticado um aborto. Depois de ouvir sua
confissão o sacerdote, com profundo senso humano lhe perguntou: “que nome havia
dado ao seu filho”? A mulher, perplexa,
ficou calada por longo tempo.
Então disse o sacerdote :”vamos
dar-lhe um nome. E se a senhora concordar vamos também batizá-lo”.
A
senhora anuiu com a cabeça. E simbolicamente assim o fizeram. Depois o
sacerdote falou do mistério da vida humana. Disse: “há vidas que vem a esta
Terra por 10, 50 e até 100 anos; outras jamais verão a luz do sol. No
calendário litúrgico da Igreja há a festa dos Santos Inocentes, no dia 28 de
dezembro, aqueles que Herodes mandou matar no momento em que a Divina Criança
veio ao mundo. Que esse dia seja também o dia de aniversário de seu filho”.
“Na tradição cristã” continuou o
sacerdote, “os filhos eram sempre vistos
como um presente de Deus e uma benção para a vida. No passado nossos pais iam à
Igreja oferecer seus filhos a Deus. Nunca é tarde para você também oferecer seu
filho a Deus”.
O sacerdote terminou sua fala com
as seguintes palavras consoladoras :”Como ser humano não posso julgá-la. Mas
se você pecou contra a vida, o Deus da
vida pode reconciliá-la com a vida e com Ele. Vá em paz e viva”.
O Papa Francisco sempre recomenda
misericórdia, compreensão e ternura na relação dos sacerdotes para com os
fiéis. Esse sacerdote viveu avant la lettre esses valores profundamente humanos
e que pertencem à prática do Jesus histórico. Que eles possam inspirar a outros
sacerdotes a terem a mesma humanidade.
Fonte: https://leonardoboff.wordpress.com
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