quarta-feira, 9 de janeiro de 2013

Projeto pretende legalizar prostituição para evitar abusos durante a Copa



Nas cidades que receberão jogos da Copa do Mundo, muitos trabalhadores já se preparam para receber a horda de turistas sedentos por diversão e possuidora de carteiras recheadas de dólares e euros, entre eles os profissionais do sexo da Rua Guaicurus, no Centro de Belo Horizonte. 

A Associação de Prostitutas de Minas Gerais (Aprosmig), por exemplo, se organiza para oferecer cursos de inglês e de francês para suas associadas a partir de fevereiro. “A demanda vai aumentar muito na Copa, por isso vários profissionais do sexo de outros estados virão para cá. Temos que fazer uma Copa consciente e aproveitar o momento para fazer um debate sobre os direitos das prostitutas”, afirma a presidente da entidade, Cida Vieira. Ela acredita que a oportunidade será muito importante para jogar luz sobre a questão da prostituição no país e promete muita mobilização até o apito inicial da competição por parte da Aprosmig e da Rede Brasileira de Prostitutas.

Conhecido pela defesa dos direitos dos homossexuais e por ter vencido uma edição do programa Big Brother Brasil, o deputado federal Jean Wyllys (PSOL-RJ) apresentou, em julho de 2012, o Projeto de Lei 4.211/12, que pretende legalizar a prostituição no país. A proposta polêmica vem no escopo do debate propiciado pela Copa do Mundo, assim como ocorreu com os últimos países que receberam a competição. A África do Sul, que sediou o Campeonato Mundial em 2010, debateu com vigor o tema nos últimos anos da década de 2010, levando em conta principalmente o risco de disseminação da Aids no país, mas as propostas de legalização não foram aprovadas.

Na Alemanha, que realizou o Mundial em 2006, a legislação que trata do tema foi alterada poucos anos antes, aumentando os direitos das prostitutas e tornando a atividade legal. “O projeto pretende dar direitos trabalhistas aos profissionais do sexo e também combater a exploração sexual de crianças e adolescentes e o tráfico de mulheres”, afirma o deputado. Há ainda uma proposta tramitando no Senado no projeto do novo Código Penal que pretende descriminalizar as casas de prostituição.

SEM CONSENSO Em outubro, um relatório da Organização das Nações Unidas (ONU), escrito pelo advogado australiano John Godwin, recomendou aos países da Ásia que legalizassem a prostituição, mas a proposta de tornar legal a atividade não é consensual nem entre os movimentos feministas.



Saiba mais...
Moradores da Pampulha ainda esperam por obras para reduzir impacto dos jogos da CopaLíderes comunitários pedem reforço no policiamento em dias de jogos no MineirãoMilitante da causa e membro da direção executiva nacional da Marcha Mundial de Mulheres, Renata Moreno argumenta que a regulamentação pode legitimar e naturalizar um modelo de sexualidade opressor e que deve ser mais discutido. “Somos críticas a essa visão de que é preciso regulamentar a prostituição. Precisamos fazer um debate amplo sobre o que isso significa, e a Copa é um momento oportuno para isso. Mas precisamos discutir a prostituição não só no âmbito das cidades que vão receber a competição, mas também a prostituição nas rodovias, nas construções de hidrelétricas e nos rincões do país”, afirma.

Deputado estadual e pastor, Carlos Henrique (PRB) se diz contrário ao projeto de lei, não pela questão religiosa, mas pela questão sociológica, ele diz, pensando na condição de vida das prostitutas. “Esse é o caminho mais fácil para mostrar a incompetência de um governo. Agora querem liberar tudo. O Fernando Henrique Cardoso quer liberar as drogas. Acho que seria temerário legalizar uma profissão como esta, ligada ao submundo do tráfico de drogas e de mulheres. O Estado precisa de fato dar algum amparo e algum acompanhamento. Essas pessoas não devem ser marginalizadas e abandonadas pelo Estado. Mas não acredito que a legalização seja a saída”, afirma.

Ele defende que seja feito um amplo debate sobre o assunto e propõe até que seja feito um plebiscito para que a população opine sobre a questão. Segundo Carlos Henrique, do ponto de vista religioso, as prostitutas não devem ser condenadas. “Jesus defendeu a mulher adúltera, que seria apedrejada. Ele não permitiu que ela fosse mais agredida, mas quis dar a ela uma nova vida. ‘Aquele que não tiver pecado que atire a primeira pedra’, foi o que ele disse”, conta.



Debates e ato político

  
Doutoranda pela Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC) e mestre pela Universidade Federal de Minas Gerais (UFMG), a psicóloga Letícia Cardoso Barreto, de 31 anos, autora da tese Prostituição, gênero e sexualidade: hierarquias sociais e enfrentamentos no contexto de Belo Horizonte, acredita que o que mais aflige as prostitutas atualmente é a falta de direitos. “A violência é uma questão muito menos relevante para elas do que a questão dos direitos. Muitos grupos tendem a falar que existe muita violência contra as prostitutas, mas elas reclamam mais da questão de não poder se aposentar, por exemplo. De qualquer jeito, a violência é fato. Uma prostituta foi assassinada em um hotel aqui em Belo Horizonte em 2012”, afirma.

Cida Vieira confirma a constatação da acadêmica: “Fora do trabalho, temos todas as leis que nos amparam. Dentro, não há qualquer lei que nos proteja. Se o cara não me pagar, não posso acionar a Justiça. Se ele me bater, não posso fazer nada, porque chego lá na delegacia e o delegado está de pés e mãos amarrados”. Ela promete para o segundo semestre uma grande mobilização defendendo o projeto de lei do deputado Jean Wyllys. “Será um dia internacional pelos direitos dos profissionais do sexo. Vamos trazer cantores famosos e fazer debates e um ato político”, propagandeia.

Segundo Jean Wyllys, a regulamentação pode ajudar a combater a exploração sexual de menores e o tráfico de mulheres. Ele defende que seu projeto tornaria mais dignas as condições de trabalho de uma prostituta. “Eu, você e toda a torcida do Flamengo já sabemos que existem casas de prostituição. A prostituição não é crime no Brasil, mas possuir uma casa de prostituição é. Isso abre brecha para a corrupção policial, tem ainda a ligação com o tráfico de drogas e o tráfico de mulheres. O projeto combate isso”, arremata.
Fonte: Estado de Minas

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