A vítima morreu três vezes: no ato da agressão, na
impossibilidade de obter justiça e na destruição de sua imagem pública.
Texto relata o silêncio em torno da morte da estudante da
PUC-SP, que tinha 21 anos, Viviane Alves Guimarães, que se jogou do prédio onde
morava no bairro Morumbi, na capital paulista, em 3 de dezembro. Um suposto
estupro pode ter motivado o suicídio da jovem. Viviane era estagiária de um dos
maiores escritórios de advocacia de São Paulo (Machado Meyer Advogados).
Segundo familiares, ela era uma jovem feliz e realizada.
Por Felipe B.
Abra as pernas, feche a boca e tente não morrer: como ser
uma jovem mulher em São Paulo.
Você possui o
escritório de advocacia mais influente do país. Seus jovens sócios, mulheres e
homens com menos de 40 anos que se acham os donos de São Paulo e ostentam
salários mensais acima de 100 mil reais, decidem brincar com a vida e
autoestima de uma menina de 21 anos começando a carreira como estagiária na
empresa.
O combinado é sacanear a menina, certos da impunidade.
Domínio dos meandros legais que fazem os algozes terem a certeza da impunidade.
O ônus da prova ficará todo com a vítima.
Você é informado sobre o crime (apesar de seus jovens sócios
e demais advogados influentes não olharem essa questão através do mesmo prisma
moral dos pobres mortais) e aciona o departamento de gerenciamento de crise
para preparar uma ação de acobertamento, caso alguma denúncia seja feita. O
primeiro passo é escrutinar a vida sexual da vítima e catalogar qualquer
“desvio de conduta”. Prepare um rol de testemunhas pagas a peso de ouro. Também
prepare a compra do silêncio da vítima, ameaçando-a de ter a carreira encerrada
em qualquer instituição de peso caso leve adiante a vontade de fazer justiça.
Enquanto isso os jovens sócios se regozijam do crime
perfeito, da arte de terem sacaneado a novata. Provavelmente algumas das
sócias, ex-estagiárias também estão rindo. Não é uma questão de gênero. É uma
questão de poder.
Ao mesmo tempo que comemoram a impunidade, os jovens sócios
ainda estão eufóricos por serem os responsáveis pelo escritório ter recebido o
prêmio de Ëscritório do Ano no Brasil, pela consagrada publicação International
Financial Law Review. Além de serem jovens e donos do mundo, agora o bônus será
polpudo.
Mas a vítima não suporta a pressão. Decide pelo suicídio, em
um dos bairros mais nobres da capital.
Merda no ventilador. Departamento de gestão de crise pesa a
mão. Quem der prosseguimento na apuração pode perder alguns de seus maiores
anunciantes. MSM fica calada. Alguns delegados também.
A vítima morreu três vezes: no ato da agressão, na
impossibilidade de obter justiça e na destruição de sua imagem pública.
O escritório fará de tudo para manter a blindagem em seus
jovens sócios criminosos e assassinos. Afinal, eles são a fonte de prosperidade
do negócio, com sua agressividade e falta de ética. Estão ali para vencer. Para
atropelarem os fracos que não aguentam os ritos de passagem para o mundo do poder
sem limites, no qual uma jovem mulher não passa de mero brinquedo descartável.
Afinal, a temporada de contratação de novos estagiários já
está aberta. E elas vão continuar correndo atrás do sonho.
Não é um livro de Scott Turow. Não teremos um herói para
desvendar esse crime e fazer justiça. Vai tudo ser varrido para debaixo do
tapete.
Não existe nada para ser visto aqui! Vão lamentar a morte da
universitária na Índia. Vão, vão, seus pobres!
Link: http://www.pragmatismopolitico.com.br/2013/01/suicidio-da-jovem-estagiaria-silencio-incomoda.html
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