"O tratamento para dependentes de droga requer uma equipe
interdisciplinar de saúde capacitada para as especificidades desse
atendimento", afirma Ivone Stefania Ponczek, psicanalista e diretora do
Nepad (Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas) da
Universidade Estadual do Rio de Janeiro.
Ela pergunta: "Por que as pessoas, sobretudo as mais
desamparadas, estão se drogando tanto?" Segundo ela, "o governo tem
que intervir em saúde, educação, prevenção e numa distribuição de renda mais
justa".
As notícias sobre a disseminação do uso do crack têm sido
alarmantes desde sua entrada no Rio de Janeiro há cerca de seis anos.
No Núcleo de Estudos e Pesquisas em Atenção ao Uso de Drogas
da Universidade do Rio de Janeiro (Nepad-Uerj), 70% dos pacientes que chegam
são usuários de crack.
Várias iniciativas polêmicas têm sido tomadas visando
esvaziar as cracolândias, levando suas populações para abrigos e encaminhando
menores para internação compulsória.
Na área da saúde mental, tal medida ficou identificada com
prisão, isolamento, tortura e maus-tratos, que realmente aconteciam antes da
reforma psiquiátrica.
O uso de drogas foi recentemente descriminalizado e a
identificação vinculando internação a punição ficou muito forte. Urge desmontar
esta associação que impede que os usuários procurem e aceitem ajuda.
Fala-se da internação compulsória, mas onde seria esta
internação, mesmo que não fosse compulsória? Quais equipes iriam cuidar destes
pacientes? Abrigar não é tratar!
Não há quase locais para internação de adolescentes no Rio,
nem equipes capacitadas para acolhê-los e efetivamente tratá-los.
Se houvesse, poderia transformar a internação compulsória no
direito de tratamento que a Constituição garante: "saúde é um direito de
todos e um dever do Estado". Tal mudança de enfoque é fundamental e faz
toda a diferença.
O tratamento para dependentes de droga requer uma equipe
interdisciplinar de saúde capacitada para as especificidades desse atendimento.
A internação deve ser pautada em rigorosos critérios de
elegibilidade, tais como risco de vida ou de terceiros, descontrole no uso de
drogas ou pedido espontâneo de ajuda, etc. Não há "pacotes de
tratamento" que ignorem a singularidade do sujeito.
'MÃES-MENININHAS'
Outrossim, a triste visão das cracolândias, que lembram as
cenas do Holocausto - onde o ser humano é reduzido à sua mais degradante
condição -, é mesmo chocante, não pode ficar invisível. As intervenções
públicas não devem incidir apenas nas consequências, mas também nas profundas
causas sociais e psicológicas.
Por que as pessoas, sobretudo as mais desamparadas, estão se
drogando tanto?
O governo tem que intervir em saúde, educação, prevenção e
numa distribuição de renda mais justa.
Esta vulnerável população é constituída predominantemente de
jovens e crianças relegados à sua própria sorte.
Elas não brincaram de "bandido e mocinho", estes
fazem parte do seu dia a dia. E as bonecas não são de brinquedo, são filhos de
gestantes precoces que já vêm predestinados a repetir o triste destino de suas
"mães-menininhas".
Fonte: Folha de S. Paulo
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