Washington Araújo
Não demorou muito e o BBB é caso de polícia. Mais, é caso de estupro. Mais, é caso do habitual descaso com que a programação da tevê aberta brasileira é tratada tanto pela sociedade quanto pelas instâncias governamentais.
A 12ª edição de um dos programas mais fúteis dentre a enormidade de produção de lixo televisivo nem chegou a completar uma semana de existência e já mostrou a que veio: vender cabeças vazias em corpos sarados e uma série quase interminável de comportamentos humanos aceitáveis na esfera privada e patéticos quando transbordam para a esfera pública.
Na noite de sábado [14/1], festa no BBB. Prenúncio de comas alcoólicos e certeza de danças variando entre o sensual e o erótico, ritmo alucinante, luzes piscando e tudo contribuindo para a exposição, sem reservas, dos instintos humanos. Na madrugada de domingo, o Twitter passa a movimentar um sem número de mensagens denunciando Daniel de ter estuprado Monique, tudo captado pelas lentes do BBB, tanto imagem de cobertor em movimento quanto som. O problema, segundo o Twitter, é que apenas um dos dois parece estar vivo – apresenta, vamos dizer, sinais vitais. Este seria o Daniel. Não tardou para que hashtag #DanielExpulso viesse a ser um dos tópicos mais comentados do domingo.
Caso de polícia
Ainda na segunda-feira, a ministra da Secretaria de Políticas para as Mulheres, Iriny Lopes, enviou ofício ao Ministério Público do Rio de Janeiro solicitando que o órgão "tome providências em relação ao suposto estupro que teria acontecido dentro do programa Big Brother Brasil 2012, exibido pela TV Globo.”
Silêncio da imprensa
Em um país que busca combater a violência contra a mulher em seus muitos aspectos e, em especial, combater o crime de estupro, chama a atenção o silêncio da grande imprensa em torno do caso. Sim, porque pedidos pela expulsão de Daniel e punições à TV Globo não partiram dos jornais Folha de S.Paulo, Estado de S.Paulo e muito menos da emissora-líder na desconfortável posição de facilitar a ocorrência de estupro, com tudo gravado, segundo a segundo, e retransmitido para todo o Brasil. As denúncias começaram na forma de "piados” (twitter, em inglês), passaram pelo Facebook e tomaram forma nos tais blogues sujos (para a grande imprensa) e alternativos (para a cidadania).
No espaço de 24 horas, muitas águas rolaram nos desfiladeiros oceânicos da internet. Muitos levantaram o assunto na forma de algo adredemente planejado pela emissora do Jardim Botânico carioca para alavancar a audiência do BBB nesta sua 12ª edição. Outros tantos foram mais enfáticos e exigiram nada menos que a suspensão do programa por tempo ilimitado ou, ao menos, pelo tempo em que durarem as investigações policiais. Mas isto é pedir muito quando estão em jogo interesses unicamente comerciais. Porque o dinheiro não tem nem pátria, ética, nem moral, nem costumes. Tem apenas a densidade que seu proprietário a ele conceda. E nesses tempos em que a liberdade é vista como garantia de expressão dos instintos humanos básicos a qualquer momento, o sucesso nada mais é que conseguir esticar ao máximo seus quinze minutos de fama (lembram do Andy Warhol?), amealhar bens materiais e financeiros sem qualquer escrúpulo, usando os meios mais torpes para sua consecução. Neste contexto, não há muito o que esperar.
Nos últimos três anos escrevi no Observatório da Imprensa críticas ao conteúdo, formato, estilo, produção e transmissão do Big Brother Brasil. Tratei de estética, de conteúdo, de ética e de direitos humanos. Abordei a questão da privacidade e o circo de horrores que a qualquer momento poderia vir a ser a marca registrada do BBB. Depois, resolvi não mais escrever. Porque é difícil falar para o deserto, ou pior, para o vácuo. Mas com a chegada da polícia ao Projac julguei oportuno voltar a tratar do "assunto”. Não porque o programa mereça, mas sim porque é um momento propício para debater sobre a sociedade que temos e a sociedade que queremos.
Nenhum comentário:
Postar um comentário