Jornalistas de 27 países
reuniram-se em Barcelona para fomentar uma comunicação sem padrões patriarcais.
Eles denunciaram os maus tratos informativos, machistas e humilhantes, sofridos
pela presidenta Dilma Rousseff. A situação das mulheres refugiadas.
A reportagem é de Sonia Santoro e
publicada por Página/12, 08-05-2016. A tradução é de André Langer.
“Fazemos um apelo às empresas
jornalísticas e de comunicação para agirem contra as informações de caráter
sexista e com padrões patriarcais, além de reverem os manuais de estilo para
que reforcem a informação e comunicação com perspectiva de gênero e sobre os
direitos das mulheres”. Assim se pronunciou o VI Encontro da Rede Internacional
de Jornalistas com Visão de Gênero, que reuniu, em Barcelona, 157 jornalistas
de 27 países. Além disso, reclamou maior cobertura informativa da situação das
mulheres refugiadas e repudiou os “maus tratos informativos, enviesados,
machistas e humilhantes de que tem sido vítima a presidenta do Brasil, Dilma
Rousseff, nos meios de comunicação massivos de seu país”.
No primeiro dia do encontro
esteve presente a prefeita de Barcelona, Ada Colau, primeira mulher e feminista
a ocupar esse posto. Seguiram-se dois dias de debate em que foram propostos
temas específicos das diferentes realidades dos continentes participantes:
América Latina e Caribe, Europa, Ásia e África. Assim como problemas e desafios
comuns.
Entre outros, o Encontro deu
conta da “discriminação e das violências sofridas pelas jornalistas e
comunicadoras no mundo” e reclamou “uma representação não estereotipada das
mulheres nos conteúdos informativos, dando voz às mulheres e refletindo toda a
sua diversidade”.
Diante do descumprimento do
parágrafo J dos Acordos da Conferência de Mulheres realizada em Pequim em 1995,
que se refere ao papel dos meios de comunicação para alcançar a igualdade entre
mulheres e varões, “solicitamos a criação de programas feministas e em defesa
dos direitos das mulheres nos meios de comunicação, especialmente públicos,
assim como o patrocínio efetivo para os que existem e surgirem”, diz o
pronunciamento final.
O problema dos refugiados e
refugiadas teve forte presença com a participação inclusive de algumas
refugiadas, como Rawan al Bash, jornalista palestina da Síria e que vive
atualmente na Espanha. “Quando se é palestina tem-se muitas coisas para
explicar. Quando se é síria mais ainda, porque há uma guerra e as pessoas saem
da Síria devido à violência do governo e do Estado Islâmico”, começou seu
relato. Rawan contou que teve que deixar a Síria porque o governo a perseguia
pelo fato de ser ativista.
Neste sentido, o Encontro
manifestou que “rejeitamos as guerras que forçam o deslocamento das pessoas que
buscam refúgio e pedimos a abertura de fronteiras, uma vez que emigrar é um
direito humano reconhecido”. Além disso, exigiu “uma maior cobertura
informativa da situação das mulheres refugiadas que as mostre como
protagonistas e torne visíveis as violências às quais são submetidas. A
comunicação praticamente nula das instituições europeias sobre a situação das
refugiadas representa uma informação enviesada”.
Denunciou-se também o aumento da
intimidação cibernética e as ameaças sofridas pelas mulheres jornalistas, pelo
simples fato de serem mulheres no exercício da profissão.
Em momentos de crise “sempre se
questiona o poder sobre a mulher e aumenta a violência contra as mulheres”,
disseram as coordenadoras em fim de mandato. Entre elas, Liliana Hendel, pela
Rede Internacional de Jornalistas com Visão de Gênero na Argentina, disse que
“no mundo aumentaram espontaneamente os projetos voluntários em pequenas rádios
e na internet, mas a ausência de jornalistas feministas (salvo casos isolados e
muito raros) e de programas com enfoque de gênero nos meios audiovisuais
massivos é flagrante”. “O maior problema é que nos convenceram de que já
chegamos e que somos iguais. Cuidado com este discurso, porque é mentira”,
disse também. Pela rede participaram, além disso, Miriam Bobadilla, Silvina
Molina e esta cronista.
Entre as apresentações de
temáticas pontuais, a mais mobilizante foi a de Carolina Escudero, argentina
que mora em Barcelona e que comparou o roubo de bebês realizado durante a
última ditadura na Argentina, com o que aconteceu durante o franquismo. “De
acordo com dados, há 30 mil crianças roubadas; segundo os familiares, 100 mil”,
disse. A presença de vários familiares que continuam procurando seus filhos e
filhas comoveu todo o auditório da Universidade Pompeu Fabra.
Sara Mas, correspondente do
Serviço de Notícias da Mulher da América Latina e do Caribe (SemLac) Cuba,
falou sobre o trabalho jornalístico que estão fazendo para mostrar o impacto
que as mudanças econômicas que estão se produzindo em seu país têm sobre as
mulheres. “A maioria dos empregos não demanda altos níveis de educação, quando
a maioria das pessoas formadas são mulheres”, disse. Os novos trabalhos “surgem
com enunciados sexistas, pensados para mulheres e para varões”. “O desafio,
como jornalistas, segue sendo inserir a reflexão e incidir em políticas
públicas para mulheres”, disse.
Daniela Fuentes Moncada, do
Equador, criticou os meios de comunicação pelo fato de abordarem a questão
indígena como um todo homogêneo. “No meu país convivemos muitíssimas
nacionalidades e etnias diferentes. É heterogêneo”, disse.
A pedido da brasileira Rachel
Moreno, que denunciou um “retrocesso absoluto em todos os direitos alcançados”
no Brasil durante os últimos anos, o Encontro fez um pronunciamento de apoio a
Dilma Rousseff e de repúdio às tentativas de golpe. “Denunciamos e repudiamos
os maus tratos informativos, enviesados, machistas e humilhantes de que foi
vítima a presidenta do Brasil, Dilma Rousseff, nos meios de comunicações de
massa de seu país”, disse o comunicado. “Exigimos que se respeite a ordem
institucional derivada do cumprimento do mandato da eleição presidencial de
Dilma Rousseff”, prossegue. E, finalmente, rejeita “qualquer tentativa de golpe
de Estado”.
No final do encontro, decidiu-se
que o Brasil será a sede do próximo Encontro da Rede Internacional de
Jornalistas com Visão de Gênero, em 2018.
Montserrat Minobis, presidenta da
Rede Internacional de Mulheres Jornalistas e Comunicadoras da Catalunha,
declarou que “saímos mais fortalecidas e com o objetivo de levar adiante
projetos comuns e, como diz o manifesto, continuar a luta global contra a violência
e a defesa dos direitos das mulheres, especialmente quanto à cultura da paz e a
defesa das mulheres migradas e refugiadas”.
Meios de comunicação,
estereótipos, precarização, violência, redes, jornalistas, gênero, refugiadas,
migrantes, indígenas... palavras, categorias que foram nomeadas e debatidas
durante três dias em Barcelona. Problemas e soluções que cada uma levou para o
seu país de origem para tentar converter em leis, práticas, políticas com
perspectiva de gênero.
Fonte: Ihu
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