sexta-feira, 17 de julho de 2015

Como reconhecer a armadilha do relacionamento abusivo

Em um relacionamento abusivo, o parceiro pode não ter matado ou agredido a mulher (ainda), mas a prende em um relacionamento destrutivo e muito danoso. Tudo partindo da premissa que “mulheres são coisas e essa coisa é MINHA”.

por Aline Valek

Experimente fazer uma busca no Google com o termo “inconformado com o fim do namoro”. Deixe que o próprio Google te mostre a triste realidade de mulheres assassinadas, sequestradas e agredidas pelos ex-parceiros. É assustador.
Não poucas vezes a mídia noticia casos de assassinato de mulheres pelos ex como “crime passional”. Mas não há nada de passional nisso. Não são homens que “amaram” demais e, por não suportarem a rejeição, resolveram agir drasticamente como se fossem personagens de um romance shakespeariano. Trata-se, na verdade, de um crime de ódio motivado por uma ideia simples e perversa: mulheres são coisas. Esses homens compraram essa ideia, acreditaram que suas companheiras eram suas posses. Acreditaram que eles tinham direito sobre o corpo e sobre a vida dessas mulheres a ponto de tirar-lhes a vida, se assim eles desejassem. Não é absurdo?

Esses casos mostram o extremo para onde a ideia “mulheres são coisas” pode levar, mas essa ideia se manifesta também no dia-a-dia de quem vive um relacionamento abusivo. Em um relacionamento abusivo, o parceiro pode não ter matado ou agredido a mulher (ainda), mas a prende em um relacionamento destrutivo e muito danoso. Tudo partindo da premissa que “mulheres são coisas e essa coisa é MINHA”.
Espero de verdade que não seja o seu caso, mas você sabe dizer se está em um relacionamento abusivo? Existem algumas pistas que podem indicar se você está presa em uma cilada dessas.
(antes, uma observação: relacionamentos abusivos podem não acontecer apenas em relações heterossexuais; mas, como dentro da nossa sociedade machista existe uma óbvia relação de poder de homens sobre mulheres, este é o recorte que escolhi para o texto)

1. Possessividade e controle: esse é o principal indício de que você pode estar com um cara abusivo. Ele tem ciúmes dos seus amigos, de pessoas do seu trabalho, até de familiares? Controla com quem você pode falar ou com quem você pode sair? Vigia suas mensagens, exige senha do seu e-mail e redes sociais? Desconfia constantemente de você, te acusa de traição sem motivos? Controla as roupas que você usa? Tenta isolar você só pra ele? Olha, o alarme já soou por aqui. Essa possessividade indica que o cara acredita que você é uma coisa, e não um ser humano autônomo e independente. E a gente já sabe o perigo que essa ideia representa, né?
2. Comportamento agressivo: nem é preciso partir para o espancamento para você descobrir que está em um relacionamento perigoso. Ele usa formas de contato físico para te ameaçar, como te segurar com força pelos braços ou te empurrar? Ele soca, chuta e derruba coisas para te intimidar? Já te ameaçou com uma arma? Amiga, fuja desse cara sem olhar pra trás.
3. Força sexo: não é sua obrigação como mulher ou namorada fazer sexo com seu parceiro. Você disse “não” e mesmo assim ele te forçou a fazer algum ato sexual? Ele já tentou fazer sexo com você enquanto você estava dormindo, contra a sua vontade? Ele já te ameaçou ou fez alguma chantagem emocional para que você concordasse em fazer sexo com ele? Sexo sem consentimento significa uma coisa: estupro. Um cara que não respeita o seu “não” já te enxerga como uma coisa desprovida de vontade.
4. Coloca você pra baixo: um relacionamento abusivo não é uma relação de igual para igual, mas sim uma das partes tentando exercer poder sobre a outra. O cara abusivo vai colocar você para baixo para poder se sentir poderoso. Ele humilha você com xingamentos ou apelidos pejorativos? Desvaloriza tudo o que você faz? Faz você se sentir feia, burra ou incapaz? Fica com raiva quando você demonstra independência, inteligência ou força? Ele te ofende e faz você passar por constrangimentos? Com isso, ele está destruindo uma das suas armas mais poderosas: sua autoestima. Há homens que acreditam que se puderem enterrar a autoestima da mulher sob vinte metros de concreto, ela estará mais suscetível a tolerar uma merda de relacionamento.
5. Desrespeita outras mulheres: fique atenta ao histórico do cara com quem você vive ou se relaciona. Ele maltrata outras mulheres, como a mãe, a irmã, a empregada, amigas, colegas de trabalho, desconhecidas na rua? Não fique indiferente ao comportamento agressivo do cara em relação a outras mulheres, pois nada impede que ele faça o mesmo com você.
6. Manipula: ele faz chantagem ou joguinhos para que você faça exatamente o que ele quer? Ele te pune e te impõe restrições se você o desobedece? Ele te coloca em situações em que você precisa da permissão dele para alguma coisa? Ele te proíbe de falar com os parentes para impedir que você conte o que acontece entre vocês? Ele te culpa por um abuso que ele tenha cometido contra você? Depois de um abuso ele se torna repentinamente carinhoso e romântico para que você o desculpe? Ele te ameaça ou faz qualquer tipo de chantagem caso você ameace abandoná-lo? Ele ameaça se matar caso você termine o relacionamento?
Se sim, lamento informar, mas você está em um relacionamento abusivo. Ou, na mais utópica das hipóteses, com um cara MUITO babaca.
“Estou em um relacionamento abusivo. E agora?”
Bem, só tenho um conselho para te dar: sai dessa. Corre. É uma cilada.
Claro que não é fácil assim. E eu te entendo, de verdade. Por isso o relacionamento abusivo é uma armadilha tão perigosa: porque te coloca numa situação difícil de sair, seja por ter tornado você dependente do cara financeira ou emocionalmente, seja por fazer você sentir medo ou culpa ou ainda aquela esperança de que você possa “salvar” o seu namoro ou casamento. Mas sua vida está acima de um namoro ou de um casamento. O caso é grave e não dá para arriscar sua vida, seu bem estar e sua integridade física desse jeito.
Se for difícil, conte para familiares e amigos mais próximos. Tenho certeza de que você terá muitas pessoas ao seu lado para te apoiar e te proteger nesse momento.
E se o cara te trata dessa forma, ele não vale a pena MESMO. Eu te garanto: você não vai estar perdendo nada. Além disso, não caia na ilusão de que você tem a “missão” de consertar este cidadão. Você não é obrigada.
Acima de tudo, o mais importante e que eu destacaria com um marcador colorido e glitter se fosse possível: NÃO É CULPA SUA.
Podem dizer que você foi burra por ter se envolvido com um cara assim, que a culpa foi sua por não ter percebido antes, que a culpa foi sua por ter deixado ele abusar de você, que você foi ingênua, fraca, submissa. Não acredite. Não é verdade. A culpa aqui é do cara que abusou de você, te ameaçou, tentou te controlar ou te agredir. Pro inferno com essa gente que tenta transferir a culpa para quem só se ferrou na história toda.
No mais, se ele te agrediu, continua te ameaçando ou te perseguindo, procure uma Delegacia da Mulher e denuncie.
A vida é curta demais para perder tempo com quem trata você como coisa.
Força.

Fonte: Carta Capital

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