terça-feira, 26 de junho de 2012

Prostitutas são prejudicadas por Elize


Morte de executivo da Yoki atrapalha sonho de garotas de sair da prostituição e construir família. ‘Elas ficam marcadas para o resto da vida’

O assassinato do executivo da Yoki Marcos Matsunaga, de 41 anos, pela técnica em enfermagem e ex-garota de programa Elize Matsunaga, 30, atrapalha os sonhos das profissionais do sexo que, como ela, desejam abandonar a profissão para constituir uma família com um eventual cliente.
É o que acham as ex-garotas de programa,  escritoras e autoridades no assunto  Raquel Pacheco, a Bruna Surfistinha,  e Vanessa de Oliveira,  palestrante e consultora sexual da revista “Playboy”.
Para Raquel, o estigma social de trabalhar com sexo já influenciava negativamente a vida de quem é profissional da área. “Há, sim, um preconceito. E ele pode ter aumentado com esse crime. Acho que os homens que querem casar com ex-garotas de programa vão começar a ficar mais cuidadosos”, falou Raquel.
“Mas a antiga profissão dela não pode ser levada em consideração. Elize agiu por raiva. Esse caso é único. Nenhuma outra garota de programa matou ninguém, mesmo entre as que casaram com clientes, que não são poucas”, disse a ex-profissional do sexo.
Vanessa de Oliveira tem uma história praticamente igual à de Elize, apenas com desfecho diferente.  Também formada em enfermagem, ela abandonou a profissão de garota de programa para se casar com um empresário de origem oriental. Como Elize, Vanessa descobriu que estava sendo traída e passou a sofrer abusos morais por parte do marido. Quando obteve provas da infidelidade e as mostrou ao cônjuge, sofreu violência física dele. Mas, ao contrário da ex-prostituta que matou e esquartejou o marido, Vanessa preferiu sair de casa e processá-lo na Justiça.
“Eu entendo Elize. É terrível ser humilhada o tempo todo. Qualquer coisa que acontecia era culpa do meu passado. Em toda discussão ele jogava isso na minha cara”, lembra. “Elize era uma mulher bonita, ganhava dinheiro, abandonou a profissão, socialmente aceita ou não, mediante uma promessa de relacionamento e amor”, continua. Vanessa trabalhou como garota de programa por cinco anos e viveu com o ex-marido por dois anos.
Ela concorda com Raquel  que o caso Yoki pode aumentar o preconceito, dificultando futuros relacionamentos estáveis. “A profissão não determina o caráter de ninguém. As pessoas ainda têm muito preconceito.”
A experiência com o empresário oriental acabou em um livro, “Psicopatas do Coração”, em que Vanessa relata o romance fracassado e dá dicas para as mulheres se prevenirem contra outros pretendentes mal-intencionados.
Efeito colateral /  As garotas de programa do site de anúncios de acompanhantes MClass afirmaram que a exposição na mídia fez triplicar o movimento e também comentários entre os clientes.  De acordo com as garotas ouvidas pelo DIÁRIO, que falaram sob a condição de anonimato, todos os homens que saem com elas comentam o caso.
“Logo que saiu nos jornais que a Elize e a Natália (a outra garota de programa que era amante de Matsunaga) tinham anúncios no MClass, o telefone não parou mais de tocar. Tive um movimento pelo menos três vezes maior”, disse Kelly, que mantém um anúncio no site.
“Todo cliente agora quer saber se eu conheço a Elize ou a Natália, perguntam sobre o caso, brincam se eu não vou fazer o mesmo”, falou Amanda, outra anunciante do serviço.

Entrevista 
Ailton Amélio da Silva
Psicólogo, especialista em relacionamentos amorosos
 ‘Elas ficam marcadas para o resto da vida’
DIÁRIO_ Qual é o problema de casar ou namorar com uma garota de programa?
AILTON AMÉLIO DA SILVA_ O problema todo gira em torno do ciúme e da insegurança de ter uma esposa que fazia sexo ou ainda faz com outras pessoas. Esse é o grande fantasma. A sociedade nos prepara para condenar essa profissional: será que vão descobrir o que minha mulher fazia, como vão reagir?
As garotas de programa querem deixar a profissão em algum momento, mas a maioria diz que é difícil. É mesmo?
Elas são pessoas normais, se apaixonam,  têm desejos de namorar, casar e ter filhos, as mesmas aspirações que qualquer mulher tem. Já trabalhei com muitas garotas de programa e o  que elas me dizem é o seguinte: como vou deixar a profissão? Eu ganho R$ 10 mil e se for trabalhar com outra coisa vou ganhar R$ 800.
É fácil ter uma vida social normal depois de deixar a profissão?
Não. Elas ficam marcadas para o resto da vida. É um fantasma que sempre vai estar lá.
Como é para a garota de programa contar para o namorado sobre a profissão?
É muito difícil. Em uma eventual briga, como aconteceu no caso Yoki, esse fato é o primeiro a ser colocado em pauta. É melhor, no começo, não contar de cara, esperar pelo menos um mês para dar oportunidade ao relacionamento se firmar. Mas é preciso contar em algum momento, antes que surjam maiores implicações, como casamento e filhos, ou até mesmo antes que se forme um novo círculo de amizades porque depois o estrago é muito grande.
O caso Yoki pode atrapalhar as garotas de programa que estão procurando relacionamentos estáveis?
Certamente. Esse caso vai servir de munição. Amigos e parentes que se opõem ao relacionamento vão usar isso para reforçar seus argumentos. O inimigo já tem a munição do preconceito.
 Assassina diz que tinha medo de morrer
Em uma carta escrita enquanto estava na cadeia de Itapevi, na Grande São Paulo,  Elize Matsunaga diz que era humilhada pelo marido,   Marcos Matsunaga,  e tinha medo de morrer. A ex-garota de programa  afirma que seu conto de fadas foi às avessas. “Não me lembro de ter lido em ‘Cinderela’ que o príncipe a humilhava. Não me lembro de ter lido que o príncipe tirou a princesa do lixo e que ela deveria, por causa disso, ser submissa às suas vontades pervertidas e humilhantes”, escreveu. A carta foi divulgada neste domingo pelo “Fantástico”.  “Não me lembro de ter lido  que a princesa seria morta pelo príncipe caso inventasse de levar a filha para outra cidade no caso de separação”. Ela acusa o ex-marido de ter tentado matar a primeira mulher. Elize tinha feito a revelação a uma pessoa  próxima ao casal um mês antes do crime. Essa testemunha confirmou à polícia que Elize  temia pela  vida porque, segundo a sua versão, Marcos havia tentado matar a ex-mulher. Aos delegados, Elize repetiu a história: “Marcos teria colocado veneno em um remédio da primeira mulher, que ela ingeriu o comprimido e passou mal, mas foi socorrida”. Para o advogado da família Matsunaga, Luiz Flávio Borges D'Urso, a acusação não tem fundamento e não passa “de uma sucessão de mentiras”. Na carta, Elize diz estar arrependida. “Eu não tenho o direito de tirar a vida de ninguém. E nada justifica isso. Mas também sei que tenho o direito de defender a minha vida e, principalmente, a da minha filha. Me arrependo por aquele ato impensado. Já estou pagando pelo que fiz e com a moeda que eu mais temia: ficar longe da minha filha”. Elize está presa numa cela de sete metros quadrados na Penitenciária de Tremembé, no interior do estado.

VANESSA OLIVEIRA
Vanessa de Oliveira tem 37 anos e trabalhou como garota de programa de 2000 a 2005. É formada em enfermagem.  O primeiro de seus seis livros, “O Diário de Marise – A Vida Real de Uma Garota de Programa”, foi lançado em 2006. Seu mais recente trabalho, “Psicopatas do Coração”, relata o casamento com um empresário oriental, antigo cliente, que era casado nos Estados Unidos e tinha amantes em diversas cidades do país. Ela também dá conselhos para que mulheres evitem relacionamentos com homens de mau caráter. Atualmente é colunista sobre sexo e amor.

RAQUEL PACHECO
Raquel Pacheco, 27 anos, trabalhou como garota de programa de 2003 a 2005 e ficou célebre pelo blog em que comentava abertamente sobre sua vida como profissional do sexo e adotava o pseudônimo de Bruna Surfistinha. Em 2005 publicou “O Doce Veneno do Escorpião — O Diário de uma Garota de Programa”, relato que fez ao jornalista Jorge Traquini. Em 2006 casou-se com um antigo cliente, o advogado João Correia de Morais. Lançou mais dois livros, “O que Aprendi com Bruna Surfistinha” e “Na Cama com Bruna Surfistinha”.  Em 2011 foi lançado o filme “Bruna Surfistinha”, em que a atriz Deborah Secco interpreta Raquel, com base no primeiro livro. Hoje Raquel trabalha como DJ.

O que dizem as meninas
“Eu ganho, em média, R$ 15 mil por mês. Faço faculdade de direito e quero abrir uma loja de roupas. Tenho investimentos também. Já sei a data em que vou parar: 2014. Mas agora não dá para deixar a profissão, não sem deixar o padrão de vida com o qual me acostumei. Depois vou pensar em um relacionamento”
Kelly,  26 anos

“Não posso aparecer. Tenho uma filha pequena. Claro que morro de medo de que um dia ela saiba a profissão que tive. Eu sei do preconceito que existe, mas o dinheiro é muito bom. Eu jamais ganharia o que consigo em um mês nem em um ano de trabalho em outro emprego. Venho do interior do Paraná e só agora pude começar a estudar administração”
Manoela, 23 anos

"Os clientes estão perguntando se eu conhecia a Elize. Digo que não temos contato umas com as outras no MClass. O site é só um lugar onde anunciamos. Eles também brincam se eu não faria o mesmo que ela fez. Eu rio e digo que não, mas que eles devem ter cuidado para não ser canalhas com as mulheres”
Amanda,  19 anos



Fonte: Diário de São Paulo

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