segunda-feira, 25 de junho de 2012

Procuradoria e CNBB temem 'higienização' de moradores de rua na Copa

Com a proximidade da Copa de 2014, a situação dos moradores de rua preocupa procuradores-gerais de Justiça e o Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos, órgão vinculado à CNBB (Conferência Nacional dos Bispos do Brasil).

Eles temem uma eventual "higienização social" --a retirada compulsória de pessoas que vivem nas ruas-- nas cidades que sediarão os jogos e abrigarão as seleções. Procuradores e CNBB relataram esse temor ao ministro Gilberto Carvalho (Secretaria Geral da Presidência), em Belo Horizonte, por ocasião da reunião do CNPG (Conselho Nacional de Procuradores Gerais), em março.
Foi pedido ao governo apoio financeiro e político para que Estados e municípios possam aderir ao decreto presidencial de 2009 que implantou a Política Nacional para a População em Situação de Rua. Sem o comprometimento de Estados e municípios para criar políticas sociais e programas de apoio aos moradores de rua, os movimentos sociais acham que essas pessoas serão retiradas à força das ruas, o que confronta a política preconizada no decreto.
Há precedentes envolvendo a retirada de mendigos das ruas especialmente no Rio, principal local dos grandes eventos internacionais: na época da Rio-92 e da Cimeira (reunião de chefes de Estado da América Latina, Caribe e União Europeia), em 1999. Foi assim também em maio de 2009, quando a Folha flagrou a prefeitura do Rio recolhendo os sem-teto no trajeto da comitiva da Comissão de Avaliação do COI (Comitê Olímpico Internacional).
Gilberto Carvalho foi até a sede nacional da ONG ligada à CNBB levado por Alceu Torres, procurador-geral de Justiça de Minas. "Essa questão é muito grave", disse Torres, que acrescentou ser preciso avançar "sobretudo onde haverá jogos". Ele afirmou ainda que o país corre "não é contra o tempo da Copa, mas o tempo que já passou".
Para o sociólogo Maurício Botrel, do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos, a adesão do poder público estadual e municipal é fundamental para que as políticas sociais sejam implantadas, sem precisar recorrer à "limpeza social" na Copa.
"O poder público precisa se conscientizar que isso não é solução. Maquiar não mudará nossa realidade", disse.
O procurador-geral do Rio Grande do Sul, Eduardo Veiga, presidente do Grupo Nacional de Direitos Humanos, disse que os Ministérios Públicos nos Estados estão orientados a fiscalizar a implantação da rede de comitês municipais.
Ao menos 195 moradores de rua foram assassinados no Brasil entre fevereiro de 2011 e maio de 2012.
Os dados, do Centro Nacional de Defesa dos Direitos Humanos (CNDDH), revelam apenas uma parte do problema, porque o acompanhamento e o atendimento à população de rua são falhos.
Segundo o sociólogo Maurício Botrel, do CNDDH, o fato de que 61 homicídios ocorreram em Minas e 33 em Alagoas --48% das ocorrências-- não significa que os dois Estados sejam os mais violentos com a população de rua.
Para o sociólogo, eles estão no topo do ranking porque os casos foram franqueados ao CNDDH pelas autoridades estaduais graças à criação de comitês integrados por representantes de governos locais e sociedade civil
Estes comitês estão previstos no decreto que estabeleceu a política nacional para a população de rua. No entanto, a adesão ao decreto ainda é quase nula.
Belo Horizonte, Maceió e Rio de Janeiro instituíram comitês, de acordo com a Secretaria Nacional de Direitos Humanos. Segundo o órgão, está sendo finalizado um "termo de compromisso" para que sejam firmados "pactos" com Estados e municípios.
Maria Cristina Bove, da Pastoral Nacional do Povo de Rua, defende que o governo coloque recursos no orçamento para incentivar adesões. Um dos temores é o de que sejam colocadas em prática no Brasil políticas sociais higienistas por ocasião da Copa do Mundo de 2014.
Para Bove, o ideal seria que as adesões ocorressem até o final do ano. "Senão, vai ser muito violenta [a situação na Copa]. As operações de higienização estão na pauta do dia", disse.
Fonte: Folha.com

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