Em janeiro e fevereiro, 162 mulheres vítimas de violência sexual denunciaram o abuso, mas os dados são subnotificados
L.C.F. tem 32 anos e trabalha em uma lanchonete da família
na zona Norte de Belo Horizonte. Acorda todos os dias às 5h40 e, antes das 7
horas, já está no balcão para servir os clientes. Colegas confirmam: é uma
profissional dedicada e sempre bem humorada. Depois de uma jornada de dez
horas, volta para casa, cuida dos filhos adolescentes, curte o namorado e faz
suas orações. Quem a vê, toda prosa e sorridente, não imagina que, no silêncio
da madrugada, quando todos dormem, ela ainda não se esqueceu de seu passado
traumático. Filha única, quando tinha 7 anos, ficava com os vizinhos, enquanto
os pais trabalhavam. Na residência, havia três irmãos, entre eles um jovem de
16 anos. Aproveitando-se da inocência de L., o rapaz abusou sexualmente dela
até que completasse 9 anos.
Essa poderia ser apenas a história isolada de uma jovem que
sofreu com a covardia de um agressor se não houvesse milhares de outras
parecidas. Somadas, elas resultam em um drama que vitimou mulheres de todas as
idades. Em Minas Gerais, são registradas por dia pelo menos três ocorrências de
estupro, em média, nas delegacias da Polícia Civil.
Somente nos dois primeiros meses deste ano, 162 mulheres
vítimas de violência sexual procuraram ajuda para denunciar os agressores. No
entanto, romper a barreira do silêncio ainda é um tabu. Prova disso é que a
própria Polícia Civil garante que os dados são subnotificados.
Os atos cometidos contra as mulheres remetem a crimes que
chocaram a sociedade mineira. Entre eles estão casos emblemáticos como o de
Marcos Antunes Trigueiro, de 31 anos, conhecido como o “Maníaco do Industrial”,
e de Arquimedes de Abreu Filho, de 50, o “Maníaco do Consultório”. O primeiro
estuprou e matou cinco mulheres em Contagem, na Região Metropolitana de Belo
Horizonte (RMBH). O segundo aterrorizou vítimas em BH e região metropolitana,
após roubar e abusar delas sexualmente em consultórios odontológicos.
O mais recente drama mineiro se refere ao estuprador Pedro
Meyer Ferreira Guimarães, de 57 anos. O ex-bancário agia na capital mineira e
em Contagem. A cada dia, aumenta o número de pessoas que procuram a Delegacia
de Mulheres de Belo Horizonte para denunciar o agressor. Pelo menos 14 vítimas
o reconheceram.
A psicanalista afirma que todo ato é friamente calculado.
“Ele pensa e planeja a sua ação. Esse agressor tem um transtorno de
personalidade antissocial. Esse homem é incapaz de seduzir, conquistar uma
mulher. O prazer do estuprador não está no contato sexual, e sim no domínio da
vítima”, aponta Soraya Hissa.
Estado tem programa de acolhimento
Criado para garantir orientação jurídica e atendimento
psicossocial gratuitos a quem sofreu qualquer tipo de violência, o Núcleo de
Atendimento a Vítimas de Crimes Violentos acolhe mulheres que foram estupradas
no Estado. Apesar de ser referência, o programa coordenado pela Secretaria de
Estado de Desenvolvimento Social (Sedese) está presente apenas em quatro
municípios –Belo Horizonte, Ribeirão das Neves (na RMBH), Montes Claros (Norte
de Minas) e Governador Valadares (Leste).
No acumulado de 2011, as unidades acompanharam mais 900
casos, conforme a subsecretária de Direitos Humanos, Carmen Rocha. Desses, 35%
(315) foram de mulheres vítimas de estupro. O acolhimento dura, em média, nove
meses, com encontros individuais uma vez por semana. “É uma terapia.
Trabalhamos para restaurar os direitos violados dessas mulheres”, afirma Carmen
Rocha. Os interessados podem entrar em contato pelo telefone 0800-031-1119
(Disque Direitos Humanos).
Fonte: Hoje em dia
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