segunda-feira, 3 de agosto de 2015

Vergonha e medo dificultam investigação de casos de abuso sexual

"As mulheres não podem ficar com medo ou vergonha (de denunciar), porque não são culpadas”
O constrangimento, o medo e a amnésia provocada por drogas para sedar as vítimas dificultam a investigação e a prisão do criminoso e também a formação de estatísticas de ataques sexuais, segundo a autoridades policiais.

A delegada-adjunta da Delegacia de Mulheres de Belo Horizonte, Cristiane Ferreira Lopes, diz que muitas mulheres ficam constrangidas em denunciar por se sentir culpadas. Ela orienta a vítima a procurar a polícia imediatamente e não esperar para registrar a ocorrência, porque precisa ser encaminhada para exames e receber medicação profilática contra doenças.
“É uma situação difícil de apurar. Das que comparecem à delegacia vítimas de estupro, há casos de suspeita do golpe. Mas muitas não fazem o exame de sangue para comprovação do consumo de substâncias sedativas”, afirma.

Titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher, Renata Ribeiro Fagundes também cita a dificuldade de investigação. “A maioria das vítimas não sabe o que aconteceu. Pensa que bebeu demais. Mas as mulheres não podem ficar com medo ou vergonha, porque não são culpadas. Não é porque uma jovem aceita tomar um vinho com um rapaz que tenha que se submeter a esse tipo de coisa. Às vezes, ela quer sair apenas para conversar. É importante frisar que a mulher é dona de seu corpo”, conclui.
Um dos casos em que a vítima não relatou a agressão nem mesmo a familiares ocorreu em um condomínio de luxo de Nova Lima, na Grande BH. Uma jovem de classe média alta foi dopada durante uma festa, em agosto do ano passado. “Nem sempre é uma pessoa desconhecida, pode ser alguém que está na mesma festa que a jovem”, alerta a delegada.
  Neste caso, a jovem de 25 anos acusou o empresário Daivson Oliveira Vidal de abuso sexual em uma das festas que ele costumava promover em sua casa no condomínio. A violência teria ocorrido após Vidal ter dopado a garota com uma bebida que continha sedativos. “A vítima relata que horas depois acordou e constatou que estava deitada em uma cama, em um quarto da casa, completamente despida e com dores na região vaginal”, consta no boletim de ocorrência.

Ainda segundo a ocorrência, após recuperar a consciência e questionar o agressor, ele teria dito que “aconteceu uma transa rápida” e pediu a ela para não contar nada a ninguém. Em outubro do ano passado, a delegada Renata Ribeiro Fagundes cumpriu o mandado de prisão preventiva do autor, apesar de ele já estar detido sob custódia da Polícia Federal por suspeita de desvio milionário de verbas, estelionato e fraudes em processos de licitações.


Sem reação
Chefe da Seção Técnica de Química Legal do Instituto de Criminalística da Polícia Civil, o perito criminal Rogério Araújo Lordeiro explica como essas drogas agem no organismo. Os sedativos comumente conhecidos como “boa noite cinderela” atuam no sistema nervoso central e podem provocar perda da memória durante a intoxicação. “Essas substâncias diminuem a capacidade de reação da vítima, atuando no sistema nervoso central. São, de modo geral, medicamentos prescritos para dormir, relaxar, que pessoas usam de má-fé para estuprar ou roubar pertences da vítima”, afirma.

Segundo o especialista, essas drogas deixam a pessoa em estado de sedação e não completamente adormecidas. “Ela responde a perguntas, mas está confusa, sem reação. Existem drogas que, além de provocar amnésias são dificilmente percebidas em exames toxicológicos”, afirma.

O que diz a lei

O Código Penal brasileiro trata o estupro como crime, com penas mais duras para os casos praticados contra menores de 14 anos, considerados vulneráveis. O artigo 217-A determina de oito a 15 anos de reclusão para os agressores, podendo variar entre 10 e 20 anos caso a agressão resulte em lesões corporais graves.
Se o resultado for a morte da vítima, a pena pode chegar a 30 anos de cadeia.


Fonte: Estado de Minas

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