terça-feira, 19 de novembro de 2013

Críticos pedem endurecimento de lei da prostituição na Alemanha

Desde 2002, uma lei liberal de prostituição está em vigor na Alemanha. Críticos dizem que a partir daí o país se tornou o "bordel da Europa", e exigem novas regras. Alguns querem proibir radicalmente o comércio do sexo.

Uma garota de 16 anos é encontrada morta num depósito de lixo, aparentemente vítima de assassinato. Ela vem de Belarus e foi atraída para a Alemanha sob pretextos falsos. Aqui, ela se tornou um brinquedo sexual de homens mais velhos, constata a polícia – uma "garota descartável"(Wegwerfmädchen). A expressão foi usada como título de um episódio de Tatort, a série televisiva policial de maior sucesso na Alemanha.
Em 2012, o filme foi motivo de muita audiência e chamou bastante atenção. A atriz alemã Maria Furtwängler fez o papel da comissária responsável pelas investigações. Ela está entre as 90 celebridades que assinaram uma petição na atual edição da revista feminista Emma para abolir a prostituição.
Uma sociedade não deve tolerar o comércio com mulheres, diz o apelo da editora-chefe Alice Schwarzer. A feminista mais conhecida da Alemanha desencadeou assim um debate que rapidamente chegou mais uma vez à política, pois a lei de prostituição aprovada em 2002 pelo então governo verde-social-democrata já é controversa desde a sua introdução.
"Proteger melhor as prostitutas"

Desde que a lei foi aprovada, a prostituição não fere mais a moral e os bons costumes na Alemanha, portanto clientes e profissionais do sexo não são passíveis de perseguição penal. Segundo Thekla Walker, uma das líderes do Partido Verde no estado alemão de Baden-Württemberg (sul), na ocasião "as prostitutas foram retiradas de um vácuo legal para um quadro de proteção jurídica". "Essa foi certamente uma intenção positiva naquele momento."
No entanto, o desenvolvimento da indústria do sexo desde então exige leis mais severas, alerta Walker, ressalvando que não quer proibir a prostituição. Em vez disso, apela por melhores condições de trabalho para profissionais do sexo, em sua maioria mulheres. Um exemplo seriam controles regulares de saúde.
Além disso, a polícia deveria controlar os prostíbulos e verificar o bem-estar das mulheres que ali trabalham. Na atual situação, os agentes não estão autorizados a realizar inspeções. "Deve-se esclarecer como as prostitutas podem ser mais bem protegidas", disse Walker, em entrevista à Deutsche Welle.
A Alemanha também precisa ajustar sua legislação às diretrizes da União Europeia para combate ao tráfico humano, exigiu a política verde. Em maio de 2005, o Conselho da Europa (que promove a defesa dos direitos humanos) aprovou a Convenção contra o Tráfico de Seres Humanos, mas somente em abril de 2013 a Alemanha ratificou o documento – foi um dos últimos países.
A convenção prevê que vítimas de tráfico humano menores de idade obtenham direito de permanência no país, no interesse do bem-estar do menor. No entanto, este não é o caso na Alemanha segundo a atual legislação, acusam os críticos. Outro ponto de ressalva é que as vítimas adultas só conseguem autorização de residência sob a condição deporem contra seus algozes em processo penal.

Alemanha como paraíso sexual
Em outros países europeus, a situação legal é bem diferente. Na Suécia, a prostituição é totalmente proibida desde 1999. No entanto, somente os clientes são passíveis de punição, não as prostitutas. As penas variam entre multas a partir de 1.500 euros (cerca de 4.500 reais) ou seis meses de detenção.
Na França, os prostíbulos foram proibidos pouco depois da Segunda Guerra Mundial, e agora um projeto de lei baseado no modelo sueco é motivo de muita controvérsia no país. Em reação, 343 homens, autointitulados salauds (cafajestes) assinaram a petição "Não põe a mão na minha puta (sic)", entre eles, escritores, atores e o advogado do ex-chefe do FMI Dominique Strauss-Kahn, protagonista de escândalo sexual em 2011.
Cidades alemãs de fronteira também são afetadas pelas leis cada vez mais rigorosas dos países vizinhos. A prefeita de Saarbrücken, na fronteira com a França, Charlotte Britz, afirma que nos últimos anos a situação piorou em sua cidade. Ela teme que a Alemanha se torne um "Eldorado" do comércio sexual, caso sigam valendo as leis liberais, enquanto na França os clientes se tornam passíveis de punição.
Em entrevista à Deutsche Welle, Britz defendeu a introdução de "uma legislação uniforme em nível europeu". A política social-democrata aludiu às fronteiras cada vez mais abertas na Europa e as consequências da pobreza em países como Bulgária e Romênia. "Mulheres desses países trabalham cada vez mais na prostituição de rua na Alemanha", sendo questionável que tenham vindo de livre e espontânea vontade.
Forçadas à prostituição
Segundo Sabine Constabel, assistente social do Departamento de Saúde de Stuttgart, a parcela de mulheres que optou voluntariamente pela prostituição diminuiu bastante desde o ingresso das nações do Leste Europeu na UE. "Aí, muitas mulheres dos países mais pobres da Europa vieram se prostituir na Alemanha."
Em Stuttgart, há uma ampla oferta de assistência a profissionais do sexo, com um centro de atendimento para mulheres e outro para homens, que oferece comida, assistência médica ou simplesmente um lugar para conversar. Constabel é a coordenadora técnica de dois cafés, o La Strada, para as mulheres, e o Strich-Punkt, para as homens.
A assistente social de Stuttgart revela que muitas das jovens são enviadas à Alemanha pela família ou por conhecidos, e obrigadas a enviar grande parte de seus ganhos para o país de origem. Nesse sentido, elas foram forçadas à prostituição, não importa como e por que vieram para a Alemanha.
Segundo Constabel, ela ouve das mulheres que elas não aguentam a prostituição: "Elas dizem que o trabalho as destrói." Até 70 profissionais do sexo visitam o La Strada todas as noites. "Elas reagem com depressão, muitas começam a beber, têm problemas psicológicos profundos", afirma a assistente social, de acordo com a qual as mulheres querem deixar a prostituição.
Ao mesmo tempo, porém, contam que "recebem ligações permanentes das mães, que pedem dinheiro. Também conheço garotas de 18 anos que já têm dois filhos no país de origem. Elas dizem: 'Eu trabalho apenas para os meus filhos. Quero que eles tenham o que comer, que vão à escola e que tenham livros escolares e roupas. Por isso estou aqui.'"
Final feliz para a "garota descartável"

A série policial de TV de 2012 foi inspirada numa história real, publicada na edição dominical do jornal Bild. A verdadeira "garota descartável", Yamina, tinha somente 15 anos de idade e veio da Nigéria tentar a sorte na Alemanha. Em vez disso, tinha de atender até 70 homens por semana. Por fim, ela conseguiu fugir, cooperou com as autoridades e obteve asilo. Um final feliz, pelo qual inúmeras outras prostitutas esperam em vão.

Fonte: www.dw.de

Nenhum comentário: