quinta-feira, 10 de abril de 2014

Brasil ainda não dispõe de uma lei geral contra o tráfico de pessoas

As pautas do Tráfico de Mulheres e Meninas e Exploração Sexual de Meninas ainda não constituem uma política de Estado, que exija o comprometimento de gestores públicos, a capacitação de profissionais em políticas públicas, sensibilização e informação a toda sociedade brasileira, visando à sua erradicação.


O Brasil ainda não tem uma lei geral de enfrentamento ao tráfico de pessoas, embora tenha ratificado, em 2005, o Protocolo Adicional à Convenção das Nações Unidas contra o Crime Organizado Transnacional Relativo à Prevenção, Repressão e Punição do Tráfico de Pessoas, em Especial Mulheres e Crianças, conhecido como ‘Protocolo de Palermo’. Em 2006, foi criado um plano nacional de enfrentamento, aprovado por Decreto do Poder Executivo, no entanto, não é uma política de Estado, podendo ser revogado a qualquer momento. Além disso, o decreto não compromete os poderes Executivo, Legislativo e Judiciário, estados e municípios, cuja participação se sujeita à adesão espontânea.

Esse é um dos alertas do Relatório Alternativo da Sociedade Civil, enviado esta semana ao Comitê das Nações Unidas da Convenção sobre a Eliminação de Todas as Formas de Discriminação à Mulher (CEDAW) para subsidiar a análise da ONU sobre as ações do governo brasileiro em relação ao tráfico de mulheres e também à saúde da mulher. O alerta é feito no marco do Dia Mundial da Saúde, 07 de abril.

O Relatório Alternativo é uma contribuição ao Comitê CEDAW para a análise do Relatório do governo brasileiro realizada durante a 57ª Sessão do Comitê, realizada em Genebra, em fevereiro de 2014. O documento foi elaborado por um Consórcio de 13 redes e organizações de mulheres e entidades feministas que atuam pela implementação da Convenção no Brasil, no projeto denominado "Monitoramento à Cedaw – Ação Permanente do Movimento de Mulheres” (2013/2014).

No período de realização do documento (2013), observou-se o acirramento de um quadro preocupante no Brasil quanto à garantia dos direitos humanos das mulheres, em especial devido à atuação de grupos conservadores no Congresso Nacional. Nessa instância, é recorrente o retrocesso no debate do aborto, evidenciado na tentativa de criar uma Comissão Parlamentar para investigar a atuação de organizações feministas pela legalização da prática. A proposta de alterar o Código Penal no tocante à descriminalização do aborto, em até 12 semanas de gestação, recebeu parecer contrário do senador relator, o que permite ações criminais contra mulheres que abortam. Ademais, tramita em comissões da Câmara dos Deputados a proposta de criação do Estatuto do Nascituro, aguardando apenas votação em plenário. Por outro lado, o Supremo Tribunal Federal acrescentou o aborto de fetos anencéfalos no rol dos permissivos legais.

Na questão da violência, a Comissão Parlamentar de Inquérito sobre Violência contra as Mulheres considerou os esforços governamentais insuficientes para impedir a morte de mulheres por seus parceiros, destacando a omissão do Judiciário na implementação da Lei Maria da Penha. A Lei sobre violência sexual, sancionada em julho de 2013 pela presidenta, sofreu pressões contrárias de setores religiosos.

O avanço da epidemia da Aids entre mulheres e a persistência de elevados índices de mortalidade materna, denotam o abandono da perspectiva de atenção integral à saúde feminina, penalizando afrodescendentes, indígenas, pessoas fronteiriças e as mais pobres de um modo geral.

As pautas do Tráfico de Mulheres e Meninas e Exploração Sexual de Meninas ainda não constituem uma política de Estado, que exija o comprometimento de gestores públicos, a capacitação de profissionais em políticas públicas, sensibilização e informação a toda sociedade brasileira, visando à sua erradicação. Sem medidas planejadas em longo prazo, financiadas, monitoradas e avaliadas, as mulheres e meninas brasileiras continuam sem a garantia de seus direitos humanos. Às vésperas da Copa do Mundo de Futebol de 2014 preocupa o agravamento da violência e da exploração sexual de meninas, adolescentes e mulheres jovens.

Os dois relatórios (do governo e das entidades da sociedade civil) apresentados à ONU estão disponíveis no site do Monitoramento da CEDAW.

Fonte: Adital

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