sexta-feira, 20 de abril de 2012

Lei Maria da Penha: Em BH a intimação não chega a agressor


Vítima de violência aguarda há 80 dias que marido seja notificado de decisão.
A cada dez pedidos de medidas protetivas para mulheres vítimas de violência deferidos pela Justiça na capital, dois não são cumpridos por dificuldade na localização dos agressores que tentam escapar das intimações. A estimativa é do Núcleo de Defesa da Mulher (Nudem) de Belo Horizonte da Defensoria Pública de Minas que realiza cerca de cinco atendimentos por semana relacionados à Lei Maria da Penha.
A falha nas intimações muitas vezes termina em tragédias como a da procuradora federal Ana Alice Moreira de Melo, 35. Oito dias após conseguir uma medida protetiva na Justiça, ela foi esfaqueada pelo marido, o empresário Djalma Brugnara Veloso, 49, na casa onde morava, em Nova Lima, na região metropolitana. Ele não chegou a ser notificado da decisão.
A auxiliar de serviços Cláudia Ribeiro Fonseca, 33, teme que o destino da procuradora se repita na sua casa. Há 80 dias, ela aguarda que o marido seja notificado de duas medidas protetivas, após ser agredida pelo companheiro com soco no rosto. "Vivo com medo. Se ele está em casa, fico trancada no meu quarto", afirmou ela, que relatou ainda ser constantemente alvo de agressões verbais.
De acordo com a coordenadora do Nudem, Laurelle Carvalho de Araújo, a primeira medida protetiva determinada pelo juiz titular da 13ª Vara Cível de Belo Horizonte, Relbert Chinaidre Verly, para o marido de Cláudia aconteceu no dia 31 de janeiro passado. Na ordem, o magistrado determinou que o homem deixe a casa onde o casal mora, no bairro Copacabana, na região da Pampulha, levando apenas objetos pessoais. O agressor também foi proibido de se aproximar a um raio menor que 500 m da mulher.
A outra intimação foi deferida no dia 21 de março, após a Defensoria Pública encaminhar ofício ao juiz informando dois novos endereços de trabalho onde o acusado poderia ser localizado. "A decisão é exatamente uma tentativa de se diminuir ou acabar com o risco de violência, mas não adianta a polícia e a Justiça trabalharem se os demais equipamentos do Judiciário não funcionarem", criticou Laurelle.
Para a delegada titular da Delegacia Especializada de Atendimento à Mulher de Belo Horizonte, Elizabeth Rocha, a demora na entrega das intimações aos agressores aumenta o risco para as vítimas. "Isso dificulta a aplicação da lei", ressalta.
Alegando que o processo corre em segredo de Justiça, a assessoria do Fórum Lafayette não informou o motivo da falha na entrega da intimação ao marido de Cláudia. De acordo com a assessoria do órgão, não existe um prazo para que o oficial cumpra a ordem. No entanto, no caso da aplicação da Lei Maria da Penha, a notificação deve ser feita em regime de urgência.
Conforme a Defensoria Pública, se o intimado não for localizado, cabe ao oficial comunicar o fato ao juiz para que outras providências sejam tomadas.
  
De acordo com a coordenadora do Núcleo de Defesa da Mulher de Belo Horizonte da Defensoria Pública de Minas Gerais, Laurelle Carvalho, uma alternativa para tentar evitar que o agressor fuja de receber a ordem judicial em casos da Lei Maria da Penha é a intimação "por hora certa".
A medida pode ser solicitada ao juiz pelo advogado da vítima, delegado ou ser sugerida pelo próprio oficial de Justiça. Laurelle Carvalho explica que, nesse caso, o magistrado envia uma carta ao réu, determinando que ele esteja no local estabelecido em hora marcada para ser encontrado pelo oficial de Justiça. A carta pode ser deixada na casa do réu ou entregue a um familiar.
Como uma outra alternativa de evitar que mulheres sejam alvo de agressões dos companheiros, a Polícia Militar realiza em Belo Horizonte e em outros oito municípios de Minas, o Serviço de Prevenção à Violência Doméstica.
De acordo com a sargento Silvia Adriana, coordenadora do programa na capital, depois que a vítima faz um boletim de ocorrência, a polícia faz uma pré-apuração e envia uma equipe até a casa da família para fazer um trabalho de orientação e de conscientização da vítima e do agressor. O cumprimento da medida protetiva também é verificado.
Desde 2010, quando o programa começou a ser realizado, cerca de 800 famílias já foram atendidas em Belo Horizonte.  (RR)
 
Minientrevista: "Não saio de casa porque não tenho para onde ir"
 Cláudia Fonseca, vítima de agressão
 Como você foi agredida?
Já aconteceu duas vezes. A primeira foi há um ano. Tivemos uma discussão, ele bateu minha cabeça no chão e cheguei a desmaiar. Na época, pensei em separar, mas acabei voltando. Em dezembro, ele chegou bêbado em casa. No dia seguinte, fui conversar com ele e recebi um soco no rosto. Nos dois casos, registrei boletim de ocorrência.

Como é morar sob o mesmo teto que seu agressor?
Vivo com medo. A porta do meu quarto fica trancada se ele estiver em casa. Quando alguma coisa acontece e sai nos noticiários, minha mãe fica desesperada. Às vezes, ela me liga chorando.

Por que você não sai de casa?
Não saio porque não tenho para onde ir.
Fonte: Otempo

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