terça-feira, 23 de agosto de 2011

CPI do Tráfico de Pessoas ouve vítimas

A voz trêmula deixava claro o nervosismo da mulher que denunciava a situação de sofrimento pela qual a filha havia passado. As lembranças dos momentos de desespero que sucederam a ida da jovem para outro país lhe causavam engasgos e, por segundos, a voz sumia. Enquanto retomava o controle, só o que lhe restava era a expressão de cansaço estampado nos olhos, deixados à mostra por um buraco em um gorro preto. A retomada vinha com mais força, carregada pela vontade de justiça por mais um caso de tráfico humano no Estado do Pará.

“Essas pessoas que fazem isso têm uma percepção tão grande que usam da fragilidade das pessoas para atacar. Foi isso que fizeram com a minha filha”, iniciou dizendo em depoimento, ontem, à Comissão Parlamentar de Inquérito (CPI) do Tráfico Nacional e Internacional de Pessoas do Senado Federal.

Com o nome preservado a pedido próprio, era pelo termo ‘depoente’ que a mulher atendia durante todo o depoimento. Sentada em uma mesa comprida e diante de uma plateia desconhecida, a mulher tinha o olhar baixo, por vezes molhado pelas lágrimas que vinham repentinas e carregadas de revolta. “Essa mulher levou a minha filha para o pior dos sofrimentos que uma pessoa pode passar”.

‘Essa mulher’. Era assim que ela se referia à pessoa que se passou por amiga de sua filha e a levou em 2004 para a Espanha. Com a promessa de um emprego, a jovem chegou ao país desconhecido e foi obrigada a se prostituir. “A minha filha foi presa e foi morar na rua quando deixou de ser útil para a mulher que levou ela para lá”. Foram cinco anos de sofrimento.

A volta para o Brasil aconteceu apenas em 2009, quando um amigo resolveu interceder. A primeira estada foi em São Paulo, onde recebeu ajuda da Associação Brasileira de Defesa da Mulher, da Infância e da Juventude (Asbrad) para voltar ao Estado. Ela não voltou a mesma para os dois filhos e para a mãe.

“A minha filha voltou para mim totalmente desequilibrada mental. Foi aí que começou o calvário de ver a minha filha desse jeito”, emocionou-se. “Esse momento não é em vão. Eu quero justiça, que essa mulher pague pelo o que ela fez para toda uma família”.

A história triste compartilhada pela depoente, assim como as histórias de mais seis pessoas ouvidas no Pará, irá compor um relatório que deve ser apresentado pelos componentes da CPI ao Ministério da Justiça, em Brasília, na manhã de hoje.

Esses foram os depoimentos colhidos pela investigação que também já esteve nos Estados do Amazonas e Bahia. Ainda assim, de acordo com a coordenadora do Grupo de Mulheres Prostitutas do Pará, Lourdes Barreto, muitas são as histórias de tráfico humano no Estado.

“Conheço pessoas que foram para a Espanha e não voltaram”, afirma. “Somos contra a exploração, mas somos a favor da migração. Fazemos um trabalho de prevenção com as mulheres porque sabemos que é muito grande o número de tráfico humano no Pará”.

Dentre as propostas da CPI, está uma mudança na legislação para incluir no Código Civil Brasileiro o crime de tráfico humano. No período da manhã de ontem, os componentes da CPI se reuniram com o Governador do Pará, Simão Jatene, para pedir resultados nas investigações desse tipo de crime.

TRT pleiteia mais competência para julgar matérias criminais

A solicitação de competência para o Tribunal Regional do Trabalho (TRT) julgar, além das questões trabalhistas, as questões criminais relacionadas ao trabalho foi reforçada durante a audiência pública da CPI do Tráfico Nacional e Internacional de Pessoas do Senado Federal, que aconteceu na sede do tribunal na tarde de ontem.

De acordo com o desembargador e presidente do TRT, José de Alencar, a presidente da CPI, Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM), comprometeu-se em incluir no relatório da Comissão o pedido de aumento de competência do tribunal.


Fonte: Diário do Pará

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