sábado, 29 de novembro de 2014

Monja medita com detentas

Toda quinta-feira a partir das 13h30m, a psicóloga e monja Mariângela Maia de Oliveira (Ryosen), 56, transpõe as grades do Centro de Remanejamento do Sistema Prisional (Ceresp) Centro-Sul para oferecer às detentas um trabalho de relaxamento conhecido como R.Y.E, em português, ioga na educação.


Utilizando mantras, respiração, meditação, mandala e visualização, a monja vai criando entre as mulheres um espaço em que podem se redescobrir, ganhar confiança e autoestima. As detentas são, em sua maioria, jovens envolvidas com o tráfico de drogas, furtos e homicídios e que aguardam julgamento, alvará de soltura ou transferência para presídios.

O projeto é pioneiro em Minas Gerais e é inspirado em experiências positivas realizadas em presídios norte-americanos e no Carandiru e foi proposto pela Associação Mentes Libertas.

A meditação acontece no pátio da unidade prisional, e a participação é espontânea.

Praticante da meditação desde os 21 anos, ordenada monja em 1998, tendo vivido no Mosteiro Zen Pico de Raios, em Ouro Preto, de 1998 a 2008, e psicóloga há 31 anos, Mariângela vai, aos poucos, ganhando a confiança das jovens mulheres que jamais se viram e hoje são obrigadas a dividir celas e a conviver diariamente, até que a justiça decida a sua sentença. Oito celas abrigam até 140 detentas.

Uma mandala colorida colocada no chão, no centro de um círculo com sete mulheres, servia para mudar a energia do local.

Inicialmente fechadas, desconfiadas e sem entender direito o que acontecia, as detentas foram, aos poucos, se rendendo à voz firme e ao mesmo tempo acolhedora da monja. “Respire, preste atenção no ar que entra e sai. Coloque sua atenção na respiração sempre que puder, isso é saúde, é transformação”, repetia Mariângela.

De repente, bolas de sabão começaram a voar pelo pátio refletindo as cores do arco-íris. “A bolha de sabão faz a conexão entre a respiração e o pensamento e, por consequência, a impulsividade. Quando a pessoa tem consciência de sua respiração, ela fica dona de si”, explica Mariângela.

Após dois anos de projeto, a monja acredita que “essa experiência pode transmutar as dificuldades da triste vida intramuros e suas pobres perspectivas em oportunidades de crescimento pessoal. A ioga na educação é a preciosa ferramenta pedagógica utilizada para criar uma atmosfera receptiva à prática da meditação. Nutrindo a humanidade através do fortalecimento da consciência e da integridade, o projeto contribui para uma cultura de paz e não violência”.

Mariângela recorre a uma frase de Mahatma Gandhi, “precisamos ser a paz que queremos ver no mundo”, para definir a proposta do trabalho.

“É primordial nutrir o que há de humano nessas mulheres. Não nascemos humanos, nós nos tornamos humanos. Enquanto adultos, somos responsáveis por nossos pensamentos, palavras e atos. Seja qual for o momento ou o contexto, construímos nossa integridade a cada instante. É imprescindível que pessoas privadas de liberdade posam ter um espaço e um momento para alimentar sua humanidade”, diz.

Aos poucos as detentas, inclusive uma grávida, vão se soltando, arriscam comentários, dançam em círculo, se alongam, se soltam. O momento é de entrega. Percebem que ali podem ficar um pouco consigo, sentir seu corpo e suas emoções. Acessam uma dimensão interna até então desconhecida.

“Sabemos o quanto é benéfica a prática da meditação para a saúde física e mental. O contentamento é o objetivo da vida, e a meditação é o meio para atingi-lo. É o suporte para atravessarmos toda sorte de dificuldades”, propõe a monja enquanto vai orientando uma a uma.

Simplicidade
Encontro. A prática da meditação é a experiência mais íntima que uma pessoa pode estabelecer consigo própria. Corpo e mente harmonizados por meio da postura e respiração.

Fonte:  O Tempo

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