quarta-feira, 12 de junho de 2013

Para a mídia dominante, prostitutas não devem ter orgulho próprio

Todos os problemas que toda mulher tem, a prostituta também tem. A única diferença é a estigmatização, a discriminação. Temos que combater esse preconceito lutando contra ele. Enfrentando a sociedade, enfrentando essas pessoas que discriminam. 


Na última semana, a posição do ministro da Saúde, Alexandre Padilha, de vetar uma peça publicitária da campanha iniciada pelo Ministério pela prevenção de doenças sexualmente transmissíveis foi mais uma demonstração da disposição do governo federal em ceder às reivindicações dos setores mais conservadores e preconceituosos da sociedade brasileira. A peça em questão trazia a protagonista declarando: “Eu sou feliz sendo prostituta”. Sob pressão de extremistas religiosos e de políticos do campo da direita, o ministro cedeu, cancelou a veiculação da peça e exonerou o diretor do departamento responsável por ela.

No domingo o jornal Zero Hora resumiu, em editorial, o que a mídia dominante e esses velhos setores sociais pensam a respeito, embutindo em uma discurso falsamente imparcial e inofensivo uma exasperação ideológica de direita que, além de procurar humilhar um grupo social, manipula os demais.

O título, “Orgulho de ser prostituta?”, já apresenta a tese que será desenvolvida ao longo do texto: a ideia de que as prostitutas não têm direito a sentir orgulho, ou seja, são uma subespécie. É um discurso absolutamente discriminatório, e que segue ao afirmar que as peças publicitárias em questão “enalteciam a prostituição”, quando, na verdade, procuravam apenas criar vínculo identitário e atacar o preconceito contra esse setor social.

Também o “olho” (trecho em destaque) do editorial vai nesse caminho, procurando vincular a prostituição à exploração infantil: “Ao sugerir o questionável orgulho de ser prostituta, o governo poderia passar uma mensagem contrária ao combate à prostituição infantil, que é uma de suas bandeiras sociais”. Em 2012, em entrevista ao Jornalismo B Impresso, a coordenadora do Núcleo de Estudos da Prostituição (NEP), Carmen Lucia Paz, já afirmava: “Temos que conseguir garantir nossos direitos garantidos na Constituição, e também acabar com essa história de que prostituição induz as crianças. Muitas vezes nós somos culpadas pela mídia, dizem que incentivamos a prostituição infantil. Nem existe prostituição infantil, o que existe é exploração. Criança não é, nem pode, nem deve ser prostituta”.


Após explicar a sequência de fatos que levou ao veto de Padilha, ZH, ainda teimando em afirmar-se imparcial, acaba por entregar de que lado está – e não apenas nesse caso específico, mas como posição político-social geral: “De um lado, opositores do governo, religiosos e setores mais conservadores da sociedade condenando o Ministério da Saúde pela concessão ao oportunismo de militantes. De outro, organizações não governamentais, associações defensoras da diversidade de gênero e intelectuais criticando duramente o governo pelo recuo”. Como a sequência do editorial sustenta a primeira tese, fica claro que ZH inclui-se entre os “opositores do governo, religiosos e setores mais conservadores”, e exclui-se como “defensora da diversidade de gênero”.

Zero Hora insiste em sua própria imparcialidade, mas denuncia a si mesma novamente. Depois de dizer que “o extremismo de posições pouco contribui para um encaminhamento mais propositivo da questão”, tem, ela mesma, uma posição extrema: “Soa, porém, falso e demagógico exaltar na propaganda oficial uma profissão (…). Fez bem, portanto, o ministro em redefinir o rumo da campanha”.

Na entrevista que concedeu ao Jornalismo B, Carmen Lucia também falou sobre a discriminação:

Todos os problemas que toda mulher tem, a prostituta também tem. A única diferença é a estigmatização, a discriminação. Temos que combater esse preconceito lutando contra ele. Enfrentando a sociedade, enfrentando essas pessoas que discriminam. O ideal seria que todas as prostitutas tivessem essa coragem. Temos que ter respeito com a nossa profissão. Essa seria a forma básica para diminuir a discriminação. Organizadas, com a nossa profissão regulamentada, vai ser mais fácil enfrentar. E aí sim podemos dizer que a sociedade vai nos respeitar como profissionais. A mídia tem um papel importantíssimo, ela pode te ajudar, te levantar, fazer de ti um grande movimento, como pode derrubar esse movimento também.


http://jornalismob.com/

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