América Latina segue um território prioritário para a
expansão do capital em sua era de barbárie social extrema. São as mulheres, trabalhadoras, mães de crianças pequenas, as mais impactadas com a vulnerabilidade do trabalho no continente, centrada na desigualdade de gênero e na ampliação da brecha no interior do trabalho feminino. A concentração do desemprego é 5 vezes maior para as mulheres de baixa renda, em comparação com as de mais alta renda.
Leiam o lúcido artigo de Roberta Traspadini em Brasil de Fato
Após mais de 500 anos de espoliação, nosso continente ainda
possui enormes recursos naturais a serem expropriados e uma população de quase
300 milhões apta a ser superexplorada pelo capital e prontos para consumir
mercadorias.
Este é o resultado contraditório da histórica luta pela
liberdade refugiada, na aparente igualdade burguesa.
O centro do desenvolvimento desigual e combinado traz uma
análise sobre nossa América em seu movimento permanente de dependência
estrutural.
Um panorama demográfico social
O anuário estatístico 2011 da CEPAL mostra que nossa América
está estruturada na seguinte perspectiva: dos quase 597 milhões de pessoas, 277
milhões (163 milhões de homens e 133 milhões de mulheres) compõem o exército
formal de trabalhadores aptos a serem explorados pelo capital no continente. A
taxa de desemprego é de 7,1%.
Existem aproximadamente 50 milhões de pessoas com mais de 15
anos sem saber ler e escrever ( 8% da população); 62% têm de 15 a 49 anos de
idade e a população urbana é de 81,2%.
Outro documento, Panorama social da América Latina, relata
que nosso continente possui 73 milhões de indigentes e 174 milhões de pobres
não indigentes. Somados, temos 247 milhões de pessoas que vivem em condições
subumanas, configurando uma real barbárie social.
A relação, inversamente proporcional entre grandes empresas
e números de empregados, mostra distintas formas de produção da intensa
exploração da mão de obra no continente, como a diferença dos salários de
homens e mulheres e a ampliação da desigualdade no interior de cada um dos
gêneros.
As grandes empresas exportadoras geram 70% do PIB da região
e empregam somente 19,8% do emprego total. As pequenas e médias empresas
participam com 22,5% do produto e empregam 30% do total de trabalhadores
formais. Já o setor informal, emprega quase 50% da mão de obra e aporta 10% no
produto da região.
Na conformação contraditória entre uma América Latina com
bons rendimentos salariais para uma pequena parte dos trabalhadores e péssimos
rendimentos para a maioria dos que vivem da venda de sua força de trabalho,
mulheres e jovens seguem visivelmente afetados na dinâmica de superexploração
particular adotada no continente pelo capital.
Mulheres trabalhadoras latinas
A estratificação no interior do gênero e a desigualdade
salarial entre as mulheres são impactantes.
Enquanto 82% das mulheres pertencentes ao grupo mais pobre
da região trabalham em ramos de remuneração baixa, apenas 33% das mulheres do
grupo de melhor situação social estão nesta condição.
Além da desigualdade de gênero no mercado laboral, a
distância salarial entre as mulheres mais pobres e menos pobres também é
central.
Quando a desigualdade da renda e do tipo de trabalho no
interior do gênero feminino leva em consideração o tema dos filhos, a situação
explicita a centralidade da desigualdade na estrutura do capital contra o
trabalho no continente.
Mulheres com crianças de 0 a 5 anos tendem a estar no
mercado informal, dada a situação real do cuidado centrado nos filhos, em
comparação com as mulheres cujos filhos têm de 6 a 14 anos.
São estas trabalhadoras, mães de crianças pequenas, as mais
impactadas com a vulnerabilidade do trabalho no continente, centrada na
desigualdade de gênero e na ampliação da brecha no interior do trabalho
feminino. A concentração do desemprego é 5 vezes maior para as mulheres de baixa
renda, em comparação com as de mais alta renda.
Por um lado, o capital apresenta para parte da classe
trabalhadora uma inserção no mercado de trabalho em condições desiguais na sua
própria constituição e intensifica a centralidade desta desigualdade no interior
da classe.
Por outro lado, os Estados nacionais de parte expressiva dos
países da região empurram, via privatização dos direitos, parte expressiva das
mulheres latinas que compõem a classe trabalhadora para uma situação cada vez
mais perversa sobre seu ser e viver.
Os sentidos de pertença do trabalho e do viver da mulher da
classe trabalhadora latina perdem espaço real na gigantesca dinâmica de morte
em vida instituída pelo capital. É a aparente vitória incontestável de um único
horizonte possível de inserção laboral, em que ser mulher se resume a ser
sujeitada ao projeto de desenvolvimento desigual. Pífia razão desordenada
burguesa!
Esse panorama reforça o estado de alerta em nossa América.
Mais do que o fim da desigualdade como o centro da dinâmica do capital sobre e
contra o trabalho, o que temos é uma vasta condição de ampliação da exploração
em todo continente latino. A centralidade é a da apropriação privada de
recursos naturais que deveriam ser bem comum, combinada com a espoliação da
classe trabalhadora.
Esse tema, somado à discrepância entre a vida no campo e a
vida na cidade, à centralidade da juventude no mundo do trabalho e no universo
de precarização da educação e à retomada da condição primário exportadora dos
países economicamente mais fortes do continente, joga um peso central na
política de enfrentamento e de projeção de um projeto popular latino-americano,
como alternativa real à continuidade da integração do capital contra os
trabalhadores no continente.
Seguiremos...
Roberta Traspadini é economista, educadora popular e
integrante da Consulta Popular/ES
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