terça-feira, 23 de abril de 2013

Uma mulher em cada quatro sofre violência no parto


Ana Paula lembra com emoção dos momentos que passou durante o parto

"Cheguei à maternidade com contrações quase contínuas. Deitaram-me, amarraram minhas pernas, injetaram milhões de coisas em mim enquanto eu implorava por explicações e chorava. Ninguém me deu atenção. Sentia-me numa esteira de linha de montagem. A anestesista ainda disse, ironicamente, que era para eu parar de chorar, porque eu estava anestesiada e não tinha nada doendo". Os maus-tratos sofridos pela assistente administrativa Ana Paula Garcia, de 30 anos, durante o parto, é motivo de uma ação inédita na Justiça mineira, por danos morais, contra o hospital, o plano de saúde e a equipe médica que lhe atendeu.


Apesar de ser o primeiro processo judicial do tipo, o relato de Ana Paula é compartilhado por várias mães que foram marcadas por traumas durante o nascimento do filho, um dia que deveria ser repleto de boas lembranças. Uma pesquisa da Fundação Perseu Abramo, realizada em 2010, mostrou que uma em cada quatro mulheres afirmam ter sofrido algum tipo de violência no parto. Mas muitas mulheres não denunciam ou não entendem que foram desrespeitadas. Na maioria das vezes, não se trata de uma agressão física, mas de ter os direitos violentados ou ser hostilizada no hospital.


Os problemas mais comuns relatados no estudo são: procedimentos realizados de forma dolorosa, sem consentimento ou sem informação, xingamentos, humilhações e até negar anestesia ou atendimento. Cerca de 51% das entrevistadas ficaram insatisfeitas com seu parto. "A violência é generalizada, mas a maioria das mulheres não tem informação e acha que é natural o médico ficar falando sobre o que comeu no almoço enquanto faz o seu parto", disse a advogada Gabriella Sallit, que defende Ana Paula na ação impetrada em janeiro último.

A filha da assistente administrativa morreu no dia do nascimento, em maio do ano passado, em uma maternidade de Belo Horizonte. Para ela, a dor da perda da filha poderia ter sido amenizada. "Tinha me preparado para o meu parto e foi o dia mais infeliz. Fizeram procedimentos em mim que eu não queria, não deixaram meu marido ficar comigo. Ninguém da equipe veio me falar que minha filha tinha morrido. A assistente de enfermagem só entregou a certidão de óbito", disse Ana Paula. Ela sente até hoje as dores do corte que foi feito na sua vagina para aumentar a abertura (Episiotomia).


A causa da morte do bebê foi considerada inconclusiva e está sendo investigada pelos órgãos de Saúde. O Conselho Regional de Medicina (CRM-MG) abriu sindicância para apurar a conduta dos médicos que fizeram o parto. A ação judicial não estipula valores. O objetivo de Ana Paula é que os envolvidos assumam o erro e que outras mulheres não sejam mal-tratadas no parto.

O presidente do CRM-MG, João Batista, explicou que o Código de Ética estabelece que o médico deve manter uma boa relação com o paciente e esclarecer todo o procedimento que vai ser realizado. "A obstetrícia é a especialidade que tem mais erros médicos, porque lida com a mãe e o feto, mas, praticamente, não recebemos denúncias de maus-tratos", destacou.

Especialistas recomendam planejar o parto
É cada vez mais comum, principalmente no exterior, que as gestantes façam um plano de parto – ou termo de consentimento esclarecido – com todas intervenções que a paciente aceita ou não, que é assinado pela equipe que vai realizar o procedimento. O plano é recomendado inclusive pela Organização Mundial de Saúde (OMS) e é uma garantia tanto para os médicos como para a mulher.

O coordenador de atenção à saúde da mulher da Secretaria Municipal de Saúde da capital, Virgílio Queiroz, destaca que, desde 2005, é lei o direito da gestante ter um acompanhante durante o parto.
"Isso diminuiu bastante os problemas relatados", disse.
Para o diretor da Sociedade Mineira de Ginecologia e Obstetrícia (Sogimig), Carlos Henrique Mascarenhas, as denúncias de violência no parto devem ser fundamentadas. "Tenho medo do denuncismo anônimo. Não podemos ter um médico atendendo um parto e 15 pacientes, num pronto-socorro", destacou.

Fonte: Super Noticias

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