segunda-feira, 9 de abril de 2012

São as mulheres do Evangelho que nos ensinam como estar junto àqueles que sofrem


"O episódio da Paixão nos coloca uma pergunta: o que podemos fazer quando não há mais nada a fazer? E a resposta do Evangelho é: “estarmos aí”, afirma Luisa Muraro, professora emérita de filosofia da Universidade de Verona, uma referência quando se debate o pensamento da diferença sexual, em entrevista é de Lorenzo Fazzini e publicada pelo jornal italiano Avvenire, 06-04-2012.

Qual é o traço da Sexta-feira santa que você considera mais eloqüente?
O medo de ser derrotados, de acabar às margens, de falhar. Penso nos Diálogos das carmelitas de Bernanos. Na abertura se lê: “o Medo é filho de Deus, resgatado na noite de Sexta-feira santa”. De outra parte, foram precisamente algumas mulheres que venceram este medo para seguir Jesus até o fim. Pedro e os outros tinham fugido. Entendo-os, eu, como a priora de Bernanos, tenho medo, mas quando penso naquelas mulheres, a mente se acalma em admiração. Ensinam-nos a grandeza de saber estar junto àqueles que são golpeados pelo sofrimento, também quando somos impotentes. O comportamento daquelas discípulas de Jesus cria um extraordinário contraste com a lógica deste mundo, onde todos se amontoam em torno ao poderoso, ao rico, ao homem de sucesso. É a lição cristã mais difícil e grande, saber na prática que o Senhor não está no rico ou no poderoso, mas nos pequenos e nos pobres. Mas, o episódio da Paixão nos coloca uma pergunta: o que podemos fazer quando não há mais nada a fazer? E a resposta do Evangelho é: “estarmos aí”.”
Impressiona—a, portanto, esta presença feminina sob a cruz...
É uma presença que tem um significado ulterior. Encontramo-lo em Santa Teresa de Ávila, naquela passagem de seu Caminho de perfeição, início do quarto capítulo, onde protesta energicamente com o Senhor porque os homens não dão liberdade às mulheres de falar e agir publicamente. E aduz como argumento que as mulheres, na vida terrena de Jesus, lhe demonstraram “muito mais amor e fé do que os homens”. Teresa solicita que se tenha conta disso.
Deus morre sobre a terra. A você que é filósofa o que lhe diz Sexta-feira santa?
O ponto abissal, não só teológico, é o grito de Cristo dirigido ao Pai quando se sente abandonado, sentimento que ele já havia provado no horto das oliveiras. Naquele momento tudo se torna negro: a Sexta-feira santa é um dia quase sem liturgia, sem música nem cores. Aqui a gente se une com o ensinamento da mística mais profunda: quando tocamos Deus, este tocar é uma “noite escura” insustentável e impossível. Mas, daqui se passa a outra “impossibilidade”: não se pode falar de Deus que morre sem aceitar aquela coisa louca que é a ressurreição. O elemento plausível neste acontecimento não é a lógica humana, mas uma arca de absoluto na qual tudo se precipita para converter-se numa glória impensável: alma e corpo que ressurgem da morte. Precipitando-se no abismo da morte de Deus, tudo parece dissolver-se no nada, mas do abismo se desprende uma luz e eis que qualquer coisa se torna possível”.
Jesus morre diante de sua mãe. O imaginário contemporâneo, também na fotografia, registra o eco deste tema trágico. Porque golpeia tanto assim?
Trata-se de um arquétipo que se imprimiu de maneira indelével graças à arte sacra inspirada pelo relato evangélico. Sobre o fundo, o que transparece é a associação entre o corpo feminino fecundo e a vida, mas numa luta extrema e perdedora. A mãe que abraça o filho morto o contesta à morte. No filme E agora para onde vamos? de Nadine Labaki, libanêsa, a mãe abraça o filho morto, lhe fala e o sacode repetidamente para que lhe responda. O filme, ambientado numa paisagem que recorda a Palestina de Jesus, é obra de uma mulher que não se dá conta que aquela imensa dor seja para nada e deva sempre repetir-se. Isto me faz pensar na maravilhosa reviravolta da ressurreição.

Fonte: IHU

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