quarta-feira, 31 de agosto de 2011

Mulheres sem acesso a serviços no Haiti

“Acabo de dar à luz no chão. Não tomei remédios para a dor durante o parto”, contou uma mãe haitiana à organização Human Rights Watch, que alertou ontem para sérias brechas no acesso aos serviços de saúde no Haiti. Com sede em Nova York, a HRW disse que este país do Caribe, um ano e meio depois do terremoto, ainda não conta com serviços adequados para impedir mortes maternas e infantis preveníveis. 

“Algumas mulheres e meninas no Haiti carecem da informação básica sobre onde obter serviços médicos gratuitos. Outras não têm nem mesmo um dólar necessário para se dirigir a um hospital para dar à luz. Algumas, inclusive, têm medo de abandonar seus pertences nos acampamentos”, disse à IPS Amanda Klasing, especialista na situação haitiana para a HRW.



Em um informe de 78 páginas intitulado “Ninguém se Lembra de nós: Fracasso na Proteção dos Direitos Sanitários e de Segurança das Mulheres e Meninas no Haiti depois do Terremoto”, a organização documentou a falta de acesso a cuidados materno-reprodutivos após a catástrofe. “Dão à luz sem cuidados, no chão de barro das barracas, ou fazem sexo por comida sem nenhum tipo de proteção para evitar gravidez indesejável”, afirmou o diretor-executivo da HRW, Kenneth Roth.



Doadores prometeram US$ 5,3 bilhões em ajuda para a recuperação no curto prazo, dos quais US$ 258 milhões seriam destinados aos cuidados médicos. Embora até agora só tenham sido desembolsados US$ 118,4 milhões para a saúde, estão prometidas próximas entregas no valor de US$ 130,6 milhões. “Parte deste dinheiro é para reconstruir hospitais e o sistema de saúde, o que leva tempo. Há muitos níveis de planejamento necessários. Porém, mesmo quando se espera o desembolso de mais da metade do dinheiro, existem hoje serviços gratuitos disponíveis. É uma questão de assegurar às mulheres e às meninas vulneráveis que se beneficiem do que já pode ser utilizado”, disse Klasing à IPS.



Mesmo que as agências trabalhem duro para fornecer assistência, muitas mulheres e meninas não se beneficiam devido à falta de informação, à má infraestrutura de transporte e pelos excessivos encargos para os serviços que não são gratuitos. A extrema vulnerabilidade e a pobreza nos acampamentos levaram algumas mulheres e meninas a estabelecerem relações com homens por segurança econômica ou a oferecer sexo em troca de alimento, informou a HRW.



Este “intercâmbio” às vezes acontece sem o adequado acesso a métodos anticoncepcionais e outros serviços de saúde reprodutiva, o que aumenta a possibilidade de gravidez não planejada e infecções por doenças sexualmente transmissíveis. A vulnerabilidade de mulheres e meninas a violações aumentou desde o terremoto. E é uma preocupação ainda maior nos acampamentos para refugiados, onde existe alta incidência de violência sexual.



Os anticoncepcionais de emergência e os cuidados médicos depois da violação só estão disponíveis em alguns centros de saúde, e muitas mulheres e meninas nem mesmo os conhecem. Outras estão muito assustadas, envergonhadas ou traumatizadas para pedir ajuda em tempo para que os medicamentos sejam efetivos, diz o informe. A HRW também apontou a falta de coordenação e intercâmbio de informação entre doadores e organizações não governamentais, que dificultam o progresso.



Para Klasing, “a responsabilidade pelos direitos das mulheres, incluindo os esforços para reduzir a mortalidade materna, exige boa informação quanto ao impacto que os programas estão apresentando e quais mudanças devem ser feitas para aumentar os benefícios”. Ao mesmo tempo, completa, para garantir que as mulheres e as meninas recebam a informação necessária para terem acesso aos serviços, o governo, os doadores e as ONGs deveriam contar com uma ideia global do que está disponível.



Segundo o informe, o governo deveria fazer mais quando se trata de proteger as mulheres e as meninas da violência, e garantir que recebam toda a informação que precisam. “A atenção aos direitos humanos deve ser uma parte essencial do plano de recuperação do Haiti”, disse Roth. O diretor-executivo da HRW exortou autoridades, doadores e ONGs a fornecerem serviços e proteção às mulheres e crianças, bem como a criarem um mecanismo de supervisão.



Segundo Klasing, o governo haitiano deveria adotar uma forte política de gênero em todos os Ministérios e programas para garantir que os direitos das mulheres sejam considerados em todos os assuntos. “Também deve dar passos para assegurar que as mulheres e meninas nos centros públicos entendam quais programas e serviços estão disponíveis de forma gratuita e que são necessários para continuar o tratamento”, acrescentou. “Com quase US$ 260 milhões destinados à atenção médica, nenhuma mulher deveria dar à luz na rua. As mulheres e meninas têm direito aos cuidados que salvem suas vidas, inclusive em circunstâncias adversas”, disse Roth.

Fonte: http://www.feminismo.org.br/livre/index.php?option=com_content&view=article&id=5793:mulheres-sem-acesso-a-servicos-no-haiti&catid=130:internacional&Itemid=537















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